Friday, October 30, 2020

"Eles" atacam

Introito

   Costumamos dizer por aí, à boca miúda, que enochatos são mascarados, políticos são desonestos, importadores são energúmenos e jornalistas, pelegos. Uma vez a Federação Paulista de Futebol fez assim: sorteava dentre os torcedores que compareciam ao estádio meia dúzia de gaiatos. No intervalo eles entravam em campo, uma bola era posta no círculo central e a missão de acertar o gol com um chute. Tinha um prêmio, talvez em dinheiro, não lembro, para quem o fizesse. Raras bolas atravessavam a linha de fundo dentro das linhas que delimitavam a pequena área. Algumas saiam pela lateral. Com sua costumeira verve, o Silvio Luiz comentou: "Esse é o sujeito que, na arquibancada, vaia o jogador quando ele erra em passe de 40 metros". O brasileiro é assim... acredita-se o senhor das moscas coisas, mas no fundo pouco sabe de qualquer assunto. Não respira e come ao mesmo tempo porque o cérebro comanda uma das operações automaticamente. Presente para dar palpites, não vai muito além: palpites, mesmo. Suposições vazias, sem qualquer coerência. Veja vários comentários neste mesmo blog, por parte de seus detratores. De maneira que, por esse parâmetro (cada um dá seu palpite), e segundo eles próprios, enochatos não são mascarados, políticos são honestos, importadores são competentes e jornalistas são os mais sérios e profissionais entes da face da Terra.

Mais um 'Teste Folha'. Teste quem?

   Certa vez a 'Folha de São Paulo' fez um levantamento dos professores-pesquisadores improdutivos na USP. Avisou em próprio diário que o faria. Sim, isso mesmo: considerou-se importante a ponto de acreditar que seu próprio 'aviso' deixaria a comunidade acadêmica ciente. Um professor no departamento onde eu estudava entrou na lista: nada publicara nos dois anos anteriores. Seu apelido - era 'moleque', apenas uns anos mais velho que nós, de maneira que tínhamos alguma liberdade com ele - virou Improdutivo. Detalhe: ele passara os dois anos anteriores trabalhando em seu doutorado na Universidade Manchester, então apenas e simplesmente uma das mais conceituadas do mundo na área de computação... Durante o começo dos anos 2000, a 'Folha' promovia, em seu caderno de informática, o "Teste USP". Era ridículo engraçado. Professores que jamais na vida tinham visto um fotolito opinavam sobre programas de desenho criativo e de editoração eletrônica - para ficar apenas neste exemplo. Em 2013 escrevi sobre um "Teste Folha" de vinhos. Está aqui. Essa moçada tem estória... Não a faz, mas a tem...

Hélio quem?

   Desta vez um colunista da 'Folha' relata em seu espaço que um restaurante serviu, por engano e entre si, o vinho trocado de duas mesas. O vinho de '10 dóla' de um casal apaixonado foi para a mesa de uns "wall-streeters" (sic), enquanto o vinho destes, de 1.500 'dóla', foi parar na mesa do casal. Nenhum deles percebeu a diferença. Por explicação, Hélio diz que o problema está no nosso cérebro. Ele escreve, textualmente:
A dificuldade, no caso da enologia, é que o paladar e o olfato humanos não são bons o bastante para julgar vinhos, pelo menos não no nível que os 'sommeliers', com seu vocabulário rebuscado e esnobe, fazem crer que é possível. Aí o cérebro, para não ficar mal, apela para rótulos, preços, críticas, etc.
   Observemos a concepção do cidadão: todo sommelier tem vocabulário rebuscado e esnobe. Notam? A mesma estória do começo...  o sujeito nada sabe, mas quer palpitar. É isso, devemos estar diante de um jornalista sério e profissional, que procurou conhecer sommeliers, que deve conhecer um pouco sobre vinho, que 'checou' os fatos e 'ouviu o contraditório' (como manda o bom jornalismo - onde isso existe, claro...)

   A pergunta que não quer calar: o que garante que "wall-streeters", em seus ternos de 5.000 dóla (será que existe terno nesse preço? Não conferi...) conhecem algo de vinho? Ô, meu! Você anda num conversível de 500.000, veste um terno de 5.000, um par de sapatos de 2.500, vai a um restaurante cuja comida pode custar... quanto? 500? E pede um vinho de '10'? Na frente do seu chapa igualmente "wall-streeter", que de maneira alguma vai perder a oportunidade de te chamar de mão de vaca e rir na sua cara porque vc sugeriu um vinho de '10'? É isso? O Helinho e o tal do Marcos Nogueira (de onde o primeiro cita ter lido a estória) precisam se dar as mãos e 'estudar'... estudar o óbvio do comportamento humano, antes de querer falar do que o cérebro faz ou deixa de fazer.
   É inaceitável afirmar que "wall-streeters" entendam de vinho porque eles bebem vinhos caros. É assim ó: eles bebem vinhos caros porque eles... bebem vinhos caros! Assim como compram carros caros, ternos caros, sapatos caros e comem em restaurantes caros - ou um restaurante que tem um vinho de alto padrão é um lugar 'barato'? Ah, tá... Portanto, o segundo erro grosseiro é aventar que um ricaço bebedor de vinhos caros tenha o mesmo conhecimento de um sommelier.
   Não menos importante, é sugerir que alguém não afeito às sutilezas dos mais diversos vinhos vá reconhecer que está diante de um grande exemplar. O casal está lá mais interessado em outra coisa, uma conversa legal, o vinho de repente não faz parte do rol de interesses deles, então você poderá servir o melhor vinho do universo, e o fato vai passar em branco.

   Mas voltando: é preciso deixar bem claro esse ponto: o sujeito pega o grupo dos ricaços e usa-o, transplanta-o, para outro grupo, que é o dos sommeliers! E quer ser levado a sério?! O pobre articulista continua:
Estudos de psicologia do gosto, iniciados nos anos 60 por Rose Marie Pangborn, só não acabaram de vez com a reputação da indústria enológica porque não são muito divulgados. Pangborn mostrou que bastava adicionar um pouco de corante a vinhos brancos para deixar os especialistas completamente perdidos.
Na sequência, outros trabalhos revelaram que, em copos escuros, estudantes de enologia não conseguem mais distinguir vinhos brancos de tintos e que basta trocar os rótulos das garrafas para que especialistas rasguem elogios a vinhos "objetivamente" medíocres.
   Novamente, é não é assim. A pobre Rose tomou por grupo de estudo um conjunto de especialistas de verdade ou um grupo de auto-denominados especialistas? Porque sim, o mercado está cheio dos últimos. Associação Disso, Associação Daquilo, Sociedade Daquele Outro... E daí a enologia pagar o pato, aventando-se que seja uma fraude, é apenas o terceiro erro grosseiro do Helinho. Eu não sou capaz de analisar vinhos tão bem, mas dou testemunho do que presenciei na avaliação do Flavitxo Vinhobão. Está aqui, e transcrevo a parte que interessa:
Digno de nota, a certa altura puxei o Flávio de lado e perguntei o que ele achava dos vinhos. Dos dois primeiros (Xisto Ilimitado e Quinta do Crasto Reserva Vinhas Velhas), comentou que o primeiro parecia-se muito com o... Xisto Ilimitado(!), que ele experimentara há alguns meses e achara muito 'justo'. O segundo, identificou como duriense (!), e disse que estava muito bom. Melhor do que o primeiro. O terceiro, achou que poderia ser espanhol (errou). O quarto (Roquette e Cazes), cravou duriense também(!). O quinto era o vinho dele. (grifo meu)
...
Outro fato digno de nota: logo que abri (para os bebedores) o primeiro vinho, o Flávio, com um sorriso maroto - ele chutara para o grupo que aquele poderia ser um Xisto Ilimitado - levanta o dedo e avisa:
   - Então vou reformar minha opinião que dei ao Carlão em reservado. O terceiro é o Xisto Cru.
   E era mesmo...
   Assim, é preciso diferenciar o que são pseudo-sommeliers, auto-entitulados sommeliers e gente competente - e que nem é sommelier. Não está satisfeito? Tem mais uma, que certifico e dou fé. Escrevi em 2014! O diálogo e fatos foram assim:
 - Trouxe esta venda, para que você não possa saber qual a idade do vinho - anunciou Carlitos.
   - Não por isso. É para já! - Flavitxo sentou em uma cadeira e deixou-se vendar. Carlitos tirou a rolha, colocou dois dedos na taça e serviu-a, colocando a base da taça nas mãos de Flavitxo, que levou-a ao nariz e arrepiou-se nos cabelos. Cheirou. Cheirou novamente e proclamou: - Borgonha branco. - daí cafungou, mesmo, e mandou: - Borgonha branco de alto quilate.
   "Canalha" - pensou Carlitos. Malditos importadores dos infernos. Sempre dizem que, em uma degustação às cegas, mesmo especialistas não conseguem diferenciar um branco de um tinto. A única esperança de Carlitos era não entrar no campo de guerra para batalhar no terreno do general adversário. E para evitar o lodaçal, escolhera justamente um branco, o que tornaria a comparação com um tinto mais difícil. Mas o começo não tinha sido exatamente bom...
   - RG da garrafa! - pediu Carlitos, antes que alguém pudesse desabonar sua escolha. Todos riram, Flavitxo retirou a venda e deu uma bebericada:
   - Muito jovem. Estaria bom dentro de mais uns 4 ou 5 anos. Mas está bastante bom dentro da minha taça, também. Parabéns, meu jovem.
   Don Akira serviu sua peça.
   - Fechado, bastante fechado. Terroso - disse Carlitos. Flavitxo concordou, destacando ainda o álcool aparente. E disparou:
   - Italiano. - (era um Biondi Santi!)

As reações worldwide

   Afinal aqui é o brazio, e o que nossos grandes e importantes jornais escrevem, repercute mundo afora (worldwide). O mundo reclamou da coluna. Por exemplo, a Associação Brasileira de Enologia (quem?!) escreveu uma Nota de Repúdio. Segundo eles, 
Tratar de conhecimento e cultura de povos usando como base um fato curioso de engano de serviço do vinho e reunindo poucas pessoas como justificativa para desprestigiar uma ciência é inacreditável em uma publicação com o porte da Folha de São Paulo e sua história de construção social brasileira. Esta simplificação da realidade tão pouco condiz com as mínimas práticas jornalísticas desenvolvidas ao longo dos anos e defendidas, mesmo pela Folha, em seus muitos Manuais de Redação, que serviram de referência para o jornalismo brasileiro. A coluna também trata com o mais alto desdém, por consequência, as milhares de famílias e profissionais que diariamente atuam com afinco e amor em todo o setor vitivinícola do Brasil e do Mundo. Assim, a coluna ainda causa enorme desserviço às comunidades que da cultura do vinho e da sua ciência sobrevivem. (grifo meu)
   Assim, a base do argumento do pessoal é um sentimentalismo que beira o tolo. Vinho é um negócio. Exige afinco, sim. Amor, só se for possível. Mas não é minimamente necessário para seu desenvolvimento. Notamos que as reações também são bem típicas de quem não parece saber direito seu papel nesse universo. Exigir retratação? Alguém parece não ter algo melhor a fazer. 
   - O Helinho! - dirão em uníssono. 
   É, ele também... Mas no dia em que nos preocuparmos de fazer vinho em vez do que vem engarrafado nas garrafas que ostentam esse rótulo, não teremos tempo para ficarmos como umas franchonas enfurecidas porque pisaram em nossa sombra.

Sunday, October 25, 2020

Chateau Teyssier: agora um Grand Cru

Introito

   Já bebi um Teyssier. Não era o de entrada, estava um teco acima. Agora, em fase de aquecimento de motores, outro degrau foi galgado. Experimentar diversos vinhos de produtores franceses por aqui não é muito fácil. Muitas importadoras não trazem a linha toda. Às vezes, uma importadora traz parte da linha (a superior) e outra fica com a rabeira. Não é um demérito; vinhos em diferentes faixas de preços atendem a diferentes consumidores. E também atendem àqueles que querem simplesmente variar, sabendo o que esperar de uma linha e de outra.

Legislação: uma chatice

   A primeira palestra sobre vinhos que assisti foi proferida pelo Manoel Beato, há muito, muito tempo. Mais de 15 anos. Quem me alertou para o evento, trazido para S. Carlos no contexto de eventos culturais, foi o Romeu. Lá, Beato já avisava: Conhecer vinhos é estudar legislação e mapas. Essas coisas são uma chatice. O único problema é que trata-se de uma chatice necessária. Assim como mapas. Quem já leu Armas, Germes e Aço do Jared Diamond sabe do que falo. Quem não leu, leia. Depois vai se interessar por mapas também! Mas ei!😝 isso é muito diferente do Sheldon com suas bandeiras!
   Sobre legislação, e falando de Bordaux, França, a primeira é a de Médoc (1855), que elencou os bordozões dos quais só ouvimos falar, e que nunca chegarão às nossas taças. Bem, Never say never (again) é título de filme de James Bond, e somos livres para sonhar. Além da classificação de 1855, apareceu, em 1955, a de Saint-Émilion (veja vínculo dentro desta página). Assim, é preciso tomar cuidado ao ver vinhos rotulados como Grand Cru, Premier Grand Cru, Grand Cru Classé e quetais: tratam-se de vinhos de padrão (e preço) bem diferentes. O leitor iniciante não deve temer esses nomes, e precisa saber de apenas uma coisa: se qualquer um desses for vertido em sua taça, não reclame se a quantidade estiver miguelada: será sempre um bom vinho. Erga os olhos aos céus, recite com reverência o (bom) nome de Baco e agradeça a oportunidade.

Chateau Teyssier Grand Cru 2011

   A safra de 2011 não foi das melhores em Bordeaux. Segundo a tabela de safras da Wine Spectator, não foi das piores. Por exemplo, é bem melhor que as safras 2006, 2007 e 2008, que infestam nosso mercado, nas mãos de algumas importadoras tubaronas (sic), que parecem ter uma predileção mórbida em trazer safras ruins para pagar USD 2,00 a menos na garrafa e virem oferecendo-as a 3x, 4x, 5x vezes o preço desses vinhos lá fora. Xô, bacurau. 
Em sua versão Grand Cru Chateau Teyssier costuma ser um corte 85% Merlot, 15%  Cabernet Franc, com passagem por carvalho. O carvalho nos vinhos franceses, pelo pouco que conheço, costuma ser muito diferente daquele que outrora foi utilizado nos vinhos chilenos. É muito mais comedido e integrado, enquanto nos chilenos estava presente em tal dimensão que rotineiramente levava os iniciantes (eu, inclusive) a confundir madeira com potência. Poucas coisas poderiam ser mais tolas. Votar no Bolsonário? (sic). No Dória? (sic). No Boulos? Falemos de vinho. Chateau Teyssier Grand Cru está pronto para ser degustado. Casa muito bem com um bifim ao molho gorgo. Depois de duas horas - abriu bem! - , exibe bom nariz com fruta vermelha e couro sutil - preste atenção. Boa boca: não é pegado, não chama comida, mas casa muito bem com ela. Digo: pode ser degustado, consumido sem comida, mas pelo menos um salame fará boa figura. Com um bifim, só melhora. O leitor já desconfiou: sim, corpo médio. Ainda, taninos macios, acidez presente, que é mais do que suficiente para destroçar sul-americanos na faixa de preço. Tem boa persistência, bom retrogosto. Atualmente está em 'promo' na Lovino por R$ 220,00. É um preço excelente para esse tipo de vinho, pos lá fora aproxima-se dos USD 25,00. Finalizando: preço (dispendioso, para meu bolso), qualidade, características... se tivesse um pouco mais de corpo, seria felicidade engarrafada. Bateu na trave.

Monday, October 19, 2020

Como andará o meu Saldo?

Introito

   O número de detratores do blog vem aumentando. Para mim, é motivo de regozijo! Significa que estas mal traçadas linhas estão incomodando. Outro dia veio (sic) um coitado dizer que...
Se VSa. tivesse uma loja de vinhos e/ou importadora, certamente já estaria falido, pois não sabe como é esse mundo e todos os gastos envolvidos, que não se resumem apenas ao valor pago por cada garrafa e taxas de importação...
   A postagem é esta (vide os comentários). Então é assim: o caboclo não me conhece, não sabe o que faço - e se eu for economista? Administrador de empresas? - mas vem dizendo que se eu tivesse uma loja de vinhos, ela já teria falido. Não apesenta um único argumento. Um escasso dado. Uma simples conta, para explicar sua posição. Basta ler a discussão, réplicas e tréplicas. Não há qualquer argumento por parte de quem tenta criticar este travesti de blogueiro, apenas palavreado sem sentido. Mais recentemente outro detrator aventou que meus vinhos não estariam bem acondicionados. Tem gente muito ruim por aí. Um monte de inocentes, também... pobrezinhos... 😂. Parece que meu saldo anda positivo, pelo menos quanto às argumentações e conservação das garrafas na adega... Mas não é a esse saldo que me refiro...

Orin Swift

   Conheci a Orin Swift em minha primeira viagem ao coração do Império (NY), em '08. Por sugestão do lojista (Se quer um vinho de 25,00-30,00, leve este por 36,00). Valeu cada centavo. Já falei que os lojistas dos EUA são sérios. De Londres, também. Já da Sulamérica... Voltando.. o vinho era o The Prisoner. Gostei tanto que comprei outra garrafa para trazer de volta. Fez tanto sucesso que um amigo trouxe outra, quando foi para lá, e acabei bebendo desse vinho três vezes. A Orin Swift frequentou as listas de 'top 100' algumas vezes. Tais listas - e notas - são uma faca de dois legumes (sic). Concentram a atenção sobre alguns poucos vinhos, até fazendo seus preços subirem, mas.. alguém já bebeu um vinho ruim dessas listas? O argumento de que, se escolhermos um da lista, poderemos mostrar diversas opções tão boas quanto é perfeitamente válida. Novamente, repito: você já bebeu um vinho ruim dessas listas? Eles podem não ser do seu agrado. Mas não são ruins. Divaguei...
   A Orin Swift estreou no mercado em 1995, pela mão e graça de David Swift Phinney. Teve em Prisoner seu carro chefe. A estória está aqui. Este foi outro exemplo de vinícola que acabou sendo adquirida por um grupo maior, neste caso pela E&J Gallo. O leque de produtos da Orin Swift não era muito extenso, mas seus vinhos foram considerados peculiares. Depois de algum tempo, achei que estava em bom momento para queimar minha última garrafa desse produtor. Não, não era outro exemplar de Prisoner..

Saldo 2010

Saldo é baseado na Zinfandel. Uva-irmã da detestada (ou amada) Primitivo italiana, esta sim mãe de algumas 'coisas' verdadeiramente estranhas, tem na Zinfandel uma verdadeira irmã gêmea univitelina (rs) que, em terras ianques, produz uma bebida bem diferente. É um corte 82% Zinfandel, 10% Petite Sirah, 6% Syrah, 2% Grenache (variando a casa safra). Os 15.9% de álcool(!) indicam uvas de excelente qualidade. Apesar de todo esse álcool, ainda manteve travo um pouco doce da Primitivo. Mas, ao contrário desta, não é aquele doce que cansa no final da primeira taça. Bebi em dois dias, e as principais impressões são do segundo dia. Nariz com fruta vermelha deliciosa, chocolate-café-couro, diria que dois desses três. Baunilha, mas sem escorrer pelas bordas da taça. Boca com taninos vivos, especiaria, algo picante. Boa acidez, persistente, bom final. Fica na boca, mesmo. Enche-a, e enche-a bonito. É o que se espera por um vinho nessa faixa de preço. Fez bom par com um bifim ao molho gorgo. Não foi perfeito, mas foi bom. Experimentei poucos Zinfandeis na vida. Um ou outro soou enjoativo. Saldo, não. O doce não saiu no segundo dia, mas estava igualmente bem integrado ao conjunto da obra. É um viho que representa uma escola: muita fruta direta, baunilha, álcool pegado, ms tudo bem integrado. É um bom representante da escola, enquanto muitos exemplares podem apenas representar sua média. Vai escorrer uma lágrima quando chegar o último gole. Essa garrafa foi comprada na... Alemanha, a uns 30 euros, ali por 2012, e sobreviveu na adega estes oito anos. Sinal de que a adega funciona bem: seu saldo é positivo, muito positivo. Aliás, o saldo Saldo, também... A 36,00 dóla, se não estraçalha sul-amerianos do triplo do preço, dá-lhes muito trabalho. Tenho dito: vinho sul-americano tá caro.
Sisqueci 😱 de postar as fotos... Se prestar atenção dá para perceber da foto acima, a parte de baixo do contra-rótulo escrito em alemão... Gostou do rótulo?

Tuesday, October 13, 2020

Vinhos: repetir ou não? - 2

Introito

   Voltando ao tema, repetir (vinho, compra) ou não? Este ator pertence a um pacote do grupo das compras de oportunidade. De uma época em que o Real valia, eu voltando do Chile, parando no Fríxópi e encontrando algumas garrafas na casa dos R$ 70,00, ou algo assim. Esse tipo de compra - de oportunidade - sempre justificará a aquisição de algumas garrafas a mais daquele vinho que você gosta. Principalmente quando o custo dele aqui não é lá aquelas coisas, variando muito de loja para loja. A parte boa de ter algumas garrafas a mais é que podemos degustar ao longo do tempo... uma garrafa por ano, por exemplo. Na falta desse tipo de oportunidade, não pense duas vezes: varie. Experimente estilos, cepas e escolas novas, ou diferentes. Quem consome apenas um produtor, ou cepa, ou estilo, ou país, não é bebedor de vinho. É bebedor daquele produtor, cepa, estilo ou país, nada mais. Esse bebor exerce um jeito muito pobre de ser... (rs).

Quina da Bacalhôa 2010

Após beber o Quina da Bacalhôa 2009 há coisa de seis meses, fiquei em dúvida se a garrafa poderia estar na descendente. Notei o último exemplar escondendo-se dos meus olhos e braços no canto da prateleira, mas fingi que não a vi (rs). Neste mês dedicado a Baco, soltando um pouco a mão, quase detonando o estoque de boas garrafas, desconfiado da longevidade do vinho, não tive dó nem piedade, e mandei ver. It's too bad she won't live. But then again, who does?
   Esta garrafa estava no auge da forma. Escrevo no segundo dia. Nariz com fruta vermelha muito viva; algo na linha de couro ou defumado, bem marcado. Boca com o reconhível travo português, aquele doce discreto, a picância (sic) da Cabernet Sauvignon na ponta da língua bem presente. Os taninos arredondaram, acidez agradável, hoje casou melhor com a pizza de pepperoni do que ontem com o bifão ao molho Gorgo. Tem uma agradável combinação de final e retrogosto. Não marca, no sentido ser fenomenal, mas tem um belo conjunto. Seu preço, infelizmente, anda variando demais. Não guardei as telas. Custa lá fora entre USD 22,00 e USD 30,00, em duas lojas, PT e UK, que encontrei para esta mesma safra. A safra '16, por exemplo, ainda disponível no mercado, está uns USD 20,00. Aqui, seu preço oscila muito, mas muito. Chega a quase R$ 400,00, embora tenha visto a R$ 205,00. Para um vinho de USD 20,00, essa última quantia é bem honesta. Só não é fácil...

Sunday, October 11, 2020

Vinhos: repetir ou não?

Introito

   Usualmente não fico repetindo vinhos. O enófilo, o amante do vinho, aquele que gosta de experimentar sensações diferentes sempre que pode, e não de seguir produtores chegados a modismos, não repete vinho. Como tudo no universo vitivinícola, afirmações sobre 'normas' não são precisas. Enófilo de verdade não repete vinho...(sim, esta mesma...) Na Borgonha, as cepas brancas são Chardonnay e Aligoté... (aí lá no cantinho - Saint-Bris - alguém planta Sauvignon Blanc...). De qualquer maneira, a repetição pode encontrar justificativas diversas: 1) O gosto do consumidor - para o bem ou para o mal. Eu também, claro, sou suscetível a isso - o que faz-me hoje pensar em repetir algumas garrafas ao longo da vida, jamais a mesma semana após semana! 2) O combalido bolso do consumidor - não adianta querer variar se muitos sofrem sofrem um sobrecusto excessivamente alto nas mãos de uns poucos tubarões. Daí que, encontrando uma boa oferta, fica justo comprar várias garrafas para dispor de um bom produto a preço razoável. 3) Para quem gosta de vinho e conhece um pouco o mercado, torna-se uma missão, quase uma profissão de fé (sic! rs), ter algumas garrafas a mais de certos vinhos para mostrá-lo aos amigos e confrades em algum churrasco, degustação, aniversário, encontro, farra ou orgia. 4) A falta de discussão sobre o tema, enquanto os consumidores, ligados no automático, fecham-se para a possibilidade, escolhendo e defendendo um vinho como defendem seu clube de futebol. Caro leitor torcedor, caia na real. Seja fiel a seu time, não a seu vinho...

Faustino I Gran Reserva 2005

Conheci Faustino I Gran Reserva pela mão e graça do Doutor Marcão. Anda meio sumido, desde antes da pandemia. Ou eu quem sumiu, vai saber... Foi uma garrafa da excepcional safra 2001, degustada ali por 2010, 2011, que encantou a todos na mesa. As Bodegas Faustino localizam-se em Rioja, cultivando Tempranillo, Graciano, Mazuelo e Viura. É parte de um conglomerado, conforme pode ser visto na página do produtor. Este 2005 parece ser um corte 86% Tempranillo, 5% Mazuelo e 9% Graciano. Em nariz com fruta vermelha bem presente, algum chocolate (café?), madeira muito discreta e mais notas, refletindo como é um bom vinho. Na boca, acidez média, taninos discretos, final algo ligeiro. Nada é perfeito... Tem um ligeiro dulçor, lembrando fruta vermelha. Mais elegância do que potência. É um vinho longevo. Não sei quanto poderá mudar com os anos, ou para que direção mudará. Rolam por aí safras dos anos 70, 80, 90... Na safra 2005, é um vinho de cerca de 30 dóla nos EUA. Aqui, é importado por uma cadeia de supermercados (o site de vendas é o Lovino) e está com desconto, saindo de R$ 305,00 por R$ 240,00. Incrivelmente, paguei R$ 120,00 na mesma rede, há alguns anos, também em 'promo'. Por isso comprei algumas garrafas, em vez de uma ou duas. Esta é a segunda que bebo. Pelo preço pago, pela qualidade, é felicidade engarrafa. É um vinho que gostaria de mostrar a algumas pessoas. Tem bom preço - ainda que seja necessário aguardar as épocas de 'promo' que a loja sempre faz -, é um vinho que encanta até bebedor boca-torta de sul-americanos em geral - e na faixa de vários sul-americanos de qualidade bem inferior...

Saturday, October 10, 2020

A Biblioteca de Alexandria e o Domaine Gourt

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Introito

Melhor um ano antes do que um dia depois.
Don Flavitxo Vinhoão
   Assim Don Flavitxo Vinhobão enunciou uma de suas máximas, há muito tempo. As palavras são sábias, mas este Enochato gosta do perigo, do flerte com o imponderável, do risco... e da paciência. Preciso ponderar que às vezes exagero. E, quando o filho é único, você escolhe uma das idades, jovem, maduro ou mais envelhecido e, bebeu, é aquilo. Não há como comparar. Por outro lado, muitos vinhos podem apresentar-se incompletos na mais tenra idade. Diamantes não lapidados brilham pouco... Assim fui deixando muitas gemas para um momento melhor sob o risco. O tempo passou, e ainda vieram a pandemia, outros problemas com amigos muito caros, e eis que chega a roda viva, e carrega o destino prá lá... No final, e por merecimento (rs), decretei que outubro será um mês de descarrego. Por A ou por B, embora A + B não prova nada, saquei um vinho de pé para ver como era...

Vinho de pé (Vin de Pays)

   O Vin de Pays (VdP) é, tecnicamente, uma categoria baixa dentro da escala francesa. Está acima do simples Vinho de Mesa (Vin de Table - VdT), e abaixo do Appellation d'Origine Contrôlée ( AOC). Para quem está acostumado com Borgonhas, olhar par um vinho e constatar que não é nem AOC, soa como um desapontamento. Não é bem assim... às vezes o VdP assume a mesma proporção que o IGT na Itália: para fugir às regras e restrições impostas a uma região, o produtor assume o ônus de rotular seu vinho em uma categoria mais simples. É um risco. O que seria da História sem Júlio Cesar e seu veni, vidi, vici? Viva o risco!

Rasteau 

   Rasteau é uma AOC do sul do Rhône. O leitor mais esperto já percebeu que um potencial corte - muito famoso, aliás - para o vinho pode ser o famoso GSM (Grenache, Syrah e Mourvèdre). Claro, outras cepas também são permitidas por ali, e a Wiki nos dá uma ideia acerca delas. Rasteau parece que era um território obscuro no mapa vitivinícola francês, mal sendo citado entre os distritos que compõem a macro-região conhecida como Côtes-du-Rhône Villages AOC. Até aparecer por ali um certo Jérôme Bressy...

Jérôme Bressy e o Domaine Gourt de Mautens 

   Jérôme Bressy fundou o Domaine Gourt de Mautens em 1996. A página do produtor pode ser classificada, sem qualquer traço injustiça, como extremamente sumária. Encontra-se mais informação aqui. O Domaine produz três vinhos: um rosé, um branco e um tinco. Prontocabou! (sic). É democrático, oferece opção para todos os gostos, desde que você se contente com uma opção do tipo que escolheu. Deve ser fã do Henry Ford - com todas as ressalvas históricas, claro - e seguir uma das máximas do inventor: Any customer can have a car painted any color that he wants so long as it is black.

Domaine Gourt de Mautens tinto

Domaine Gourt de Mautens tinto foi comprado em algum lugar dos EUA há muito tempo. Repousou em minha adega por uma década, ou quase. Paguei uns 45 dóla, o que deve ter sido R$ 100,00, algum dia. Hoje um vinho desses custaria aqui 45 x 3 (margem média de algumas importadoras) x 6,00 (dóla) = R$ 800,00. 😓 Perceba o quanto empobrecemos. Era 100,00...  Ainda bem que nenhum idiota o traz - já pensou, acharmos a R$ 1.200,00?, então fiquemos com a conta inicial. Aos 13 anos nas costas, preciso dizer, para gáudio de uns, tristeza de outros, que o imponderável apareceu, na rolha... estava um tanto infiltrada. Mas não se entristeçam os amantes do vinho, ele não se perdeu. Olha, tenho um baita preconceito com esses filmecos onde o personagem anda sempre no limite, e quase morre cenas e cenas ad nauseam. Sempre acho que esse tipo de besteira só acontece nos filmes...
Tirei o lacre de Domaine Gourt de Mautens 2007 e imediatamente fiquei preocupado. Um dos lados da rolha estava escurecido. Deixei o saca-rolhas comum de lado e puxei o saca-rolhas de lâminas. A rolha saiu inteira, e evidenciou que estava infiltrada. O coração partiu... peguei o que encontrei na frente - uma xícara de café - e despejei um pouco do vinho. Cafunguei. O coração partiu de novo... Deixei ali e fui preparar a comida, enquanto pensava no que poderia abrir no lugar. Voltei alguns minutos depois e cafunguei. Ôpa... aparecera alguma fruta. Escrevo agora, bem ao final da garrafa. O vinho evoluiu. Não sei o quanto a infiltração pode tê-lo alterado. Nariz com café, fruta negra. Mais camadas, mas falta melhor degustador para decifrá-las. Boca com dulçor diferente, mineralidade marcada, fruta negra, especiado. Taninos muito presentes, final largo, persistente. Um vinho difícil de entender, diferente. Por isso, não dá para chamar de felicidade engarrafada. Esse vinho não é seu amigo... não no sentido de que o agrada com uma conversa afável, fácil, tranquila. É meu amigão pelo desafio de entendê-lo! Agora no final, percebo que o paladar também contém mais camadas do que este boca-torta pode discernir - mas ainda assim dou conta de sua complexidade. Realmente gostaria de provar uma versão um pouco mais nova dele... ou deixar uma safra antiga aerar um pouco mais. Se o leitor encontrar com uma garrafa dessas na frente, não tenha muita dúvida: saque logo (a carteira) e atire (compre) sem perguntar. Uma das maneiras que meço um vinho é refletindo sobre o quanto gostaria de tê-lo repartido. O leitor que desconfia o quanto se perdeu com o incêndio na Biblioteca de Alexandria e hoje não imaginamos da existência, pode ter uma ideia do que sinto ao ter bebido este vinho sozinho. 😢

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🐭 Rata!
Um erro grosseiro de escrita foi detectado por Don Flavitxo e revisado no texto. Meus agradecimentos.

Wednesday, October 7, 2020

Importadores são energúmenos

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Introito

   Corria o ano da Graça de Nosso Senhor de 2019. Seu governo já andava muito em baixa quando Bolsonaro Bolsinha no Bolso (explica os cheques da esposa, vai) chamou Paulo Freire de energúmeno. Sisqueceu? Refresque sua memória. Vejamos... sinônimos para energúmeno são:

imbecilignoranteidiotapatetatontoboçalineptoestúpidotapadobestaburroestultoabestado

   Parece é uma ótima auto-descrição. Sem entrar no mérito, claro. Sem fugir ao debate e entrando no mérito, é difícil para mim acreditar - não sou da área de ensino - que os conceitos defendidos por Paulo Feire estejam atuais. Ele fez seu trabalho antes do mundo saber o que era internet. E depois vieram computadores pessoais, smartphones, tablets, e sabe-se lá quais bugigangas mais modernas. O aluno de hoje está imerso em tantas tecnologias que parece difícil aquelas ideias continuarem válidas. Mas é muito mais difícil de acreditar que Bolsonaro Bolsinha no Bolso (explica os cheques da esposa, vai) tenha noção das ideias que discuto aqui quando proferiu suas palavras. Ademais, os novos tempos em hipótese alguma tiram o mérito do trabalho de Paulo Freire que tornam merecido - merecidíssimo - seu título de Patrono da Educação Brasileira. José Bonifácio foi e continua sendo o Patrono da Independência. Duque de Caxias foi e continua sendo o Patrono do Exército. Luís Gama foi e continua sendo o Patrono da Abolição da Escravidão. Gente de respeito. Os Patronos são o nosso tesouro. Ninguém fala mal de um Patrono sem atacar todos os outros. Bolsonaro Bolsinha no Bolso (explica os cheques da esposa, vai) acatou um Patrono. Danação eterna a esse ser desprezível que desfaz de maneira leviana o que temos de mais caro.

Paulo Laureano

   Paulo Laureano não é o Patrono do Vinho de Portugal. Calma lá (rs), ele é bom, mas a tradição vitivinícola portuguesa é muito antiga... Paulo Laureano começou a produzir vinhos em 1999, no Alentejo. Sua característica principal é valer-se apenas de cepas portuguesas em seus projetos. No sítio do produtor estão explicadas sua trajetória, filosofia e motivação para seguir nessa proposta.

 Paulo Laureano Selectio Tinta Grossa 2009

Tinta Grossa era uma casta à beira da extinção no final dos anos 1990. Exclusividade de Vidigueira DOC, micro-região do Alentejo, teve em Paulo Laureano seu Patrono - aí sim! - a restagá-la da obscuridade para ganhar atenção dos amantes do vinho. É uma cepa algo austera. Tem nariz com boa fruta. Negra? Vermelha? Uma mistura delas? Precisa-se de nariz melhor... Na boca, um vinho pegado. Digo que é austero porque não apresenta aquele travo um pouco doce dos vinhos portugueses. Os taninos estão bem presentes, marcantes. Álcool atômico (sic! rs!): 16%, não aparece, tão bem integrado ao conjunto da obra. Especiaria aparece no meio da língua. Acostumado à Cabernet, que marca mais na ponta, fiquei surpreso com a sensação. Esta garrafa 2009 está em ponto de ser consumida. Não guarde mais. Pode durar, mas como diz Don Flavitxo, melhor um ano antes do que um dia depois...

Não lembro quanto paguei pela garrafa. Foi há vários anos, e a compra foi por impulso. Experimentara vários outros exemplares de Paulo Laureano em uma degustação de vinhos portugueses. Tinha mesmo me encontrado com ele em pessoa. Estava na faixa de preço de outros tantos vinhos dele, algo como R$ 100,00. Seu preço hoje está muito alto - entre R$ 300,00 e R$ 500,00. Não é possível... tem preço médio de USD 30,00 em Portugal...

Fecho comentando com pesar que estes são tempos de mediocridade absoluta. Tempos de mal gosto. Tempos que nos afetam sem que percebamos. Isso explica meu desejo em decorar a adega com algo diferente. Abaixo a pôsteres, mapas, caixas de vinho de madeira, cesto de rolhas, barricas, etc. Procuro - por mal gosto, e até que encontre ou passe o desejo - uma placa de bronze em alto (ou baixo, mas prefiro alto!) relevo com a inscrição mencionada no título: Importadores são energúmenos. Claro que é mal gosto. Vinho serve para celebrar a vida, e suas alegrias. São momentos de escapismo, de felicidade. Não precisamos ficar ligados à realidade, nem à verdade. Por hoje, se encontrar a placa, juro que compro. O vinho foi bom. O dia é que nem tanto. Amanhã o Carneiro de Augsburg voltará a saltitar todo feliz entre as vinhas, banhado à luz do mais belo sol, iluminando um céu bem azulado. Brindarei a tudo isso.

Sunday, October 4, 2020

Sundawg Ridge 2009: continua um bom Pinot

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 Introito

   Outro dia (sic, duas postagens atrás) falei de um vinho que aparentemente mudou de nome. Agora um desapareceu...  Vinhos desaparecem quando são muito ruins. O leitor lembra-se de algum que tenha desaparecido? Dê um googada, de acordo com os nomes que se lembra. Se encontrar algum que desapareceu, principalmente por ruindade, me avise, por favor. 

James MacPhail

   James MacPhail é considerado um especialista em Pinot Noir em terras Além-Borgonhesas (sic). A certa altura da vida, estava no comando da produção da linha Sequana, baseada em Russian River. O endereço www.sequanavineyards.com não exibe mais a página, e no Twitter a página da empresa foi inaugurada em abril de 2011, tendo a última postagem em agosto de 2012. Vida curta...

   Sequana foi comprada pelo produtor Hess, que descontinuou a marca. Os vinhedos hoje provavelmente produzem vinhos de outro rótulo. MacPhail  seguiu seu caminho. A WineSpectator noticiou o fato.

Sundawg Ridge 2009

   Sundawg Ridge Pinot Noir 2009 foi uma das últimas safras produzidas por MacPhail (a venda concretizou-se en 2011). Comprei ali por 2011, 2012, e a linha Sequana foi lançada por aqui um pouco depois. O noticiário local reportou degustação em 2013. Em 2012, com dóla a cerca de R$ 2,20, paguei USD 45, cerca de 100 real (sic). O vinho chegou aqui em 2013 a mórbidos R$ 360,55. Poderiam ter deixado por R$ 360,00, não concordam?



   Por umas e outras, já comprovei a longevidade de bons vinhos norte-americanos. Experimentei uma garrafa logo depois de ter comprado. Flavitxo Vinhobão deu testemunho da qualidade de Sundawg em outubro de 2013. Vale ler a postagem, é bem completa, fala da origem do nome, do vinhedo, e de como Sundawg não fez feio quando colocado na mesa junto de um Mazis-Chambertin 1997 de um de meus produtores preferidos (pela faixa de preço, 'fora', claro!), Dominique Laurent. Voltando a Sundawg... passados 7 anos, tive a graça de nova experiência. Arredondou. A fruta vermelha está bem viva. Tem mais coisa misturada lá (rs). Talvez o alcaçuz referida pelo Flávio em 2013... parece que desponta um café também, bem discreto. O álcool, 13,9%, não aparece. A madeira está contida. Se valer o preço que paguei, volto a falar de felicidade engarrafada. Por 50 dóla (preço atual), para um vinho ianque, é boa compra. Combinou bem com um bifão (novamente, filé ao molho gorgo. Será o cardápio do final de semana; estou aprendendo a cozinhar... rs. Desta vez o molho gorgo ficou melhor, o gorgo apareceu mais: mais gorgo, menos creme de leite...). Tem boa presença na boca. Bebido só, parece leve. Mas casou bem com o bifão, para mim, prova de boa estrutura. Seria a boa acidez realizando seu trabalho sutil mas tão necessário? O final é bem marcado, retrogosto muito bom. Outubro promete...

Saturday, October 3, 2020

Principal mesmo é o Principal...

Introito

   Principal por principal, nunca nos esqueçamos: e no princípio era o verbo (Ezequiel 25:17). Mas aí era o princípio, e não o Principal 😕...bem, essas pequenas divagações são aceitáveis num gênio da escrituração (sic) e da análise de vinhos que humildemente compartilha seus fantásticos conhecimentos com o desavisado leitor. Divertiu-se com o Ezequiel do vínculo? Era para ser João... 

Idealdrinks

   A Idealdrinks é um conglomerado espalhado por diversas DOC's no Dão, na Bairrada e em Vinhos Verdes. Idealdrinks na verdade é parte do mega-grupo (sic) Idealtower - planos dentro de planos... - cuja proposta parece ser resgatar a glória da antiga Portugal das navegações por meio do domínio vitivinícola worldwide. Acho que não vai rolar não, mas voltamos a isso mais tarde. Dentre as vinícolas do grupo, está a Quinta Colinas de São Lourenço.

Quinta Colinas de São Lourenço

  A Colinas de São Lourenço localiza-se no coração da Bairrada. Produz boa gama de vinhos tintos, brancos e rosés, além de espumantes de azeites. Também tem foco em tamanhos grandes, oferecendo, além do tamanho normal, garrafas de 1,5 L (magnum) a 18 L (Melquior). Todos os tamanhos são apresentados em belas caixas de madeira, outra faceta que ilustra a proposta de dominação do grupo, que não deixa de lado o design.

Principal

   Nos tintos, Principal é a linha mais nobre, e o Grande Reserva é o ícone. Sua chegada a S. Carlos foi um um tanto tortuosa, e deu-se por insistência e graça do representante da importadora à época. Seria Humberto seu nome? Recordo-me mesmo que, bonachão, chegou numa sexta-feira quase final de ano à Mercearia 3M e pediu para fazer uma degustação gratuita para os presentes. Com anuência do proprietário, o sr. Idinir, abriu sem miséria (rs) diversas garrafas da importadora - todos portugueses - e saiu todo feliz com diversas caixas encomendadas pelos clientes satisfeitos com a qualidade dos vinhos e seus preços. Ofertas assim não aparecem mais por aqui, infelizmente. A consequência foi óbvia: várias e várias pessoas hoje compram mais pela Internet do que dos lojistas locais. Continuo sendo um defensor do lojista local - é ele quem promove degustações para o público, não a loja lá do outro estado, ou 300 km distante. Mas esse pessoal precisa tomar vergonha na cara... Diva gay... Um pouco depois, programou-se uma degustação 'oficial' da importadora na loja, e o Grande Reserva estava em oferta. O pessoal não demorou: compararam o preço do produto 'cá' e notaram que estava quase o mesmo vaor do vinho na terra natal. Não é que as encomendas esgotaram o estoque... teve gente que ficou sem... No meu caso, não vacilei: assim que me informaram do custo, levantei o dedinho (rs) pro Idinir e pedi: - Uma garrafa pra mim, por favor...

Nesses tempos de pandemia, e após matutar a ideia por algum tempo, criei vergonha na cara. Pow, estudei teoria da relatividade, aprendi mecânica quântica, surfei altas ondas na física estatística, impávido, calculei coeficientes da equação de Tchebychev, em êxtase intelectual senti-me o próprio Roy em seu derradeiro momento... será que cozinhar um bifão um pouco melhor seria tão mais difícil? Fui lá (sic), catei uma receita e liguei o fogão... Filé ao molho Gorgo(nzola). Sem saber cozinhar, sempre tive comigo que, nessa condição (analfabético foganístico), o principal suporte para um bom prato estava, antes de tudo, na qualidade dos ingredientes. Assim, tentei caprichar - até onde o bolso permitiu - no Gorgo. Uma fritadeira elétrica recém-adquirida faria o serviço com a batata frita (da última vez que pedi uma porção de arroz e uma de batata, paguei R$ 70,00... péralá...). Já já pago o investimento na fritadeira. Pizzaiolos, cuidem-se! 😂 Tá certo, como primeira experiência, o molho não saiu lá essas coisas. Sobrou creme de leite - o que equivale a dizer que faltou Gorgo 😜. Alguma hora, converge.

Principal Grande Reserva 2008

Esse é o vinho que havia comprado na 'promo', conforme comentado. Da primeira compra, ofertada na visita inicial do Humberto, ainda tenho um Principal Reserva da excelente safra de 2007. Já já chega a hora dele... (rs). Principal tem belos e enigmáticos rótulos, cheios de bandeiras. Elas são explicadas sítio do produtor. Tem que prestar atenção na navegação para encontrar... Curiosamente, nem nenhum lugar do sítio encontrei a composição. Segundo o Wine-Searcher, é um corte de Touriga Nacional, Cabernet Sauvignon e Merlot... produção bordalesa com o toque típico de Portugal... Principal Grande Reserva 2008 é um bom vinho, em plena forma. Fruta negra, couro, quiçá um chocolate discreto. Na boca, taninos presentes, boa acidez, 14% de álcool - escapa um pouco, bem pouco, só a concentração de uma prova solitária para deixar-nos atentos de notar esses detalhes... mas não compromete. Tem boa persistência, marca a boca e faz boa combinação com um bifão ao molho Gorgo. Seu preço 'lá', atualmente, gira em torno de 100 dóla. Não... 😕. O pessoal acha que vai dominar o mundo fazendo um vinho que é bom sim, se esmerando na apresentação - bom rótulo, caixa de madeira... - e cobrando os tubos? Ainda temos uns bolsões de bolsoranistas aqui e ali, mas ninguém paga de otário para sempre... até esses vão se iluminar alguma hora. Chega um momento em que até o pobre-diabo cai na real. Vixe, por 100 dóla dá pra fazer uma lista de Barolos, Brunellos, Xatenêfis... dá pra por até Borgonha (o que dizer de Bordeaux) que deixarão Principal Grande Reserva como o pobre  Coite atrás do Papa-Léguas... Menas pessoal, menas... é um bom vinho sim, mas o preço está exorbitado (sic). 'Lá'. Aqui, parece estar sem representante. Por esse preço, lamento, não faz falta...

Thursday, October 1, 2020

Portugal 2011

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 Introito:  Quinta do Zambujeiro, Maria José e José Maria

   Já viu troca de nomes? Eu já. Era José, mudou para Maria José. Era Maria, mudou para José Maria... nada mais comum. Mas troca de nome de vinho, não tinha visto... parece que simplesmente aconteceu - ou alguém me explique a confusão, por favor - que um belo dia o produtor, a Quinta do Zambujeiro, passou a chamar seu Monte do Castanheiro como Monte do Zambujeiro.

Quinta do Zambujeiro 

É uma vinícola alentejana, da região de Borba, fundada em 1998. Em safras recentes, Monte de Jambuzeiro é um corte de Aragonez, Alicante Bouschet, Tinta Caiada, Touriga Nacional e Trincadeira. O sítio do produtor não dá muitas explicações sobre os produtos ou safras, embora tenha algumas fichas técnicas. Não comenta a mudança de nomes. Não se encontra qualquer menção a Monte do Castanheiro lá... 😕

Monte do Castanheiro 2011

Falando de Monte do Jambuzeiro, seu preço médio na Europa é 18 dóla (12 Euros). Falando de Monte do Castanheiro 2011, tem fruta bem presente, boca marcada por taninos bem vivos apesar da idade. O doce discreto dos portugueses também está lá. O final é um pouco ligeiro, mas ainda melhor que os sul americanos em geral. Vinte dóla dá uns 15 mil Pesos chilenos. Dá para comprar um Tarapacá Etiqueta Negra, por exemplo - foi um dos meus grandes vinhos, um dia. Tarapacá talvez ganhe no buquê, mas perde na boca. De longe. Isso faz toda a diferença quando o leitor chama um bifão para acompanhar a bebida. Não sei a quantas anda o preço no Brazil, mas paguei por Monte do Castanheiro menos do que o valor de um Etiqueta Negra. Está certo que a safra 2011 foi muito boa lá em Portugal, mas bom... alguém tem que ser beneficiado nessa estória. Nesse caso, o consumidor brasileiro, que recebeu um vinho nessa categoria por um preço mais em conta do que outros exemplares mais caros e não tão bons. Comprei o exemplar único um pouco por impulso: boa safra, garrafa parada na loja há algum tempo sem remarcação... achei que valeria a pena arriscar. Valeu 😋.