Saturday, December 25, 2021

Um Xatenefinho 20 anos

Introito

Teoria é quando tudo se sabe mas nada funciona. 
Prática é quando tudo funciona mas ninguém sabe o porquê.
Neste blog, associamos prática à teoria:
Nada funciona, e ninguém sabe o porquê... 

Ontem estava pensando no vinho que beberia na noite do dia 24 quando recebo uma vídeo-chamada do Akira. Atendo e, para completa surpresa, quem não aparece na tela? O Joaquim, nosso sobrinho, filho da Terumi, irmã dele. - Tio Carlossssss! Você vem jantar conosco hoje????? Golpe baixo; eu havia comentado com ele que pensava permanecer em casa. Bem, não se pode decepcionar um sobrinho tão amoroso assim, não é mesmo? De modo que às 20:00 estava chegando para a festa no apê, com a família do Akira somente. Como ele não pode beber e o restante da família não cultiva o hábito, deixei o vinho para o dia seguinte. Mas já tinha um safadinho em mente...

Châteauneuf-du-Pape

Não tenho certeza se já comentei... Châteauneuf-du-Pape é parte do Rhône, ficando na parte sul dessa apelação. Tem um enorme número de cepas permitidas que podem entrar em seu corte (Tintas: Cinsault, Counoise, Grenache, Mourvèdre, Muscardin, Piquepoul, Syrah, Terret e Vaccarèse. Brancas: Bourboulenc, Clairette, Clairette Rose, Grenache Blanc, Grenache Gris, Picardan, Piquepoul Blanc, Piquepoul Gris e Roussanne), embora raríssimos produtores cultivem todas elas. E, ao fim e ao cabo, a Grenache é quem dá o tom. Experimentei poucos, e alguns eram muito bons, inclusive um branco, excepcional. Bons Xatenêfis podem ser vinhos mais leves e delicados ou potentes e encorpados, a depender da vinificação; é preciso conhecer os produtores e seus estilos, que às vezes estão misturados. Mais ou menos como a epígrafe desta postagem...

Domaine du Pégau 

   O Domaine du Pégau tem estória que remonta a 1670. Produz uma gama de Xatenêfis, alguns Côtes-du-Rhône/Côtes-du-Rhône Villages e vinhos mais simples. Com seu nome todo pomposo, Domaine du Pégau Châteauneuf-du-Pape Cuvée Réservée parece ser o Xatenêfi mais simples da linhagem... bem, foi o que deu para pagar... 😔

 Domaine du Pégau Châteauneuf-du-Pape Cuvée Réservée 2001

Disse que o Cuvée Réservée é o mais simples? É mesmo, e ainda assim andou frequentando a lista dos 100+ da Wine Spectator de 2004, nessa safra de 2001. Corte 85% Grenache, 9% Syrah, 4% Mourvèdre e 2% outras variedades, foi muito bem avaliado pela crítica especializada, mas o surpreendente são suas notas pelo sítio amador Cellar Tracker, conhecido por renormalizar as pontuações em excesso concedidas pelos profissionais menos pés no chão ao estilo James Sucks e outros. Abri às 17:30 e estou provando com mais atenção agora, às 22:00. Ele parece estar volátil... 😕 sirvo pequenas porções para não perder a temperatura - tirando e voltando a garrafa ao balde como um bom vinho merece, tentando manter a temperatura mais ou menos constante - e quando dou conta o conteúdo da taça foi-se... 😂 Casa muito bem com um bife ancho. O nariz está naquele estilo que costumo dizer tridimensional: tem notas sobre notas, é realmente complexo; fruta madura, café/couro, terroso, mais toques que não consigo distinguir. Boca muito bem elaborada, demonstrando que está em seu auge, e arrisco que com estrutura para manter-se assim por mais tempo. Os taninos são suaves, há um dulçor agradável misturado aos 13,5% de álcool, recheado de fruta e algo na direção de couro. Madeira presente e harmoniosa, acidez verdadeiramente elegante - a boca saliva à vontade - complementa o sabor da carne com ótima permanência e final muito marcado e longo. É fácil descrever um vinho desses, as qualidades estão saltando em nossa frente, a despeito da dificuldade em separá-las adequadamente... acho que daqui pra frente só vou beber vinho assim... 😝; descrever vinhos médios é-me complicado e às vezes maçante... Veja, não é um vinho pegado. É um daqueles Xatenêfis que vai mais o lado da elegância, mas nem por isso deixa de ter presença. Às vezes classifico vinhos bem mais simples como felicidade engarrafa porque de fato o são, em sua faixa de preço - é uma classificação minha, onde o preço conta. Não conheço tanto de vinho, e meu limite (vinhos comprados quando eu era rico) está em USD 230,00 lá fora. Até essa faixa de preço, Domaine du Pégau Châteauneuf-du-Pape Cuvée Réservée 2001 é uma verdadeira felicidade engarrafada. Digo, em seu sentido mais amplo. Não sei o que vem depois...
   Deixarei meia garrafa para amanhã à noite. Contando com o impossível, convido os dois primeiros leitores que se manifestem em meu uatizápi ou no blog (vou conferir os horários!) a juntarem-se a mim para terminar com o vinho. Mas lembrem-se de Peter Ustinov em seu impagável papel como Batiatus em Spartacus (1960): Vinho de primeira, taças pequenas...

5 comments:

  1. Sensacional! Onde posso adquirir este vinho no Brasil? Sabe o preço dele? 2001 foi uma boa safra no Vale do Rhone?
    Sds,
    Eduardo

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    1. Olá, Eduardo, obrigado pela leitura.
      A safra de 2001 talvez não tenha sido excepcional, mas foi pelo menos 'boa'. A garrafa foi adquirida há alguns anos, por uns USD 90, quando um dóla ainda estava cerca de R$ 2,80. Não sei se tem representante no Brasil, mas safras velhas assim só encontramos fora. A 'brincadeira' foi uma comprovação da longevidade dos vinhos europeus, o que não acontece com os sul-americanos. O razão dela é a tão comentada acidez, característica muito valorizada nestas páginas.
      []s,
      Carlos

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    2. Olá Carlos,
      Eu andei buscando no professor google e vi que a safra 2001 foi excepcional. Veja este link que achei: https://www.winespectator.com/vintage-charts/region/rhone-southern
      Eles dizem que entre 90 e 94 é outstanding. Naquela outra revista a Wine Enthusiast, pontuam com 93, que eles classificam como excellent.
      Pena que este vinho não é encontrado aqui no Brasil. Eu fique curioso para conhecer.
      []s
      Eduardo

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    3. Olá, Eduardo.
      Bem, puxei pela cabeça sobre a safra, e não estava tão certo. Sim, conheço o sítio do endereço, aliás frequento-o sempre. Também tem este, do Parker, https://www.robertparker.com/resources/vintage-chart

      A questão na verdade é conhecer CdP, acho, e não um em específico. Tem vários muito bons. O problema é o preço deles aqui on Brasil. É escorchante; compensa trazer de fora. Um Beaucastel é vendido aqui por uns R$ 1.900,00, mas lá fora você paga uns USD 80,00 (safras novas, claro). Veja, 80,00 x USD 6 = R$ 480,00...custa cerca de 4x vezes o preço 'lá'... não dá...

      O Google também oferece boas listas de '10 Best Chateauneuf du Pape', e dá para pegar qualquer um, no preço que você queira. Mas, pegando novo, tem que guardar. É uma década de paciência...

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