Introito: recuperando um passado sisquecido
Corriam os silenciosos anos de '69. Depois de muito marcar passo - a esquerda nunca deixou passar um dia a mais -, e coincidentemente ou não no mês do cachorro louco, o governo Costa e Silva implementa a lei 5.692/71 instituindo no segundo grau a disciplina Organização Social e Política Brasileira - a famigerada OSPB. Na sequência veio a Educação Moral e Cívica, fechando o ciclo iniciado com a implantação dos Estudos de Problemas Brasileiros (EPB) no ciclo universitário um ano antes. Todas elas focavam no patriotismo, no respeito à autoridade, na disciplina e na obediência às normas sociais, tendo um claro viés de doutrinação da juventude a favor da administração de plantão. Esse período foi um dos mais negros e vergonhosos de nossa história, e não se sustenta nomeá-la ditabranda porque em comparação com os regimes da Argentina e Chile o número de desaparecidos foi muitíssimo menor. A execução ou tortura de um único cidadão sem o devido processo já é suficiente para dizer sanguinário a qualquer regime autoritário. Infelizmente mistura-se o termo autoritário com significado absolutista, despótico, discricionário, mas um Estado tem todo o direito de ser autoritário quando faz-se necessário manter a ordem pública. Usar a autoridade da força em prol da democracia é legal e tem amparo jurídico; não pode haver dúvida. Progredindo com o argumento inicial, os milicos apenas sisqueceram, ao implantar a EPB, que a universidade pública estava na barricada da resistência! 😂 Os professores universitários, especialmente na área de humanas, representavam a fina flor do pensamento de esquerda nacional - ao contrário de barbudos sindicalistas carreiristas e informantes do DOPS - e alí seu domínio era completo. O problema maior reside no fato desses mesmos humanistas falharem miseravelmente em formar uma geração talhada na firmeza de caráter e intransigente para com a corrupção e o desmando. O resultado é visto hoje em um país polarizado onde ambos os lados apoiam corruptos com tendências autoritárias e procuram, no fundo de suas crenças, motivos para continuar a suportar tais crápulas como se líderes! A sensação de ser o seu bandido preferido menos danoso do que o opositor basta para confortar espiritualmente o eleitor de cada tendência. Nossos cidadãos não aprenderam o óbvio: é desnecessário defender até o final do mandato o safado que o enganou com seu discurso cheio de contos de fadas. Nem é preciso ficar envergonhado do voto errado e se fazer de desentendido. Vergonha é persistir em um engano tão bisonho! Se o mesmo erro de interpretação acontece em outros países, pouco me importa e eles que se danem; devemos copiar os acertos dos outros, e rejeitar seus equívocos. Mas aqui acontece exatamente o contrário: copiamos os vícios e desprezamos as principais virtudes, como o tão em falta senso crítico.
Um encontro da confra #émuitovinho
Aconteceu em outubro, ainda, e ficou sem postagem. É claro, as notas ficaram para trás, mas alguns comentários podem ser úteis para o bebedor-leitor. Meu aniversário transcorreu com tantas reuniões, tanta animação e momentos agradáveis que o registro mais preciso perdeu importância. Sinto mesmo não ter-me encontrado com diversas pessoas cuja ausência não passou desapercebida; em alguns momentos provava de uma taça de lembrava-me de alguém cuja presença esteve em falta naqueles dias. Espero revê-las em breve, e algumas festas de final de ano suprirão isso.A entrada ficou por conta de uma xampa Taittinger - quase certeza de ser essa, rs. A turma aprovou, e valeu. O primeiro tinto foi o Quinta do Vallado Touriga Nacional 2008, nariz ainda com muita, muita fruta, couro e aquele toque que costumo dizer tridimensional. Os taninos estavam bem redondos, boa acidez, corpo médio, tudo bem integrado: álcool e madeira como deveriam, sem arestas. No seu auge, está ótimo para ser degustado. A Grand Cru vem importando o Vallado desde algum tempo - estava na Cantu, se não me engano, e seus preços então eram razoáveis, pois comprei essa garrafa e algumas do Field Blend, e não costumava gastar tanto em vinhos no Brasil lá por 2010, 2011... Hoje está custando R$ 460,00 (R$ 390,00 para 'sócios'), o que é muito para um vinho com valor médio de USD 33,00 segundo o Wine Searcher. Lembremos: considero esse dóla a R$ 6,00 um soluço; ele recuará, em breve ou na próxima gestão do Senhor, tanto faz: eu vou esperar. Para acompanhar um bifim, veio o Brunello di Montalcino 2015 da Donatella Cinelli, à venda nessa mesma safra pela Enoeventos. Lembro de aerá-lo por algumas horas - até ser servido talvez umas quatro - e ter-me surpreendido um pouco pela cor, algo derrubada: está atijolando, embora continue bom; a cereja típica estava lá, conforme conversamos entre os confrades, e tinha mais frutas. A boca mostrou-se equilibrada, taninos e acidez médios chamaram atenção e não impactaram tanto quanto em degustação relativamente recente, de '22. Será que a garrafa estava um tanto miada? Comento no sentido dela ter envelhecido um pouco mais rapidamente, pois o contraste foi claro para quem havia bebido dele na esperança de avaliar suas garrafas em estoque. Enfatizo: o conjunto estava harmonioso e agradável; sua cor é que deixou um tantinho a desejar. Quem comprou mais de uma garrafa poderia fazer um tira-teima; farei isso proximamente. Comprei em '20 a R$ 411,00 com algum desconto - provavelmente a preço de Enoclube por fechar uma caixa - então ficou um pouco abaixo de R$ 400,00. Atualmente está R$ 549,00 com R$ 466,00 (normal/Enoclube), que na média não é ruim para um vinho de USD 60,00 nessa safra. Mas para quem pagou R$ 400,00... Definitivamente é necessário conferir outra garrafa. Qual estava fora do padrão? Aquela degustada em '22 ou esta provada agora? Aquela tinha bastante mais potencial, e esta mostrou-se inferior; como provei não é um Brunello de USD 60,00 lá fora - note, o preço 'lá' é que não está condizente pelo vinho; seu preço aqui, pelo preço lá, até está. Prova à vista, procurando pelo mordomo. Alguém será vítima ou felizardo acompanhando a degustação?
Adendo
O confrade Ghidelli 'liga' logo pela manhã reclamando seus méritos de ter matado a procedência e o ano do Brunello - ambos foram servidos às cegas. Grande verdade, e misqueci de registrar isso! Ele inclusive esteve comigo na degustação acontecida no evento I Love Italian Wine, vide vínculo acima, quando provamos dele pela primeira vez. Comprova como o toscano mantinha suas características claramente reconhecíveis. A questão agora é por quanto mais tempo ele se manterá assim.
O fechamento do ano com as Malucas - MaLuCaDeLiu é o nome correto, e escrito aqui pela última vez 😂 - aconteceu no Nanmi. A entrada foi a Xampa Taittinger. Garimpei uma oferta dela há algum tempo, e espalhei garrafas entre as confrarias e os membros também adquiriram para consumo particular. Como foi a principal Xampa servida no meu níver, preciso dizer-me devidamente catequizado com seus toques. Não conheço muito de Xampas, mas pagar abaixo de R$ 400,00 foi uma boa compra. É equilibrada, elegante, bem superior às cavas mais comuns degustadas por aqui, principalmente o Cordon Negro. Fazendo contas, esse exemplar da Freixenet custa lá fora uns 10 dólas, contra uns 40 dólas da Xampa. Aqui fica por uns R$ 80,00 x R$ 400,000- (400 menos), e a proporção mais ou menos se mantém, com algum favor para a Cava. Se você pode, para um níver ou final de ano, deleite-se. Se não pode, bem, volte no introito e escolha seu culpado em vez de perder tempo defendendo bandidos; é indecente um trabalhador labutar durante um doze meses e não poder, ao final do ano, experimentar uma garrafa, pelo menos uma vez na vida, de uma Xampa que nem precisa ser boa, bastaria ser razoável. Algo vai muito mal e errado com uma sociedade dessas.
A turma não perdoou meu duramente garimpado 😓 Chablis Premier Cru 2022 do Domaine de la Motte. Além do cítrico evidente, tipo limão, não lembro exatamente das notas. Claro, as Malucas divertiram-se desvendando-o - acho que a sugestão de limão veio mesmo de alguém. O nariz estava rico, tinha ótima acidez e boa persistência, e encheu a boca. Por R$ 200,00- (pouco menos de R$ 200,00), é ótima compra. Por aí é encontrado a R$ 380,00+, e mostra o quão boa foi a aquisição... A Grand Cru fez uma oferta há tempos, com algumas armadilhas e boas opções. As Maluquetes recorreram aos préstimos deste Enochato e evitaram as primeiras. Entre as boas escolhas estava o Mazzei Tenuta Belguardo 2016, incursão do conhecido produtor de Chianti Classico em Maremma, próxima ao litoral da Toscana. É um corte Cabernet Sauvignon levemente temperado com Cabernet Franc, e a picância das Cabernet não pareceu evidente para mim - só procurei a composição depois. Poderia tê-la notado se soubesse da composição de antemão? Talvez, mas àquela hora o motivo da confraternização particularmente afastou-me de prestar tanta atenção ao vinho. Foi fácil perceber que estava ótimo, fácil de beber, equilibrado: nariz frutado e mais toques - era chocolate? - boca redonda, com taninos quase domados - pegavam um pouco - boa acidez e corpo médio+. Um bom vinho, que agora, fora da 'promo' (R$ 850,00/R$ 720,00 cliente comum/assinante), e custando lá fora uns USD 40,00, fica inviável. Pelos R$ 420,00 pagos, estava no limite dos 2x, boa compra. Foi um bom fechamento de ano, por mais que eu tenha tentado avinagrar (risos!) não os vinhos, mas o próprio encontro, procurando desovar nas Malucas algumas garrafas de minha adega. Se não quiseram, azar delas... 😅. Má foi bom mesmo assim. A companhia como sempre estava muito agradável, destarte minhas impertinências de sempre. Ótimo prenúncio de um bom Natal.
Como se precisasse... o Chablis onde paguei R$ 199,00 e a tubaronice correndo solta por aí.