Friday, March 27, 2020

Pêra Grave 2016

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Introito

   O inexistente leitor vai me chamar de picareta. Mas verti um tanto de vinho na taça depois de deixá-lo descansar por uma hora, olhei a cor e pensei comigo: - Bem escuro... parece Syrah. Já degustando o vinho, fui olhar a ficha técnica - vinhos portugueses normalmente são cortes complexos que podem ou não mesclar suas uvas nativas com outras, principalmente as bordalesas CS e Merlot. Não deu outra... Aragonez, Cabernet Sauvignon, Syrah e Alicante Bouschet... Já havia bebido uma garrafa dessas tempos atrás, nas no meio de outras. Na algazarra, passou despercebida - o clima era mais festivo e menos meditativo. Enfrentando esses tempos de clausura com a calma que só os anos provêm, vamos a uma análise mais técnica.

O Alentejo

   Dizer que há cinquenta anos o Alentejo não tinha muito o que comemorar em termos vitivinícolas é uma verdade. Só não faz jus a uma região que produz vinhos há 2.000 anos... Com uvas trazidas pelos romanos nos tempos de Cristo, o vinho alentejano já era respeitado antes de Portugal de Portugal, e até o século XVII. O surgimento do Douro como a primeira região de vinhos demarcada do mundo, em 1756, jogou o Alentejo - e todo restante de Portugal - em uma espécie de limbo. Esforços para reerguer a região começaram a ser empreendidos com mais seriedade no final dos 1980. A partir dessa data foi criada a Comissão Vitivinícola Regional Alentejana (1989), e nos anos 1990 a Syrah foi introduzida na região, por seu uma casta que adapta-se bem aos solos pobres típicos de lá. Hoje, praticamente todas as grande vinícolas alentejanas usam a cepa, inclusive em seus melhores vinhos. Esforço daqui, esforço dali, muita gente boa trabalhando com afinco e, vinte anos depois, os resultados começaram a aparecer. O vinho alentejano voltou a ser celebrado não apenas em Portugal, mas no mundo todo. É com tal perspectiva que daremos mais um passo rumo ao Pêra Grave.

Évora

   O Alentejo é dividido em oito regiões. Sem demérito para as demais, Évora é a mais conhecida pelos brasileiros - o Pêra Manca, um de seus vinhos mais icônicos, é citado em crônicas do século XVI, ainda no primeiro apogeu da região. É ali onde se abriga a Quinta São José Peramanca. Depois de mais de um século afastada, a família Graves retomou as terras em 2003 e, em 2005, é engarrado o primeiro Pêra-Grave. A estória está contada no sítio do produtor.
   O Pêra-Grave tinto, 2016. Após descansar uma hora antes de ser resfriado e daí para a taça, o Pêra-Grave mostrou boa fruta, ótimo equilíbrio entre acidez, tanino e álcool. Na boca tem boa persistência, muito macio, diria que dá um baile em sul americanos na mesma faixa de preço. Sinal que os sul americanos estão caros - algo que tenho comentado invariavelmente nestas páginas e à boca solta por onde o assunto seja vinho 😂...
   É um vinho de 12 Euros em Portugal, valor que o coloca acima da categoria de vinhos de consumo diário. Fácil de beber, está bem pronto, e o produtor indica que ainda pode ser guardado por mais 10 anos.
   Em tempos de Real curto, se você pegar uma promoção,aproveite. Será uma ótima compra.








Thursday, March 26, 2020

Chanson Pere & Fils Le Bourgogne 2012

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Introito

   Meus detratores dizem que sou hipocondríaco. Não é verdade. Aliá, detratores dizem qualquer coisa sobre seus detratados. É verdade que tenho um aparelhinho adaptado a meu organismo que passa a vida (rs) a checar-me o sangue. Avalia as hemácias, os leucócitos, as plaquetas, os níveis de proteínas, sais, hormônios, ácidos úricos, amônia... são 679 medições simultâneas e constantes que resultam, a cada quinze dias, mais ou menos, em algum tipo de alarme (falso) a respeito de minha saúde. O começo da noite já ganhara forma e eu ainda trabalhava quando a voz sintética que bem poderia ser de uma dominatrix começou a avisar, com um toque muito sensual:
  - Cuidado, nível de Borgonha no sangue perigosamente baixo. Cuidado, nível de Borgonha no sangue perigosamente baixo. Cuidado...
   Pego de surpresa mas com reação imediata, levantei-me e corri para a adega. Desci a escada já sabendo o que queria...

Chanson Pere & Fils

   Chanson Pere & Fils é uma casa quase tri-centenária. Fundada em 1750, possui hoje propriedades espalhadas por toda a Borgonha, e mais notadamente em Santenay, Chassagne-Montrachet e Puligny-Montrachet. Foi adquirida pelo grupo Société Jacques Bollinger, holding da  Champagne Bollinger, em 1999. Essas informações e muitas mais você encontra aqui.

Le Bourgogne

   Le Bourgogne está na linha de entrada da vinícola. A produção da casa é extensa, e listada aqui, por regiões. A safra de 2012 não foi das melhores na Borgonha, obrigando os produtores a uma rigorosa seleção das uvas. Isso tem efeitos curiosos: com maior seleção, a quantidade de garrafas de melhor nível cai, numa tentativa de manter a qualidade intacta. O preço sobe (em outros lugares, talvez não. Mas na Borgonha, sobe...😭). Por outro lado, os vinhos mais simples recebem uma carga adicional de uvas relativamente ruins procedentes de vinhedos melhores! (afinal, sendo uva, vai virar vinho...). Se bobear, a qualidade desses vinhos mais simples aumenta! Nunca me esqueço de um causo narrado pelo simpático João Buchalla, representante comercial da Qualimpor, acerca de um concorrente: numa dada safra muito, mas muito ruim, os produtores da Casa Ferreirinha decidiram de cara que naquele ano não haveria Barca Velha (um dos vinhos mais icônicos de Portugal). Foram testar se poderia sair como Ferreirinha Reserva Especial. "Claro que não"... Rebaixaram para Quinta da Leda. Necas. Rebaixaram para Callabriga. Nem assim! Resultado: daquela safra ruim saiu o melhor Vinha Grande da história...
  Voltando... esta meia garrafa de 2012 está em bom momento para consumo. Não é um grande vinho. Ei, é um vinho de entrada! Não tem um final marcante, mas a persistência é razoável, advinda da boa acidez. Tem boa fruta, boa presença na boca, bem equilibrado. Com 12,5% de álcool, surpreende bem pela harmonia do conjunto.
  É comercializada por uma daquelas importadoras que não está entre minhas favoritas. Adquirida há algum tempo em uma queima que fazia sentido, safra mais recente chegou a custar proporcionalmente bem mais caro em 2020. Assim como os Jabouletinhos do mesmo grupo: no ano passado, R$ 49,00. Neste, R$ 75,00. Assim sendo, vale a máxima: compre se estiver na promoção. E não se deixe enganar: wine-searcher neles! Se você sentir que tá pegando (no bolso), saiba que o mercado tem outras opções tão boas quanto, a preços mais razoáveis.




Tuesday, March 24, 2020

Vasari e seu Mamertino di Milazzo Rosso: dois milênios de história

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Introito

Em tempos de Corolla vírus (sic), trancado em casa tendo por interlocutores a Mel e o Lemão, foi com pouca expectativa que escolhi esse vinho. Depois de dar-lhe uma hora e meia de ar, jantado, sentei-me para escrever e saber mais sobre ele. E não é que foi surpresa para todo lado?

Mamertino di Milazzo

  Milazzo é uma cidade localizada a nordeste da Sicília. Marmetini é o nome do povo que chegou na Sicília em 310 a.C. e, em algum momento, descobriu na região seu potencia vitícola. O vinho era um dos preferidos de Júlio Cesar (100-44 a.C.) e respeitado por historiadores como Plínio (23-79 d.C.). Com tanta história, é surpreendente que a região só tenha sido reconhecida com DOC em setembro de 2004(!), que pelo menos teve o mérito de delimitar as zonas de plantio, estipular as regras de produção e salvaguardar o estilo. Uma descrição bem mais completa está aqui.

Azienda Agricola Vasari

A Azienda Agricola Vasari 1, 2, é uma cooperativa localizada em Santa Lúcia del Mela. Produz vinhos baseados nas castas típicas da DOC,  Nero d'Avola e Nocera para os tintos, e Catarratto , Grillo e Inzolia para brancos. A safra 2008 foi declarada como um corte 90% Nero d'Avola e 10% Nocera. Seu rótulo nacional contém a importante informação de sugestão de serviço: 18 °C.

Vasari Mamertino Rosso 2008

Seus 13,5% de álcool estão bem integrados. Com o "respiro" de uma hora e pouco como já comentado, apresentou boa acidez, equilíbrio com boa fruta, pouco açúcar, persistência e final médios. Combinou bem com uma pizza de peperoni, e para mim é também indicativo de um vinho pronto para o consumo, e que não deve ser guardado por mais tempo... hum... quantas garrafas eu tenho, mesmo? Acho que mais uma. Bom para beber nos próximos seis meses. Paguei R$ 70,00 na garrafa. Tá, outro tempo (sic), outros "Dóla" (rs). A impressão é que valeu a pena. Passados tantos anos - e algumas garrafas - continuo gostando. Sinal de boa compra.

Post Scriptum

Havia deixado um pouco de vinho para o dia seguinte. Tá, não tinha conseguido terminar com ele, mesmo... Mas foi de propósito... 😁
Imaginava que continuasse com... e confesso não imaginar que fosse até dar uma melhorada. Apareceu café... (chocolate? - rs!). Na boca, continuou com boa acidez e persistência. Perfeitamente bebível... Algo que não se nota nos vinhos sul americanos... deixar de um dia para o outro é suficiente para notar que tanto ar já não faz bem e esses exemplares.
É isso...

Wednesday, March 11, 2020

O Numanthia

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Introito

   - Carlão, a gente põe umas garrafas na mala do menino - assim, com seu jeito bonachão, o Paulo rifou algum espaço na mala do Vinícius, seu filho que viajaria para em curtas férias para... . , no caso, é a Terra Prometida dos amantes do vinho, um lugar onde os bons preços caem do céu como um maná eterno, e o bebedor não precisa estocar vinhos como um louco ao menor sinal de queima de algum importador que na verdade apenas reduz sua margem para índices civilizados, tentando economizar assim algumas moedas. Sim, é a América. Bem, depois de conseguir uma mala de vinhos (sic), nada mais justo do que convidar meu benfeitor para experimentar um pouco do que ele me conseguira franquear um frete. Escolhi algo não dessa leva; escolhi algo que há tempos estava em minha adega e eu já achava estar bom para experimentar...

Numanthia

   A Bodega Numanthia tem um sítio bem organizado, embora um pouco chato de entrar. Localizada na DO de Toro, próximo à municipalidade de Valdefinjas, na DO Castilla y León, sendo uma das cinco regiões com denominação própria (as demais são Bierzo, Cigales, Ribera del Duero). Toro é uma região que, no século XIX, sobreviveu à infestação de Phylloxera. Conta-se que o bichinho deu de cara com as uvas e fugiu de medo, sem infestar as raízes dos parreirais. Não sei... sei que a uva autóctone é a Tinta de Toro, uma variedade da Tempranillo com a característica de possuir casca mais grossa, resultando em maior acúmulo de taninos e, portanto, vinhos verdadeiramente pegados.
   A Bodega faz parte da Grandes Pagos de España, entidade que reúne a elite dos produtores espanhóis. Em 2008 foi adquirida pelo grupo de artigos de luxo LVMH, que reúne umas marquinhas como Moët & Chandon, Hennessy, Louis Vuitton, Bvlgari e muitas outras. Produz três vinhos, Termes (de entrada), Numanthia e Termanthia (o ícone).
   Numanthia 2003
    14,5% de álcool, 100% Tinta de Toro (Tempranillo).
 Uma característica muito importante é a atenção que se deve ter no serviço. Abri Numanthia com 24 horas de antecedência, e fui acompanhando a evolução. Já havia experimentado um Namanthia anteriormente, com 10 anos, e pouca decantação. A avaliação está aqui, no Vinhobão. Aberto às 20:00, no dia seguinte, às 8:00, ainda estava fechado. E já estava com 15 anos nas costas... Ao meio dia, começou a abrir e mostrar mais fruta. às 20:00, como gosto de dizer, "era vinho"... Boa fruta vermelha, café/chocolate, algo de especiaria, muito corpo (graças ao tanino e à boa acidez), equilibrado. Ótima persistência, e final longo - longo mesmo.
   Para o Paulo e para o Vinícius, foi uma experiência única o quanto Numanthia "lavava" a boca após cada bocada do cordeiro preparado no Solar dos Portuga. Para este que voces escreve, foi uma prazer voltar a provar de Numanthia desta vez acertando melhor o serviço desse vinho que, sem dúvida, vale  pena ser experimentado. No Brasil, custa um tanto caro - e as safras disponíveis são novas... Se puder, tenha paciência, dê-lhe pelo menos 10 anos e decante 24 horas sem dó nem piedade.






Mais queima... queimem... queimem...

... queimem nos infernos! (risos!)
Quando um blog tenta se manter à custa de comentários rápidos, é porque ele anda agonizando mesmo. Da última vez comentei uma queima que não era "tão queima" (sic! rs!) assim. Vejamos esta.

Cerdeña Isola dei Nuraghi 2007, Argiolas, Sardegna, sul da Itália. 
De R$ 827,32 por R$ 353,44 (Dóla (sic) a R$ 1,79 na oferta).


É um bom preço, visto que lá fora duas safras intermediárias (2004 e 2006) apresentam um preço médio de R$ 230,00 (são os R$ 192,00 do preço médio acrescidos dos 20% de impostos sobre bebidas, que é média no Velho Mundo).
Lembemos que a cotação do Dóla  (sic) está estratosférica: R$ 4,71. Esse é o oficial, aquele valor pelo qual você não o compra. "Pra você" está R$ 4,91. Mais 6,38% - e agradeça os (governos) antepassados por mais essa. De qualquer maneira, isso faz a cotação do vinho lá fora, hoje, a R$ 230,00, ficar próxima da oferta. Se fizermos a conta com um Dóla "caro", R$ 4,00, basta retirarmos 20% do seu custo, R$ 230,00 * 0.8 = R$ 184,00.

São R$ 180,00 contra R$ 360,0 (grosso modo). Chegamos... ao dobro!

Pagar o dobro por um vinho não é caro, dado o "custo brasil", seguido pelo "lucro brasil", ainda mais quando ambos são aplicados juntos e de maneira exponencial, caso de várias importadoras. Mas não todas! Não senhor. Vejamos mais abaixo.

Conclusão: É uma boa oferta? Sim. Me atrai? Não.

Voltando a casos mais interessantes, sob meu ponto de vista. Minha política tem sido comprar de quem vende a preço bom o ano inteiro. Vejamos um exemplo: da mesma Argiolas (releve a safra), encontramos, no mercado nacional:


Preço médio lá fora (sem impostos); R$ 255,0. Sim, com esse Dóla (sic) lá no alto. Quem desejar mais detalhes ou refazer as contas, "teje" à vontade. Ah, sim: se participar do Enoclube, sai a R$ 558,00.

Para encerrar: não, não é uma propaganda explícita do concorrente. É só uma propaganda velada mesmo... (risos!)