Noite de fortes emoções em 30 de junho
Neste sábado aconteceu a degustação de vinhos da importadora Zahil realizada pela Mercearia 3M, comandada pelo sempre atencioso Idinir Janduzzo e assistido pelos eficientes Leonardo "Leo" 3M e 'João Português'. A Zahil esteve representada pela sempre simpática e atenciosa Simone Puglieri, capitaneando staff igualmente atencioso.A Zahil importa aproximadamente 300 rótulos de 11 países e tem por consultor o sr. Jorge Lucki, engenheiro Politécnico (sic) que virou um dos maiores especialistas em vinho do Brasil, com coluna fixa no Valor Econômico e autor de A Experiência do Gosto.
Degustações da proporção dessa - mais de 50 rótulos - não se prestam à pretensão de conhecer todos os produtos mostrados; antes, serve para apresentar produtos e quebrar resistências (quem aí apostaria, às cegas, um centavo em um vinho libanês?). Assim, experimentei alguns que, apesar de simples, ainda não tivera a oportunidade, e outros, às vezes até mais $complexos$, pelo simples prazer de matar a saudades. Como tais eventos são produzidos por seres humanos e frequentados também por seres humanos, erros são comuns, e as críticas, inescapáveis. Particularmente acho que a Zahil perdeu a oportunidade de apresentar alguns vinhos diferentes e muito bons que tem em seu catálogo. Por exemplo, enquanto o muito bom mas sobejamente conhecido Vinha Grande era servido, faltou o Quinta dos Carvalhais Colheita, que experimentei na Expovinis. Não dá para dizer que a diferença de preço possa ter influído na escolha, porque ela é pequena. Enquanto o Summit defendia com bravura e quase sozinho a honra das castas brancas, o extenso catálogo da Zahil poderia fazê-lo acompanhar-se por outras opções para preencher espaço em seus flancos. Também faltou um pouco de atenção ao serviço: enquanto muitos vinhos - por mais simples - estejam prontos para beber logo ao sacar da rolha, alguns precisariam de pelo menos meia hora de decantação para mostrar a que vieram. Foi justamente o caso de um libanês - e quem voltaria para comprar um vinho libanês de cem reais se a primeira experiência não foi das melhores? Essa sutil complexidade define muitas vezes se o vinho vai vender ou se vai sobrar na prateleira, o que é prejuízo para a marca e, principalmente, para o bolso do comerciante. Como o leitor já deve estar pensando "Mas viemos para beber ou para conversar?", vamos a elas (às botellas).
Começando pelos brancos, o Summit 2900 Reserva Sauvignon Blanc (Chile). Um belo vinho, equilibrado, saboroso, mineral, com notas de pêra (para gáudio dos conhecedores). Se você não entendeu, veja meu comentário sobre o Planeta Alastro. (uma lágrima escorrendo de leve): só consigo enxergar 'pêra' na maioria dos brancos; provavelmente seja outra coisa neste Summit, mas pode ir com fé; este branco tem ótimo buquê e boca à altura. Pelo preço (inferior a R$ 50,00), uma boa compra.
Dentre os espanhóis, o Rioja Finca San Martin Crianza (2008) é um Tempranillo com 18 meses de carvalho e proporcionou uma experiência tão inesperada quanto intensa, porque dei a dúbia sorte de pegar a garrafa ainda cheia.
Finca San Martin Crianza 2008, Rioja, 100% Tempranillo, 13,5% de álcool.
Levei ao nariz e bateu a brett (sic) com uma força que nunca tinha visto - oh, como se a conhecesse tão bem... Para quem nunca ouviu falar, brett (somente para os íntimos) é o nome do fungo Brettanomyces. É comumente confundido com um defeito da rolha, o que não é verdade. Para alguns enólogos, sua presença em baixa quantidade aporta caráter ao vinho, pois contribui para sua complexidade. Para outros é, irremediavelmente, um defeito. Se você é daqueles que ainda acha conversa mole para boi dormir quando enófilos experientes descrevem um vinho, como "fumo", "café", "folhas de outono", "ameixa marciana", "estrebaria", etc., fique sabendo que, na maioria dos casos, as observações são pertinentes! E, se você acha "estrabaria" um tanto inusitado, não se esqueça que algumas pessoas são elegantes e encontram formas delicadas de escrever... merda! Sim, merda. Porque é essa e primeira impressão que um vinho com bastante brett apresenta. E creia, leitor, bateu forte este Finca San Martin, a ponto de provocar uma primeira quase-repulsa seguida imediatamente pela inesperada sensação de "uia, que diferente" - lembra que escrevi a dúbia sorte? Pois é. Para alguns, dúbia mesmo. Para mim, a sorte grande, pelo diferente. Fiquei alguns minutos balançando a taça e experimentando do buquê, acompanhando declínio da brett e a ascensão de frutas vermelhas, bebericando devagar e apreciando a transformação quase milagrosa da boca emparelhando com o nariz. Depois da brett, potência, elegância e alegria. Por R$ 77,00 é um pouco caro, mas a experiência que proporciona, essa sim faz a diferença. E atente-se para a taça em que for beber este vinho; bem uma de boa qualidade, a experiência como narrei pode ficar comprometida (ou não), e a brett pode não aparecer tanto.
O Salentein Numina foi uma surpresa para lá de agradável. Já conhecia bem a linha reserva, uma boa compra a preço normal e excelente quando em promoção, e o portentoso Primus Malbec, definição de elegância em sua faixa de preço. Este corte pouco usual de Malbec e Merlot (66%-34%) surpreende pela força e estrutura. Final longo e prazeroso, é um excelente vinho, e parece-me que vale a diferença (a preços normais) de uns R$ 25,0 a mais do que outro participante da degustação, o Rutini Cabernet, que, por já conhecer, não experimentei nesse evento.
Representando a França, a dupla Les Hauts de Janeil Syrah/Grenache (2010) e o Les Granges des Domaines Rothschild Haut Médoc (2009) fizeram um papel honesto. O primeiro, inclusive, surpreendeu. No nariz, a Grenache dá a primeira impressão de um vinho espanhol, com frutas negras e um pouco de baunilha - a mesma que, na maioria dos casos onde tem aparecido, dá um "quê" de "já te ví em algum lugar". Neste caso, só contribui com elegância. Pelo preço (inferior a R$ 50,00), é uma ótima compra. O segundo, Cabernet Sauvignon, Merlot, Cabernet Franc, corte tipicamente francês, é dito como um vinho cuja potência responde à dos sul americanos, o que não encontra ressonância neste cronista. É um bom vinho, frutado, final não muito longo mas elegante. Não bate o Numina, por exemplo, e apenas para ficarmos com exemplos do próprio evento. Considero um pouco caro em seu preço normal, ficando mais atraente na atual promoção (uma garrafa = R$ 98,00, leve três pelo preço de duas), quando pode ser uma boa compra justamente para quem não aprecia tanto os taninos mais firmes dos chilenos e argentinos. À guisa de conclusão, o primeiro eu gostei e é bom; o segundo eu não gostei... mas é bom também, e encontrará sua clientela. Até tenho guardada uma garrafa de 2005 do Les Granges, e seria uma boa comparação abri-la com esta safra mais nova.
Para não deixar esta postagem muito comprida - e não afastar o raro leitor - encerro por aqui esta primeira parte dos comentários sobre a degustação.
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