Wednesday, January 16, 2013

Três Leonzinhos e um Leão da Montanha

   Ano novo, sacanagens novas. Não foi com outro intuito que tentei reunir a caterva, com êxito apenas parcial: dois faltaram. E assim, perdendo um pouco o timing, comecei a acrescentar mais uma boa intenção ao inferno: queria ter feito esse encontro há mais tempo, para não deixar uma das garrafas envelhecer tanto. Queria...

Merlots

   A Merlot é uma cepa francesa cultivada em quase todo o restante da galáxia, e gera vinhos encorpados, com boa fruta, macio quando devidamente decantado (até onde conheço), e foi coadjuvante no engraçadinho filme Sideways - Entre Umas e Outras (quem não se lembra do final, quando o sujeito retira um Château Petrus de dentro da mochila? Se não me engano, ainda bebe no gargalo...). A Merlot é a estrela na região de Bordeaux, França, de onde saem alguns dos vinhos mais conhecidos (e caros) do mundo, como o próprio Petrus.
   No Chile, durante muito tempo a Merlot foi confundida com a Carmenère, até que esta última foi redescoberta nos vinhedos andinos. Mas a Merlot em si continua sendo bem cultivada, embora não tenha gerado ícones - até onde eu saiba. Alguns exemplares são muito bem avaliados, como o Cuvée Alexandre, da Lapostolle, e o Max Reserva, da Errazuriz, que eu particularmente gosto muito.
   Nos Estados Unidos, a Merlot começou a chamar a atenção na década de 1980, através dos vinhos produzidos em Washington (o estado, não a capital). Na Califórnia, as regiões de Napa e Sonoma geram bons cortes e varietais.
   Passado este intróito, e de olho no título, o leitor já percebeu o que vem por aí. Foram para seus respectivos decantadores três exemplares do Leon de Tarapacá Merlot safras 2004, 2008 e 2010, acompanhados de um Pride Merlot 2006, da Pride Mountain Vineyards. É claro que a ideia nunca passou por comparar uns e outro; antes, foi comparar os uns (sic) entre si, com um tempero do outro.
   Infelizmente o Leon 2004 estava passado. Não estragado, mas já na descendente da curva (e quase lá embaixo - rs). Tão "bebível" quando o Tributo 2005 que comentei aqui. E chegamos ao meu interesse oculto na brincadeira toda: comparar a longevidade desses vinhos, o brasileiro de um lado e o chileno de outro. O Leon 2004, um ano mais antigo, foi aberto seis meses depois que o Tributo 2005. Este um ano e meio faria diferença? Acredito que alguma, mas não o suficiente para trazer o Leon para o lado esquerdo da curva. Ele poderia estar ligeiramente mais bebível, e isso não afetaria o meu julgamento: um empate técnico.
   Não pense o leitor que intento, novamente (e como se não bastasse), falar mal do vinho nacional. Como consumidor, quero apenas abalizar qualidades que, em última instância, nortearão minhas compras. E nesse quesito (falar mal) entra a questão preço. Um Tributo custa entre R$ 25,00 e R$ 40,00, dependendo do estado, mas fiquemos com o preço do sítio do produtor, esquecendo-nos do custo do frete: R$ 21,00. Custo de um Leon de Tarapacá no Chile: R$ 7,00. É nesse momento que preciso invocar o meu bordão:

Pessoal, o imposto é só (sic!) 50%!
Pesquisa de preço de um Leon de Tarapacá no Chile, usando o Wine-Searcher.

   Falando dos outros Tarapacás: estavam bons para consumir, e não enganaram ninguém. Um pouco de pimenta no 2010, o 2008 mostrando alguma fruta e querendo passar por vinho português na abertura, mas também foi desmascarado com alguma evolução. Final curto, bom vinho para dia-a-dia, embora perdendo no preço para portugueses melhores e só um pouco mais caros, como o Cicônia, e talvez até para o famigerado Toro Loco, ou Doido, já não me lembro bem. Taracapás foram os vinhos que mais consumi na vida, mas isso é passado. E, passados os Leonzinhos, que venha o verdadeiro Leão da Montanha.

   Pride Merlot 2006, segundo o sítio do produtor, possui 11% de Cabernet Sauvignon. Complexo, final longo - loooon-gooooo - retrogosto marcante. Eu disse que tinha algo como café - ou chocolate (rs!) - e fui desmentido (gargalhadas), mas segundo as notas do produtor, "Cereja vermelha, framboesa, cacau e notas de alcatrão". Muito redondo, elegante, 14,8% de álcool que não aparecem - mas estavam muitíssimo presentes no momento da abertura. Aliás, o que se notava na abertura era álcool puro; poderia assustar bebedores mais afoitos. Três horas de decantação em temperatura ambiente seguido de 40 minutos na geladeira (tampa do decantador coberta, é claro) fizeram-lhe bem. Para todos ficou evidente que a comparação com os três primeiros não seria possível. E no final ninguém reclamou de ter de passar pelos Taracapás antes...
O Redentor ladeado pelos vendilhões. Ficou assim porque o Endrigo levou uma das garrafas antes da foto.


Thursday, January 3, 2013

Flaherty e Quinta Geração: dois chilenos para começar o ano

De volta aos chilenos

   É, fazia algum tempo que não bebia alguns chilenos "médios" (preço e qualidade). Estava nos extremos, defendendo-me no dia-a-dia com algum básico Leonzinho ou com um Milenium por conta do Natal, e de um Taracapá a outro ia... como é o nome daquele blog mesmo?... decantando a vida.  De repente o Flávio volta da viagem de final de ano e fizemos um bate-copo rápido, juntando também o Akira. Entrei com um Quinta Generación 2007, comprado no Chile por uns módicos R$ 50,00, mais ou menos - daí a liberdade de dizer "médio" no quesito preço - e o Flávio trouxe um Flaherty 2008, que em minhas caminhadas andinas passara despercebido. O sr. Vinhobão já comentou sobre os vinhos e quase esgotou o assunto; a postagem dele está aqui. O que faltou dizer é o que comentarei a seguir.

Quinta Generación 2007, 14% de álcool, e Flaherty 2008, 15% de álcool. Veja comentários no Vinhobão.

   Em primeiro, decantei o Quinta Generación por cerca de duas horas, quando ele deu entrada (sic) no refrigerador para só então começar a resfriar. O Flávio chegou e ele ainda não atingira uma boa temperatura; pegamos apenas uns dedinhos cada. Mesmo com a decantação, a pimenta apresentava sua face mais característica: cheirava a tabasco. Amaciou bem com o tempo - mais uma hora após sair da geladeira. O que os amigos não puderam presenciar foi a degustação do dia seguinte, quando ainda pude experimentar uma taça generosa. O vinho ficou na garrafa, tampado, mas sem vácuo. A pimenta amaciou sobremaneira, e o chocolate apareceu mais. Isso sugere mais decantação para quem não curte a pimenta típica da Carmenère (sob o risco de descaracterizar um pouco o vinho). O interessante é que, mesmo passando mais 16 horas na garrafa, o Quinta Generación sobreviveu, ressaltando bem suas características secundárias.

   Teve bão (sic).