Sunday, May 5, 2024

Sobre Hobbits e Homens

Introito: reservas infinitas de estupidez

   Sim, o brasio é isso: um dos poucos países do mundo com reservas infinitas de estupidez. Sendo nossa população finita (sic), e existindo cá alguns escassos iluminados - este a escrever é muito modestamente apenas mero ponto fora da curva - dá para calcular o quanto somos um povo sem noção. Dentro da plataforma do blog, clicando desavisadamente caí numa seção raramente visitada: aquela onde - não sei como nem porquê - mantém certos comentários descartados ou não encaminhados para meu e-mail. Por esse motivo vários apontamentos ficam sem reposta, embora outros foram sim descartados ao entrarem em minha caixa postal. Hoje apaguei mais de 200, e publiquei uns poucos - principalmente do sempre participativo e generoso Don Flavitxo. Preciso pedir desculpas pelo meu tosco domínio de Blog; o silêncio não foi desleixo nem soberba. Se o leitor recebe esta introdução como uma forçação (sic) de barra, invencionice do articulista para superestimar o espaço, veja só:


   Na postagem Escolha Sua Tragédia II, ato final foram no mínimo três comentários dispensáveis. Um reclama de ter suas bobagens democraticamente censuradas. Não tem noção; o sujeito quer ser publicado de qualquer maneira. Desconhece a célebre frase de Edward Coke, jurista inglês do Renascimento, para quem A casa de um homem é seu castelo. Certo, a frase tem muito mais profundidade do que atribuída aqui, não entrarei nesse mérito. Resumindo, a lei da 'vida real' vale para a 'vida virtual', e o blog é extremamente democrático dentro das leis estabelecidas por seu proprietário - eu. Minha opinião política não está sob julgamento ou discussão. Pule-a, se não quiser saber sobre política. O segundo idiota ignora o uso da ironia! A terceira opinião, inteiramente apagada, apenas registra para o leitor o fato de tontos em geral pretenderem poluir estas excelsas páginas com o excremento em estado puro exalado de seus cérebros. Não passarão. E tem mais:


   O primeiro comentário é até razoável, mas é isso mesmo: não publico réplicas sobre política, ainda que apoiem a premissa do blog! Pouco adianta reforçar meu ponto de vista; a proposta editorial é de não abrir oportunidade a tais comentários. Ponto! 


   Esta terceira, é um primor. Reforçando: o blog é democrático. E eu leio tudo sim - o que chega ao meu e-mail, pelo menos - não por curiosidade como pobremente supõe o detrator, mas para em primeiro moderar de fato (comprova meu apego à democracia), depois (e não menos importante) para procurar algum resquício de inteligência no debate, tornando-o digno de discussão. Claro, em 99% dos casos é perda de tempo. Mas o caboclo crê-me apenas curioso. É a estória conhecida, das reservas infinitas de estupidez.

A Dayane e a Renata

Um monte de postagens atrasadas, mas hoje a Dayane e a Renata passaram para almoçar. Saíram, estava escurecendo... horas e mais horas de conversa, reflexões, risadas, causos, planos e muito mais. Pelo começo: a Dayane já pensava em lançar mão de uma Xampa Taittinger - Brut básica, reba - que compramos em 'promo' de 300tinha. Ficou em cima da hora para cozinhar algo a contento, e sugeri uma mudança de planos: meu indefectível filé ao molho gorgo com um tintinho nojento, precedido um um espumantezinho honesto e sincero (risos!). A Cava Cordon Negro já apareceu demais aqui, principalmente nos últimos tempos, e é hors concours; como tintinho cacei um Castel del Monte Il Falcone Riserva 2013, da Azienda Vinicola Rivera, localizado na Puglia. Embora alguns lojistas nacionais digam tratar-se de um corte 70% Nero di Troia e 30% Montepulciano, o sítio do produtor diz 70% Nero di Troia e 30% de outras variedades locais. Também chamada de Uva di Troia, remete à cidade de Tróia na Puglia. A lenda de sua fundação faz conexão com a Tróia antiga, da atual Turquia, conquistada por Aquiles e sua turma, conforme Homero contou em sua Ilíada. Il Falcone aerou por uma hora antes de ganhar o balde e depois pular para as taças. Na primeira cafundaga a Dayane invocou Biotônico Fontoura...(!) Acho que a Renata falou um pouco da madeira, bem presente. Resfriado um pouco mais - além de maior aeração? - seus toques de fruta apareceram, junto de couro ou chocolate, e mais notas. Taninos já macios revelam o vinho em seu apogeu, com boa acidez e final médio, tudo bem equilibrado, casando razoavelmente com o bifim, em harmonização que não brilhou mas sem decepcionar. É bom enfatizar: nada tem a ver com essas porcarias de Primitivos de Puglia infestando prateleiras e tentando competir (sic) com igualmente ruins Primitivos de Manduria, todos invariavelmente doces e desbalanceados. Dizem existir Primitivos de Manduria sem o dulçor enjoativo. Talvez, conheço pouco. Só espero não me aparecerem pela frente, antes de morrer, a Mula sem Cabeça, o Boto Cor de Rosa e o ET de Varginha, tudo juntos e misturados, antes de eu conhecer um Primitivo (qualquer um!) sem esse dulçor dos quintos dos infernos (risos!)

A conclusão deu-se com um gorgo nojentinho escoltado por três vinhos de sobremesa, também provados todos em encontro não postado. Teve um Colheita Tardia da Aurora 2021, corte de Malvasia e Moscato. Para minha completa surpresa - já acontecera antes - ele praticamente equiparou-se ao Tarapacá Late Harvest com seu corte Sauvignon Blanc, Viognier, Gewurztraminer e Chardonnay. Ambos com agradável toque cítrico - para mim sempre soa à folha de laranjeira, embora as meninas identificassem um cítrico de outra origem - mas no Tarapacá a nota de mel também estava evidente, deixando-lhe um pouco mais de sofisticação. Ou talvez este Enochato simplesmente tenha notado esse ponto favorável do Tarapacá sem ter conseguido decifrar algum detalhe mais sutil do Aurora. Ambos, claro, com baixa acidez, deixando o doce prevalecer em boca e proporcionando algum desequilíbrio. O Doisy-Védrines, já muito comentado, levou todo mundo no peito, sem o mínimo esforço. Portanto, um vinho nacional competindo de igual para igual com um vinho Chileno aparece nas páginas do blog, e é retratado como tal, sem o menor preconceito do articulista. Um pelo outro, diria uma grata surpresa! É quando o nosso vinho, minúsculo, discreto, desimportante, um Hobbit por assim dizer (rs) pareia ombro a ombro com 'vinho de homem'. Afinal, bem ou mal, o Chile é o sétimo ou oitavo mais importante produtor de vinhos do mundo. Por favor, caterva, sem ilusões de achar que podemos competir com espumantes ou tintos de Xampanhe ou Médoc, como se entre nós e 'eles' (no caso de Xampas) não existissem Cavas, Brutos (um dos tipos de espumantes portugueses), Crémants (da Borgonha, da Alsácia, do Loire, de Bordeaux, de Limux, etc.), Prossecos, Sekts e uma miríade de outros. Apenas tolos sustentam que podemos competir com tintos e espumantes. 

Parece que podemos competir, regionalmente, com vinhos de sobremesa. Um Aurora Colheita Tardia custa R$ 30,00, o que dá USD 6,00. Um Taracapá custa no Chile USD 8,00. A bem da verdade essa safra da Aurora foi produzida com trabalho escravo, mas dou-me o direito de imaginar que o valor tenha sido reajustado desde aquele escândalo e hoje o sítio do produtor mostre um montante devidamente estabilizado. Então posso dizer: tem que custar a metade, e se necessário ser vendido em caixinha longa vida - o Taracapá vem de longe e usa rolha! - e assim poderemos reduzir o custo para o consumidor. Aguardo um vinho com qualidade mínima e preço adequado para dizer aos quatro ventos que produzimos vinho razoável. Vinho a custo alto não é admissível em um país agrícola

Thursday, May 2, 2024

O níver do Paulão, 2

Introito

Esta degustação aconteceu antes do níver do Paulão, mas a festa oficial teve preferência na publicação por motivos óbvios. E vamos logo, pois já estamos atrasados... Parafraseando e contrariando o Ghidelli, pode ter sido muita festa, mas nunca que foi muito vinho!

A Paduca aquecendo os tamborins

Paulão mandou um zápi tocando o terror e anunciando um embate até a morte entre o vinho dele e o meu, ao que eu dei de ombros. Sei como tratar fanfarrões assim; meu 1/4 de sangue calabrês não nega as origens. Paulão chegou com seu justiceiro embrulhado, e encontrou o meu da mesma maneira. Experimentei o dele notando bastante fruta no nariz, mas sem arriscar um palpite de onde seria. Tentei encontrar alguma nota diferente, mas parece que meu nariz - para variar - ultimamente anda muito arredio. Acidez um pouco baixa, algo ligeiro em boca, final rápido, também. Quando revelado, descobri tratar-se de um Ramón Bilbao Reserva 2016, Riojano das Bodegas Ramón Bilbao que completam 100 anos em 2024, com 14% de álcool só um pouco detectáveis, e comprado em ótima 'promo'. Meu escolhido pareceu ter sido reconhecido pelo Duílio, mas depois ele mudou de opinião. Já comentei em todas as confrarias: não tente chutar a procedência o vinho apenas por chutar. Procure as características que você reconhece, ative sua memória olfativa e faça o seu melhor. Errar não é um problema, faz parte da diversão. Os confrades notam o quanto erro em nossos encontros, e é muito mais do que acerto. Bem, o Gattavecchi Riserva dei Padri Serviti 2013 é um Vino Nobile di Montepulciano produzido ao redor da cidade de mesmo nome, localizada no sul da Toscana. Um vinho 100%, Sangiovese, produzido pela Societá Vinicola Toppetta, não deve ser confundido com a cepa Montepulciano plantada ao redor da cidade de Abruzzo, na região central da Itália. Gattavecchi podia não ter a fruta tão abundante quanto Bilbao, mas estava bem mais complexo: além da fruta tinha terra, ou algo herbáceo; sobravam mais notas. Fumo? Chocolate? Algo assim. Talvez meu nariz não estivesse tão ruim assim... Acidez melhor, contribuindo para boca mais marcada, com final longo. Os Paduquentos ainda não estão acostumados com essas sutilezas, o que é compreensível. Há menos de um ano estávamos bebendo vinhos portugueses - ou sul-americanos - na faixa de R$ 50,00-R$ 70,00, às vezes bem comprados, às vezes não... Para eles, Bilbao Reserva esteve melhor. Para mim, não. O leitor decide (risos). Acabaram-se os vinhos, o entusiasmo não. Perguntaram-me o que eu teria se fosse abrir algo para o cachorro. Disse-lhes que abriria algo que sequer serviria para o cachorro - uma canalhice se paga com outra, certo? O Torre Oria Shiraz (😣 a safra estava no contrarrótulo) foi comprado há algum tempo, antes da pandemia, creio, e é produzido pela Bodegas Torre Oria, estabelecida em Utiel-Requena. Para quem não sabe de onde já ouviu falar desse nome, é a mesma procedência do famigerado Toro Loco. Lembram-se das reportagens de 2012 dizendo-o um dos melhores vinhos do mundo por R$ 11,50? Aqui e aqui. Claro, depois a blogosfera repetiu ad nauseam... bem, conforme este Enochato, ele era apenas um vinho honesto para o valor. Torre Oria repete a fórmula: fruta na frente, sem muito mais, baixa acidez, algo ligeiro, com com um dulçor agradável para iniciantes ou para beber apenas uma taça bem comedida. Depois disso, fica enjoativo. Boas bocas pegam esse enjoativo de saída. Os vinhos da Torre Oria chegaram a ser campões de vendas quanto o Shot mantinha a franquia com a Vinho Alguma Coisa, mas parece que em algum tempo o público simplesmente desistiu deles. Uma palavra sobre a foto: ela não tenta imitar a Crucificação. Não! O Salvador não está ladeado pelos salafrários! É o contrário!