Wednesday, June 27, 2012

Marqués de Vitoria - um Rioja Gran Reserva 2001

   O Roger é um amigo do peito. Em janeiro, chegando de viagem, parou no free shop e carregou três distintas garrafas de Quinta da Bacalhôa, deixando-as descansando em sua casa enquanto eu não passava por lá para um devido resgate. E calhou que em 17 de junho fui a Sampa, quando decidi testar a indulgência do anfitrião com minha competente boçalidade. Não é que, de cara, fiquei sabendo que o canalha confiscara duas das garrafas para seus rituais pagãos do que eles chamam... Páscoa? Ainda disse, entre risos, que de fato o Bacalhôa ficou maravilhoso acompanhado de um Bacalhau. Quem me conhece sabe que eu já prescrevi como mote de degustação "O Encontro do Bacalhau com a Bacalhôa". O cartaz de divulgação seria um bacalhau com bigode de português piscando para a bacalhôa, na forma de sereia. Tudo a ver! Voltando à decepção: para que meu desgosto não fosse menor, o Roger ainda propôs (impôs?) que o terceiro Bacalhôa ficasse por ali mesmo, degustado por nós, já que ele gostara bastante. Poucas vezes senti-me tão sacaneado, e fui para a adega olhar o que tinha por lá. Foi quando dei de cara com o Marqués de Vitoria, um Rioja Gran Reserva 2001, ou seja, no ponto de abate. E vindo diretamente da origem, sem intermediários, em alguma navegação anterior do meu viajado amigo. Pensei comigo: é esse...
Marqués de Vitoria Gran Reserva 2001, 100% Tempranillo com 13,5% de álcool.

   Saquei o saca-rolha (sic) e com paciência e cuidado fui extraindo a dita. Estava intacta, de boa qualidade, mas como não conhecia o produtor (e por outro lado conheço bem algumas rolas de segunda que inundam o mercado), a precaução substituiu a canja, que decididamente não iria bem com um vinho desse tipo. De cara deitei um pouco nas taças. No nariz, fechado. Resolvemos estender a conversa na cozinha, enquanto o Roger tentava agradar-me com seus dotes culinários. Na volta, apenas alguns minutos depois, o milagre do pão já fizera efeito: buquê frutado, bem elegante. Não apresentou aquele "chulé" presente em vários exemplares da região, e que para mim desmascara a origem. Na boca, um pouco de pimenta. Final longo, retrogosto picante mas sem amargor. Valeu muito, um vinho que recomendo para quem tiver a devida oportunidade. Pena que ele só trouxera aquele exemplar, ou eu organizaria uma expedição punitiva para a semana seguinte, em função da tunga dos Bacalhôas. Acabamos não avançando para outra garrafa; no dia seguinte teríamos compromissos logo de manhã... e certamente o Bacalhôa, apesar de bom vinho, não faria sombra naquele Rioja...

Sunday, June 17, 2012

A noite dos Barolos sanguinolentos

   Quem tem mais de 40 anos poderá lembrar-se do antigo seriado de faroeste e ficção científica James West, que passava na tv durante os anos 70. O que talvez não esteja lembrado é que todos os episódios tinham o título começando por "The Night of...". Por outro lado, sanguinolento, além de coberto de sangue, também tem o significado de feroz. E foi isso que experimentamos na noite do dia 16: três potentes e "ferozes" Barolos... muito embora a epopeia tenha começado à luz do dia. Sim, porque abrimos os exemplares às 14:30 para degustá-los a partir das 20:30, estratégia que revelou-se acertada.

   Do começo: como o Endrigo e a Vânia estavam com um Marchesi di Barolo Cannubi 2004 e secos para secá-lo (sic) até a última gota, lançaram-me um desafio. Eu tinha apenas um humilde Beni de Batasiolo, também 2004 e, cochichando com o Flávio do Vinhobão, Brunellista de nascença e Barolista de primeira hora (rs), ouvi dele a disposição de apresentar um Cogno Cascina Nuova 2007 para uma refrega.
Barolos Beni de Batasiolo (13,5% de álcool) e Marchesi di Barolo Cannubi (14,5%), ambos 2004.

   Conhecedor do caminho das pedras para degustar um bom vinho europeu, o Flávio sugeriu que todos fossem abertos horas antes. Abri os que estavam comigo às 14:30, quando retirei um dedo (ok, um dedo e meio) de cada garrafa, para aumentar a área de troca de ar e fui degustando-os lentamente até às 16:00, entre uma leitura e outra. Inicialmente muito fechados, foram transformando-se agradavelmente até o último gole, e eu cada vez mais ansioso para o que viria depois. Vamos chegar lá.

   Às 20:00 chegaram o casal Endrigo e Vania, devidamente recebidos com um Nemorino, da I Giusti e Zanza, a título de "abertura dos trabalhos". Aqui, um parêntese. A I Giusti e Zanza é uma vinícola que produz uns poucos supertoscanos e está situada na Comuna di Fauglia, na província de Pisa. Seus principais vinhos, Nemorino, Belcore e Dulcamara têm seus nomes retirados da ópera burlesca O Elixir do Amor (L'elisir d'amore). Nemorino é um simples aldeão que se enamora por Adina. Nemorino é o vinho mais simples da I Giusti e Zanza, e embalou nossos primeiros goles enquanto o Flávio não chegava. Mais um pouco a campainha toca e lá está ele, Barolo em uma mão e na outra uma panela contendo um delicioso carré de cabrito que ficou ainda melhor acompanhado pelos vinhos.

Nemorino, corte de 60% Syrah, 30% Sangiovese and 10% Merlot, da I Giusti e Zanza.

   Conhecedor dos vinhos que seriam degustados, o Flávio apresentou-os na ordem do mais leve ao mais encorpado: primeiro o Batasiolo, depois o Cascina e finalmente o Cannubi. A diferença estava de fato perceptível, embora o Cannubi estivesse - ainda - um pouco fechado... Particularmente, senti um problema: a ausência de um boi de piranha chileno ou argentino para fazer o contraponto. Explico: na opinião do Flávio, qualquer um dos Barolos era mais encorpado do que um vinho sul americano. Se tivéssemos aberto um, o padrão de comparação seria mais fácil. Como estávamos bebendo apenas vinhos italianos, senti certa dificuldade em resgatar minha "memória degustativa" para fazer a comparação. Coisas de iniciante, seguramente. O que pode-se assegurar é que a ordem estava realmente correta e foi surpreendente observar como, com seis horas de decantação, os vinhos transformaram-se e continuaram evoluindo. O Nemorino ficou de lado, para voltar à baila quando os Barolos tinham acabado e... outra surpresa! Como evoluiu ele também! 
Cogno Cascina Nuova 2007 (14,5%).

   O evento estendeu-se até 1:30, o que significa que por volta da 1:00 ainda tínhamos Barolos nas taças. E estavam todos muito, muito bons. Até porque o Flávio vai analisá-los com muito mais competência no Vinhobão, e dados meus compromissos com viagem, vou sugerir ao leitor uma passada por lá.

Monday, June 4, 2012

Chateau Ksara Le Prieuré 2009

   Estes dias abri um Chateau Ksara Le Prieuré, corte de Cabernet Sauvignon, Carignan, Mourvedre and Cinsault (quantidades não especificadas nem no sítio do produtor). É produzido no Vale de Bekaa e tem 13% de graduação alcoólica.  As uvas são colhidas manualmente e as variedades são maturadas separadamente, entre 14 e 18 meses, antes de se fazer o corte final.

   Já publiquei sobre o Chateau Ksara na primeira parte do Wine Tour da Interfood, mas Le Prieuré não foi apresentado naquele evento. É um vinho na mesma faixa de preço do Reserva do Convento, então comentado. Le Prieuré é mais leve do que o Reserva do Convento, portanto pode não agradar aos bebedores de escola sul-americana, acostumados à força dos chilenos e argentinos. Le Prieuré tem taninos macios, mas mais no sentido de leves do que de redondos; também não são quadrados (risos), mas apenas... adequados. O mais curioso ao degustá-lo foi que a cada nova taça os primeiros goles vinham um pouco azedos, e depois o sabor aproximava-se mais do buquê, no sentido de formar um conjunto harmonioso e fácil de apreciar. Aromas à fruta vermelha facilmente identificáveis tornam Le Prieuré um vinho que agrada iniciantes - embora o preço não seja para tais bolsos, já que iniciantes não costumam comprar vinhos na casa dos R$ 50,00 - e agradará muito a ala feminina pela referida leveza. É uma experiência interessante, principalmente pela fato de vir de uma região vinícola pouco conhecida entre nós brasileiros. É vendido na Mercearia 3M.