Tuesday, August 28, 2012

Domingão diferente, um Pinot e um Carmenère

- Então, você quer que eu leve um daqui?

   Assim o Flávio do Vinhobão respondeu ao meu chamado para um encontro light na noite de domingo.
   - Então tá, traga um. - disparei, sabendo que do outro lado o interlocutor levava uma mão à testa, murmurando mentalmente algum palavrão. Era pra ser algo descompromissado, mas eu estava insatisfeito, vinhisticamente falando. Procurei algo entre as garrafas até bater os olhos nele, e pensei comigo: "Este!". Estava preparado o combate. O Flávio chegou com um Yealands Way Pinot Noir 2010 (Nova Zelândia), enquanto saquei um Carmenère Reserva da Von Siebenthal 2007 (Chile), filho único que, para meu gosto, estava guardado há tempo demais (não sei se Carmenères envelhecem bem...). O primeiro parece ser uma mistura de uvas da mesma variedade de dois vinhedos diferentes, Marlborough e Otago Central, 13% de álcool. Já o segundo, produzido no Vale de Aconcagua, 13,9% de álcool, é na verdade um corte de Carmenère e Cabernet Sauvignon. Conforme verifiquei no sítio do produtor, e de acordo com a legislação chilena, como o corte é de 85%-15% ou 90%/10% conforme a safra, permite-se que o produto seja anunciado simplesmente como Carmenère.

   O Yealands Way: não estou acostumado a Pinots, e ainda não consegui construir um rascunho mental da cara dessa uva. Mas o vinho em si estava elegante, redondo. Leve, como parece ser todo Pinot que se preze (parece que os franceses não são assim, mas acho que é lenda - rs), conforme a própria cor denunciava. Não deve-se confundir a leveza com falta de elegância, que ele tinha. Um vinho alegre, com frutos vermelhos e com bom final, nada amargo.
   O Carmenère Reserva: cor mais escura, da abertura até além da segunda hora não mostrou a pimenta típica da cepa, mas ela finalmente começou a aparecer. Não com o desequilíbrio que faz do Carmenère um vinho meio bandido, segundo alguns, mas uma pimenta elegante, integrada ao conjunto. Também com bom final, mas é claro com mais potência no boca, agradou.
   Passando das 23:00, o Flávio pediu arrego a despeito das garrafas estarem pela metade. Combinamos o segundo tempo na segunda-feira, e fiquei de chamar mais alguém para ajudar. Como o Flávio roeu a corda, o "mais alguém", na verdade A mais alguém ficou encarregada de ajudar-me na tarefa de exterminar os vinhos invasores. E a mais alguém não era outra senão a amiga e fiel seguidora Raquel, conhecida amante dos bons Carmenères. Assim, por causa desta parte, o post do Flavitxo ficará pela metade, literalmente...

Degutação no segundo dia

   O Yealands Way, verdadeiramente perfumado, evidenciou suas qualidades, aparecendo frutos vermelhos com mais intensidade. Ficou mais redondo e agradável.
   O Carmenère Reserva, com sua cor intensa (isso não mudou... - rs), saiu com a pimenta a toda, mas com o passar do tempo na taça ela foi decaindo aos poucos, e passou a evidenciar mais chocolate (cafe? - rs!). Foi uma surpresa, porque normalmente a pimenta acompanha essa uva até o final.
   A conclusão é que preciso ficar mais atento à qualidade do vinho no dia seguinte - quando sobra, é verdade. Mas acho que guardar um pouco para depois pode nos proporcionar experiências tão divertidas quanto a "primeira etapa". A conferir, eventualmente...

Monday, August 27, 2012

Purpura Valahica, da Davino - Um vinho romeno

Davino... Divino?

   A Raquel brindou-nos com um vinho supra-diferente: um sujeitinho vindo de para lá dos Cárpatos - esse nome vem do grego e significa "montanhas rochosas". Os Cárpatos são mais conhecidos por um ilustre morador de suas encostas, o Conde Drácula. E ao seu sopé está uma das regiões vinícolas mais importantes da Romênia, Dealu Mare, distrito de Muntenia, e que o leitor pode querer traduzir (corretamente) para Mar Dealu, embora geograficamente ela não tenha nada de marítima... um mistério a ser explicado. Com o intuito de situar definitivamente meu raro seguidor, aviso que a região fica ao norte de Bucareste (ei, mas isso lembra nome de filme...).
   Voltando das vampirescas divagações, o vinho apreciado foi o Purpura Valahica 2009, 100% Feteasca Neagra, uma variedade local cultivada por todo o país. É produzido pela Davino e apenas em safras especiais (mas parece que desde 2004 até hoje apenas a safra de 2005 não foi considerada especial, a julgar pelo histórico de produção deste vinho...). Bom, aconteceu que em 2009, com chuvas abaixo da média e temperaturas acima desta, a maturação acabou sendo beneficiada e assim mais um Purpura Valahica veio à luz, após envelhecimento de sete meses em carvalho romeno (!) e outros 12 meses na garrafa.
Purpura Valahica 2009, 100% Feteasca Neagra, 14°.

   Segundo o produtor, a maturidade do vinho alcançaria a plenitude em 2019. Consumido entre 2014 e 2019 seria um vinho mais maduro, enquanto a degustação prematura revelaria mais fruta - o que de fato tinha. Seu corpo era médio, quase leve para quem está acostumado a um padrão sul-americano mais rústico. Foi servido sem decantação e com mais ou menos meia hora para respirar, o que revelou um vinho relativamente básico no sentido qualitativo. Portanto, como sugeriu o título na abertura, nada de Divino neste Davino. Mas se não impressionou, também não marcou negativamente. Por uns vinte euros, existem milhares de escolhas melhores por toda a Europa, só que... por vinte euros também é uma boa pedida para quem deseja variar um pouco a tipicidade, conhecer algo diferente e que dificilmente é encontrado por estas paragens. Eu já bebi muito de um vinho só (uma dezena de caixas ou mais, ao longo dos anos). Se puder sugerir algo aos menos iniciados, é que evitem isso. Vivas à diversidade. Vivas ao vinho romeno. Vivas ao Purpura Valahica.

Wednesday, August 15, 2012

Herdade dos Grous e o Villa Francioni Rosé

Uma noite fria...

   Foi em uma noite fria quando recebemos a visita dos amigos Romeu e Sônia, por motivo de uma visita à Dona Maria Tequila, recém operada. Debaixo do braço, o Romeu trazia também uma garrafa do Villa Francioni, enquanto eu havia deixado uma surpresa bem preparada.
   O conviva já mencionara havia tempos sua aquisição do Villa Francioni Rosé, aquele que a Madona havia apreciado e levado algumas garrafas para casa em sua recente visita ao país. Eu sei que a Madona é uma excelente representante do pop, assim como Pelé foi "o' representante do esporte mundial... e também sei que, como comentarista esportivo, ele pertenceu à geração mais vitoriosa do nosso futebol.
   Bem, o Villa Francioni Rosé 2010 é uma mistura de Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc, Sangiovese, Syrah, Petit Verdot, Pinot Noir, Merlot e Malbec, provenientes de vinhedos localizados em São Joaquim e Bom Retiro, com 13,4% de álcool (no sítio do produtor consta 13,6%...). Sua coloração salmão, apresentada em uma garrafa muito bonita, provoca um efeito visual também muito bonito. Os vinhedos de São Joaquim - ainda segundo o sítio - estão localizados no paralelo 28 em altitude superior 1.200 metros. Seu preço de venda está entre R$ 45,00 e R$ 50,00. Se você é daqueles que curte artesanato e adora fazer um vasinho com uma garrafa vistosa, este é, definitivamente, o seu vinho: a garrafa - disseram-me que de cristal, e francesa -, é tão diferente que não pôde ser utilizada no maquinário padrão de processamento, obrigando o produtor a fazer o envase manualmente. Com tudo isso - garrara de cristal e importada e envase manual - o produto chega ao consumidor por R$ 50,00. Vejamos... Cuba é conhecida... pelo Fidel, e não por muito mais coisas, o que dizer então do projeto gráfico dos livros impressos na ilha (eles não possuem capa, no sentido de se usar um papel melhor para envolver o miolo - colorido, então... nem a coleção dos discursos do capo). Mas os livros cumprem seu papel. O que estou tentando dizer é que, sem tanta frescura (e respectivo aumento de custo) o preço final do vinho poderia ser bastante inferior e encaixá-lo melhor na tão famosa quanto importante relação custo-benefício. Villa Francioni Rosé tem um buquê floral, alegre, boca agradável, mas ambos sem sutis complexidades (lembrando a deficiência nasal declarada deste que escreve). É um vinho de piscina - sem qualquer demérito à piscina -, feito para degustação rápida (abriu, bebeu), refrescante, ótimo para beber com uma turma heterogênea (quando só você conhece um pouco de vinho, e os demais bebem por beber). Pela metade do preço, seria uma opção para o dia-a-dia, principalmente para aqueles que gostam de variar. Seguramente, rosés não fazem parte da minha dieta, o que pode ser mais um motivo para que eu não tenha entendido bem o vinho. Apesar de tudo, vale a pena conhecer, principalmente se você é bebedor apenas de tintos e de repente está se sentindo meio fora do contexto (o que quer que isso signifique...). Pelo preço normal não compraria mais de uma garrafa, até porque rosés não envelhecem bem.
Villa Francioni Rosé 2010, 13,X% de álcool.

   Já o Herdade dos Grous é outra estória. Principalmente esta penúltima garrafa da safra 2005. Mas vamos pelo começo. A Herdade dos Grous é uma vinícola alentejana que, a exemplo de outros produtores locais, tem experimentado cepas internacionais, principalmente Syrah e Cabernet Sauvignon. No presente caso, a composição é Aragonês (Tempranillo), Alicante Bouschet, Touriga Nacional e Syrah. Há que se dizer que este Herdade é o "colheita", mais simples, e não o reserva. Passa 9 meses em barrica de carvalho francês, bom buquê, com chocolate (ou café, minha eterna confusão!) e frutas (vermelhas? não tenho certeza, mas é frutado); na boca, taninos elegantes que, se anteriormente eram redondos, o  tempo cuidou de aveludar. Acredito que esteja no ápice, indicador de que a última garrafa entrou na linha de tiro. Um tanto de madeira, mas não incomoda, pelo contrário: "dá personalidade", na opinião do Romeu. Com preço variando entre R$ 75,00 e R$ 90,00, acompanha a média do preço nacional para o produto europeu (lá, entre 7 e 10 euros), que é o valor original vezes 10, mas em reais. Fazendo a conta que o euro esteja a R$ 2,50, o "custo cá" é 4x o "custo lá". Dado que o preço que o importador paga ainda é menor que o preço de prateleira do produto "lá", o preço final aqui deve ficar pelo menos 5x o custo do produto. Ou seja, apenas muito caro. Como estamos habituados a tal exploração (quem leu a recente matéria sobre o "ridículo" preço dos carros por aqui?), apenas reclamamos (e o importador pouco se lixa). Tirando estas lamúrias, a relação custo-benefício é boa. Claro que existem muitas opções "tão-boas-quanto" e diversas opções melhores. O que não há dúvida é que vale a pena experimentar.
Herdade dos Grous colheita 2005, 14% de álcool bem integrados.