Friday, July 28, 2017

Vinho com nome de carro?!

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Introito

Vinho com nome de carro... pode, Arnaldo? Lembro-me de há muitos anos ter dirigido um Lamborghini velozmente, quase no limite, por curvas apertadas seguidas de retas deslumbrantes, onde a velocidade chegava literalmente ao máximo. Bons tempos. Tempos felizes. Era assim: meu irmão mais novo tinha um autorama; os carrinhos eram uma Ferrari - que ficava com ele - e uma Lamborghini, que ficava comigo...

Ferruccio Lamborghini

Ferruccio Elio Arturo Lamborghini foi um industrial italiano. Filho de fazendeiros, fundou a Lamborghini Trattori em 1948 e posteriormente a Automobili Lamborghini, em 1963, fabricando carros esportivos de luxo. No início dos anos 1970, com a aposentadoria como industrial, mudou-se para a propriedade La Fiorita, adquirida anos antes, disposto a iniciar-se na produção vitivinícola. Lá foram plantadas as clássicas Sangiovese e Ciliegiolo, além de Merlot e Cabernet Sauvignon. A vinícola fica na Úmbria - dita por alguém como o umbigo da Itália - uma região limítrofe à Toscana. Nos anos 90, Patrizia, filha de Ferruccio que assumiu a produção, focou-se na Sangiovese e na Merlot. Campoleone é fruto desse trabalho.

Lamborghini Campoleone, safras 1999 e 2010

   Tive alguma sorte ao encontrar uma garrafa da safra 1999. Algum tempo depois, a safra 2010, que é a disponível aqui no Brasil, entrou em promoção. Lá fora é um vinho de 50 dólares, e comprei por menos de R$ 200,00 - uma boa compra, sem dúvida. A safra 99 lá fora custa uns 80 dólares. O bom é que está envelhecida o suficiente para uma brincadeira. Tradicionalmente, é um corte meio a meio de Sangiovese e Merlot.
  •    Lamborghini Campoleone 1999: 13% de álcool, mostrou frutas mais vermelhas, boa acidez, corpo médio.
  •    Lamborghini Campoleone 2010: 14% de álcool, apresentou couro/chocolate, frutas negras, boa acidez, corpo médio.


   Abri a garrafa da safra 2010 com duas horas de antecedência, e a da safra 1999 ao receber os convidados. A diferença fez com que os vinhos evoluissem quase ao mesmo tempo, mas mostrarem-se melhores depois de duas horas do início dos "trabalhos" (!). Ou seja: um bom serviço para o 2010 recomenda sua abertura com 4 horas de antecedência. Mas se o degustador desejar acompanhar a evolução - e eu acho que aí está a graça do vinho - a abertura com 2 horas será bastante boa.

   A motivação do encontro foi acerca de repetidas conversas na confraria acerca da internacionalização dos vinhos quando adentramos o Século 21. Parece que a conversa seria mais ou menos vinhos do Século 21 para bebedores do Século 21, ou alguma troça assim. Essa inspiração tornou-se mais conhecida com o advento do Brunelogate, uma proposta de internacionalização dos vinhos italianos para que eles se tornassem mais palatáveis ao consumidor novomundista. Os vinhos continuam bons - até onde seja possível - mas à custa de sacrificar o terroir - o bentido terroir. Só que eles perderam algo. A essência, talvez? No presente caso, não foi muito diferente. Campoleone 2010 é bom. Mas... note a quantidade de álcool. Diferença de safra não é suficiente para proporcionar tamanha variação alcoólica. A menos que fossem safras muitos díspares, uma excepcional e outra absolutamente decepcional (sic! risos!). Não é o caso. Então mudou um pouco o processo. E com isso alguma coisa também foi sacrificada.
  No final, o que temos ao experimentar por exemplo um Brunello pós-2004 é um vinho algo doce logo na abertura. Abra um bom Brunello 1997 para ver de saída aquela água de riacho depois da chuva, que vai evoluindo com as horas(!) até se tornar... um Brunello! Assim, você, bebedor de hoje, que só conhece a safra 2010 de Campoleone, lembre-se sempre da alegoria da caverna de Platão: os vinhos de hoje estão se tornando uma espécie de ilusão daquilo que deveria ser um verdadeiro vinho.

   Chega de conversa fiada. O leitor pode meditar um pouco a respeito por sua conta e risco. Ou sua conta e riso, o que em muitos casos dá na mesma (risos!). De preferência à borda de um bom copo. Termino com as palavras de um dos colegas da confraria:

O 2010 é melhor... 
mas eu prefiro o 99...