Quando meus detratores julgavam o blog morto, acabado e enterrado, ele ressurge das cinzas! (risos). Esta é para os que vão adentrados nos 40 relembrarem a adolescência: http://www.youtube.com/watch?v=gvk6LeLYEz4. Acho que é a propaganda mais criativa do Washington Olivetto, que tratou do tema ainda nos anos 80. Uma demonstração de como um assunto que poderia ser constrangedor foi tratado com engenho e arte, colocando a delicadeza acima de tudo. Assim, o título desta postagem bem que poderia ser
O primeiro Borgonha, a gente nunca esquece.
Do começo: domingo (3 de fevereiro), por conta do pré-aniversário do Akira abrimos um
Evodia 2010, vinho eu eu comprei no dia da inauguração da Casa Deliza em S. Carlos, ainda em 2012. Vinho espanhol, 100% Garnacha, de vinhedos centenários da região de Calatayud, uma DO na província de Zaragoza, na comunidade autônoma de Aragón. Lá perto da França, portanto. É produzido pela
Bodega San Alejandro, uma cooperativa fundada em 1962 e que conta atualmente com cerca de 350 membros, o que torna praticamente impossível encontrar o produtor original se quisermos enviá-lo ao cadafalso. Evodia tem sido bem recebido pela crítica: um vinho de US$ 8,99 que, em sua safra 2011 recebeu notas como 90ST, 89WA e 89RAS. Para este apreciador, muita fruta (negra), o que descaracteriza o vinho. Conforme comentou o Akira, tem-se a impressão de algo que eu mesmo costumo dizer que é "posto com a mão", não sendo característica típica do vinho ou da produção. Ainda na opinião dele, muito doce, daquele tipo "melaço de cana". Eu não percebi, e para meu (no momento) desespero, ele levantou-se e disse que iria à sua casa (mora próximo) pegar um vinho. Voltou em 5 mim, com um Borgonha, o
Cuvée Numero 1 safra 2008, produzido por Dominique Laurent.
Evodia (2010): Garnacha (Grenache), 15% de álcool, bom para iniciantes.
Cuvée Número 1 (2008): Pinot Noir, 13% de álcool, para quem sabe o que quer (eu não sabia que queria!).
Pelo que me contou o Akira, Dominique é um dos mais conceituados produtores da França, e seus vinhedos ficam na região de Bordeaux. Mas parece que quando Dominique Laurent quer, Dominique Laurent faz, de modo que ele compra uvas em Borgonha na condição de
négociant (quando não se tem o vinhedo na região) e produz seus Pinot Noirs em Côte d'Or. Acontece que Dominique compra as uvas em Gevrey-Chambertin, uma pequena comuna que tem o status de Grand Cru. Vale dizer que comuna é o mais baixo nível administrativo da França; deve ser o equivalente a um distrito aqui no Brasil. E, ali perto (Côte d'Or é o
department à qual percente Gevrey-Chambertin), Dominique Laurent opera sua magia para produzir um vinho de entrada, o mais básico dos seus Borgonhas, o Cuvée Número 1. Em outras palavras, parece que estamos falando do lixo do luxo...
Ainda segundo o Akira, a instrução do vendedor foi clara:
não decantar (!). Esse tipo de vinho (não sei se todos os Borgonhas) deve ser aberto e consumido ao longo de algumas horas, para que seu potencial de evolução possa ser devidamente apreciado. E, convenhamos, isso não pode ser levado a cabo com meia dúzia de ávidos consumidores ao redor de uma única garrafa. Assim, por volta das 20:30, e até à 1:30, levamos a cabo a tarefa de provar até a última gota desse maravilho exemplar.
Vou recobrar o parágrafo em que falava do Evodia: o Akira considerou de buquê adocicado, o que não consegui perceber. Essa tarefa é-me difícil sem um vinho "de apoio", que permita a comparação. E o vinho de apoio chegou logo depois. O Evodia expressou toda sua melíflua característica, transmutando-se mesmo em algo enjoativo. Maldita pedra filosofal, esse Borgonha (risos). Após o desmascaramento, comecei a reparar melhor no danado: um rubi translúcido, mesmo com a taça adequadamente preenchida. Apenas 13 graus, o que sugere ótimo potencial para "suquinho". No primeiro momento da abertura, muito fechado no nariz. Com um ou dois minutos, as primeiras notas: fruta agradável, que vai-se pronunciando com o tempo. Aliás, em algum momento pareceu-me ter notas de caramelo. Também apareceu baunilha, mas de leve. Acidez presente, fazendo bom par com taninos leves. Não sou bom nem conheço tanto para fazer um leitor salivar com minha impressão de um vinho, então vai no português livre e tosco: um supra-sumo. Elegante, ótima complexidade de nariz e boca, com final médio e bom retrogosto.
A minha avaliação dos Pinots sul-americanos sempre foi a de que essa uva não em "cara" na nossa região. Cada vinho que já experimentei não guarda qualquer similaridade com seus irmãos, primos, sobrinhos, etc. O que já ouvira dizer é que isso não se aplica aos Pinots da Borgonha. Como primeira experiência, fico evidentemente prejudicado para opinar. A certeza é de querer mais. São vinhos caros no Brasil. Diz-se que um bom Borgonha começa (co-me-ça) a custar R$ 200,00, como é caso desde 90 Parker Cuvée Número 1. É muito caro, mas encontrei exemplares 95 pontos na faixa de US$ 100,00 no estrangeiro. Levando-se em conta que um "top" chileno custa mais caro em seu país de origem, está bem definida quais serão minhas compras na primeira oportunidade de bem-gastar (sic) meus suados cruzeiros (rs). Você, bebedor de Don Maximiano (já foi meu vinho preferido), Don Melchor, Dons Isso, Dons Aquilo e Dons Docas, preste mais atenção ao redor. Conheço muitos bebedores de vinhos chilenos e argentinos, e mais nada. Não sabem o que estão perdendo. Eu não sabia, também. Mas comecei a descobrir...