Monday, August 30, 2021

Cozinheiro de dois pratos só

Introito

   Para espanto de quase ninguém e delírio de menos pessoas ainda, este Enochato deixou de ser cozinheiro de apenas um prato, e passou a dominar o preparo de dois. Lombo com (poucas) ervas é o novo prato sob domínio deste cheff que desponta nas lides da cozinha. Contando com o prato (filé ao molho gorgo) aprendido no ano passado, e fazendo uma previsão algo otimista para os anos vindouros, imagino que até 2098 dominarei uma gama razoavelmente apresentável de alternativas. Gastón Acurio que se cuide... Depois disso passarei à harmonização. Mas, claro, será outra etapa. Um problema de cada vez, diria o gerente cansado. Temos tradição nisso; começou com Fernando Idiota Cardoso (que uns queriam fuzilado), quando presidiu o brasio. Em vez de fazer seu sucessor, entregou o governo para... you know who... 💀

Porco e vinho branco

   Fui conferir uma harmonização com lombo. Wine searcher listou diversas possibilidades, mas Chardonnay e Pinot já bebera recentemente. Procurando um pouco mais, além da Pinot Gris da Alsácia, apareceu Riesling da mesma região. Aqui vai uma dica: se você nada conhece, como eu, perceba que harmonização pode ser uma via de mão dupla na hora da pesquisa. Quem fala da comida sugerindo o vinho, sugere-o de maneira genérica, pensando em algo de seu conhecimento prévio. Não significa que todos os vinhos desse tipo casarão com a comida. Então você confere se o vinho casa mesmo com o prato recomendado... eu não fiz isso... 😦

Zind-Humbrecht Riesling Turckheim 2018

 
Escolhi um Zind-Humbrecht Riesling Turckheim 2018, já degustado em janeiro deste ano. Aquela estória, um vinho legal a cada seis meses; com um estoque de vários vinhos legais todo mês você bebe pelo menos um bom, sem ficar repetindo. Continua muito bom: notas cítricas - maçã verde? - no nariz, boca com muito frescor, limão(?), mineralidade presente e uma pontinha doce que não notei na primeira prova. Aquele buquê a óleo Singer se expressa a temperatura um pouco mais alta; bem frio (não gelado!), essa assinatura fica escondida. Pois é, Wine Searcher sugere para esse vinho peixes mais oleosos, como salmão. O lombo pode não ter harmonizado, lembrando que esse conceito prediz um todo maior que a soma das partes. Não, não aconteceu assim. Mas não comprometeu, o que já é grande coisa para este Enochato que no mais das vezes costuma meter os pés pelas mãos, quando não estraga tudo de uma vez (😰). Talvez possa mudar um pouco o preparo do lombo da próxima vez. Fico me perguntando o que o pessoal da Casa de Carnes Qualidade daqui de S. Carlos pode propor como alternativa. Na sugestão de cozimento eles acertaram em cheio: uma hora por quilo de peça, e mais um pouco fora do papel alumínio para dourar. Eu chego lá...

Sunday, August 29, 2021

Les Héritiers du Comte Lafon 2011... again...

Introito

   A minha máxima de ter algumas garrafas repetidas de um bom vinho, em versão revisitada. O Domaine des Comtes Lafon é considerado por muitos como o maior produtor (em qualidade!) de brancos da Borgonha. Pensando em termos de brasio, onde as importadoras tubaronas de sempre dominam o mercado, não é de espantar que esse produtor esteja na carteira de alguma delas. Então a estória se repete: compram um tanto, pedem preços absurdos, vendem alguma coisa e, ao final da vida útil do vinho, colocam-no em 'promo'. O preço 'promo', claro, está exatamente na margem das importadoras que praticam margens mais honestas cobram em seus preços regulares. E ainda tem energúmeno que defende as tubaronas! bolsonésios e PTlhos pelo menos estão se vendendo por um ideal de país, ainda que cretinamente distorcido; estes estão aí somente pelo vil metal mesmo. Voltando: sempre será um momento de alegria e reflexão de como a vida é bela levarmos à boca a taça de um Comtes Lafon, por mais simples. Quem conhece, sabe. Comprei três garrafas deste Les Héritiers 2011, há pouco tempo (dois anos?), e esta é a segunda que provo. A primeira foi em maio de ano passado, e está aqui, junto de um breve comentário sobre a classificação dos vinhos da Borgonha. Meu sentimento, atualmente, é se compraria um vinho simples, já envelhecido, a preço de vinho 'novo' no mercado, de um produtor sob domínio de importadora tubarona. A conclusão, mais uma vez, é que não. Melhor trazer um Premier Cru de fora em alguma viagem, ou explorando alguma amizade, e contentar-se com um exemplar de vinho bom do que milhagar (sic) seus vinhos mais simples um tanto envelhecidos. Agora... se você pegar um vinho de boa importadora em boa safra, vá fundo: compre uma caixa (ainda que de meia dúzia), e vá bebendo uma garrafa por ano, ou a cada seis meses. Quando fechar o circuito, tendo várias caixas de vários produtores legais - ainda que de importadoras diferentes, qual o problema? - aí você beberá bons vinhos frequentemente sem ser esfolado vivo. 

Les Héritiers du Comte Lafon 2011

É necessário comentar que nossa percepção de um vinho muda quando o degustamos sozinhos e escrevemos à medida que o provamos, de quando o fazemos acompanhados e depois tentamos recuperar a memória de como ele estava na noite anterior, ou há mais tempo. Anotação mental (risos!): as pessoas acham fora de órbita quem saca a caneta e o caderninho e começa a escrever ensimesmado em um barzinho, restaurante, convescote ou reunião. Não faça isso, sob pena de parecer diferente. Nossa sociedade não suporta pessoas diferentes; a mediocridade não suporta concorrência e os medíocres-mores querem todos enquadrados em sua faixa de estupidez. Se eu fosse você ficava na média, mas... é com você. Inclua-me fora dessa (sic! rs!). O fato é que Les Héritiers du Comte Lafon 2011 apresenta nariz bem cítrico e outros toques indistinguíveis para mim (😕). Em boca (Gostou? Aproveite, não costumo gastar tanto a língua),  parece maçã verde (principalmente), e limão. Combinou razoavelmente bem com salmão. Tem um final amanteigado, com boa persistência, aquela que faz jus a um grande produtor: ele sabe tirar leite de pedra, já que este é um vinho relativamente simples em sua lavra. O problema é que, na mesma época, poderia ter comprado (na verdade, comprei!) em 'promo' exemplares Premier Cru de Chablis feitos por produtor muito bom, e estou convencido de que a compra foi melhor. Então é assim: promo por promo, um grande produtor da Borgonha contra um ótimo produtor de Chablis (que é Borgonha, mas não é lá do 'miolo'... o leitor entendeu...), então um Villages contra um Premier Cru, lamento, mas não dá pro Villages - e olha que é do Comte Lafon! O que dizer se for de produtor menor! Leitor, caia fora. Já escrevi uma vez aqui no blog:

Paciência é sentar-se à beira do rio e esperar o corpo de seu inimigo passar boiando!

   Ele passará. Ou antes disso, tomará jeito. Isso significa, por exemplo, cortar amostras grátis para um monte de passapanistas que ficam elogiando as tubaronas em troca de uma garrafa aqui e ali. Canalhas, queimem no inferno! Eu espero mesmo que as tubaronas tomem jeito. Isso depende principalmente de nós, consumidores. Basta exercer a tão cara cidadania.

Friday, August 27, 2021

Ripostando as vestais

Introito

As vestais do templo Noivas de Baco, Dayane e Renata, fizeram uma provocação geral ao postarem no grupo de uatizápi (sic!) o comentário sobre a harmonização de comida japonesa e o português Pé Branco da Herdade do Esporão, um Semillon cuja harmonização de fato é indicada para cozinha oriental (dentre outras). Disseram que funcionou muito bem. Morri de inveja! Principalmente porque é um vinho de 50tinha. Esse tipo de harmonização é muito difícil - dizem. Consegui - para meu gosto - boa harmonização entre culinária japonesa e brancos doces do Loire, notadamente o Clos Naudin, Vouvray de um dos melhores produtores da região. Outros grandes Vouvays são feitos pelo Domaine Huet. Infelizmente seus preços (Naudin e Huet) andam proibitivos nos brasio (R$ 600,00+). Comprei algumas garrafas do Clos Naudin há muito tempo, em 'promo', pagando cerca de R$ 170,00. Mas note: há muito tempo... e em 'promo'! (😱) Gostaria de mencionar ainda que Gaston Huet foi proprietário do Clos Naudin durante a Segunda Guerra e citei um trecho sobre ele quando prisioneiro em um campo de concentração nazista. Numa 'festa' promovida no campo, ele reflete sobre um vinho que estava experimentando em um copinho de mostarda(!), e reconheceu como sendo de sua terra natal. O trecho está aqui; considero uma das passagens dos mais poéticas que já li em toda minha vida - vinhonísticamente (sic!!!) falando, claro. 
   Para quem duvida, 
ahh... nada como manter documentação. Depois colocamos os detratores para chupar (😝) e eles dizem que somos vis... Ah, detratores idiotas... como é fácil trucidá-los...

Falcoaria Vinhas Velhas 2016

Experimentei uma garrafa Falcoaria VV '16 há coisa (sic) de quatro meses. Lembra aquela estória, se conseguir comprar um tanto de vinho bom, pode repetir de vez em quando, tipo... uma ou duas garrafas por ano? E quando tiver várias garrafas de vários vinhos bons, poder beber uma ou duas garrafas por mês salpicando aqui e ali, durante o ano todo? Pois é...
Luiz Ghidelli falô, Luiz Ghidelli avisô (enquanto os Paralamas devem estar arrependidos até o fundo da alma), o branco é bem melhor que o tinto, e não tinha me atentado. Não me lembro como aconteceu, mas... de repente descubro 4 garrafas de Falcoaria VV na minha adega! Bem, três agora... Na primeira vez, tentei harmonizar Falcoaria VV com xarxixa (sic) e queijo brie. Não deu certo, Falcoaria levou ambos no peito. Desta vez, tentei com um salmão na manteiga. Necas de pitibiriba; novamente Falcoaria matou no peito e desceu a bola no gramado. Infelizmente esgotado no Savegnago, esse vinho é do meu gosto: tem potência. Tá, foram apenas quatro meses, nem dá para para falar em envelhecer para um vinho dessa categoria, mas a acidez está lá, vivona. Num descuido, quando a temperatura da taça subiu um pouco, apareceu buquê a mel.  Mesmo nessa temperatura um pouco alta, a persistência é muito boa, e o final é longo e agradável, redondo. De resto, as notas cítricas e tudo mais, está lá, como destacado na postagem passada. Em sua faixa de preço (R$ 115,00 no Verdemar, atualmente), é uma excelente compra. Uma pena que não entreguem no Sudeste. Se tiverem um pouco mais de iniciativa, comeriam o mercado pela borda.

Monday, August 23, 2021

Um vinhozinho com as vestais

Introito

   O último Pinot que levei para acompanhar o coelho causou forte comoção algures. Seguramente mais pela combinação do que pela prosa morrinha aqui no blog. Mas quando disse que a garrafa de outro dos vinhos que comprei estava na mesa para quem desejasse degustar, houve um alvoroço maior ainda. Mais porque algumas pessoas não teriam janela para este final de semana do que pelo vinho em si (e oportunidade de se beber algo em confraria não se perde) do que pela possível qualidade da garrafa ofertada. Ao fim e ao cabo, somente três Vestais apresentaram-se para a difícil missão: Dayane, Renata e Luciana. O Prelado não reclamou... 🤭. Dayane e Renata apareceram com uma pizza e um pão chique da Ma Petite Boulangerie, e alguns frios. Luciana veio armada com outra garrafa. Simplesmente um luxo...

Os vinhos

Conforme prometido, apresentei o Coquelicot Pinot Noir 2019, do produtor languedoquês (sic! rs!) Bruno Andreu. O nome Coquelicot vem da planta que desabrocha na primavera em terras da vinícola. Monet pintou seu Les Coquelicots em 1873. Sem passagem em madeira, 100% Pinot Noir, mostrou boa fruta (vermelha?) no nariz. Boca leve, corpo médio, acidez baixa a média, taninos bem macios. Final e permanência discretos, não impressionam. Como veremos mais para frente, estatística de um dado só não é estatística, mas prefiro um La Clape (só bebi um até hoje), por exibirem mais potência, com tanino e acidez mais pronunciados. Veja aqui. É um vinho legal para acompanhar pratos leves, de maneira que, sem harmonizar tanto com a pizza, até fez algum acompanhamento. Tem apenas 12,5% de álcool. A Luciana chegou com um Château Lamothe 2019, da região Côtes de Bourg. Sem muita certeza, achei que fosse um Bordeaux - e estava correto. Ela deve ter comprado na Deliza. Voilà: é importado pela Lovino, de quem a loja de S. Carlos representa vários produtos. É um corte 60% Merlot, 30% Cabernet-Sauvignon e 10% Malbec, também com boa fruta no nariz mas álcool escapando um pouco na boca - dá uma ligeira queimada mesmo. Parece que seus 14% de álcool afetam o equilíbrio com o restante a ponto de comprometer a apresentação geral. A acidez vai de baixa a média - mais para média, mas não impressiona - os taninos pegam um pouco e o final e permanência são mais destacados do que Coquelicot, mas ainda sem impressionar. 

Os preços

   Coquelicot é um vinho de 14 dóla 'lá', mas encontrei em apenas uma loja. Pode estar um tanto caro. Como disse, não podemos tomar apenas uma loja e asseverar que seu custo seja um preço médio. Sendo o que temos,  USD 14,00 * R$ 5,50 = R$ 77,00. Dá um 'preço cá' de 2x sem promo, e a R$ 79,00 na 'promo' vira uma pechincha. Aí gostei... Se tivesse pago o preço cheio, acho que teria ficado um tanto triste. Talvez porque Villa Blanche, ao casar muito bem com o fettuccine, tenha causado melhor impressão... nesse ponto acho que as coisas se confundem um pouco. Mas ainda me pergunto o seguinte: se você está pagando R$ 150,00 por um Languedoc, será que não compensa colocar mais R$ 50,00 e avançar em borgonhas brancos, mesmo que um tanto simples (para a Borgonha, claro), mas com frescor muito mais presente e conjunto mais elegante? Bem, R$ 50tão representam 33%... há gosto para tudo. Mas o meu fica no borgoinha.




Sunday, August 22, 2021

O coelho do Gustavo

Introito

Onde  sobra ignorância falta medo.
O Enochato sem Galochas

O medo é, em alguma instância, nossa auto-proteção. Temos medo de chegar muito próximos á borda de um precipício. De um animal desconhecido. Até mesmo de nos acercarmos de outro ser humano em condições pouco adequadas - na saída de um restaurante ou bar à noite. Reporta-nos o jornal O Tempo sobre uma partida de futebol onde o público aglomerou-se sem qualquer preocupação ou observância das medidas sanitárias. Por que nós, animais tão medrosos por natureza - somos de longe o mais fraco de todos na natureza, comparando-nos com outros de similar tamanho e/ou massa - ignoramos os riscos de um contágio que pode ser mortífero e nos arriscamos de maneira tão gratuita? Para mim, apenas a ignorância pode subverter essa regra tão óbvia, tão instintiva. A racionalização trouxe-nos uma faca de dois gumes, onde a reflexão sem o devido conhecimento pode levar-nos ao esquecimento ou desprezo dos cuidados mais simples. Alguns fazem roleta-russa com armas automáticas...

A ignorância é um mal que precisa ser extirpado, muito mais do que o demônio - literal ou figurado. A ciência tem que deixar de ser uma vela no escuro, por mais que a perspectiva de ao menos alguma iluminação nas trevas seja reconfortante. Um 'pastor' (sic) vende, a R$ 1.000,00, certo feijão que cura a Covid, mostra-nos o portal G1. Entregamo-nos a uma falsa compaixão quando pensamos nos ignorantes que caem nessa estória. 
   
Existe vagando pelo mundo um número incomensurável de pessoas com boa formação entregues à completa falta de senso crítico. Autênticos zumbis intelectuais, caminham vacilantes para uma escuridão que se avizinha como ovelhas ao abatedouro. Vimos isso no início deste ano, em um lugar onde 65% da população tem diploma universitário. No brasio e média é de uns 23%. Boa parte destes não percebem que bolsonésio e lulalelé são as duas faces da mesma moeda; a moeda amaldiçoada que deveríamos ter atirado ao longe há muito tempo, mas que por um tipo de mágica parece ter colado em nossa mão onde continua a produzir chagas pelo mero contato. Mas o grande embuste é que ela esteja mesmo aderida a nós, quando na verdade não está! Nós é quem pensamos assim quando dizemos que entre lulalelé e bolsonésio votamos neste ou naquele. Adiantamos um segundo turno que não acontecerá, para, de maneira canhestra em nossa estupidez, irmos desde já justificando o voto em nosso político idiota de estimação. Várias pessoas que você conhece estão assim, de um lado ou de outro? Certo. O que você fará sobre isso? Deixará passar em brancas nuvens, no momento em que a pátria mais precisa de você? Lembre-se destas palavras sábias, em apenas uma lição...

   O leitor pode querer lembrar-me que este é um blog sobre vinhos. Novamente: estamos em um momento histórico e social onde deixar de discutir nossos problemas, que são imensos, será visto pela posteridade como o mais autêntico escapismo ou, pior, como absoluta irresponsabilidade de uma classe que se pretende intelectualmente de elite mas não vai além de inconsequente. Incluam-me fora dessa (sic) por favor. 

Vinho e Turismo

Com alguma abertura para encontros, o grupo Vinho e Turismo (V&T) promovido pela Vinho e Ponto e pela empresa Caminhos do Turismo voltou a reunir-se. Em número reduzido e com espaçamento entre os participantes, o encontro versou sobre vinhos do sul da França. Os vinhos provados já foram comentados e um está aqui. Depois do evento fomos Riana e eu ao Bistrô Graxaim onde o Gustavo havia preparado um fettucine com ragu de coelho. Ricardo, Noiva de Baco de primeira hora, impedido de beber, não participou do primeiro encontro mas apresentou-se lépido e faceiro para a ceia. 
A Riana levou o La Vaca Piloto Garnacha 2019, um espanhol da DOP Cariñena, localizada na região de Aragão, fronteiriça com a França. No sítio do importador (Wine), vemos que é produzido pela Cia Vitivinícola Covinca, em cujo sítio curiosamente não encontramos menção a esse vinho. Uma explicação para isso é que o importador pode ter pedido a criação de um rótulo exclusivo. Nessa hipótese, é muito trabalho para pouco vinho. Não é ruim; para um encontro descompromissado cai muito bem: tem fruta imediata - Riana e e concordamos que framboesa -, corpo médio sem madeira, acidez de baixa a média, um travinho doce não enjoativo com permanência e final algo rápidos. A acidez deu-lhe uma boa pegada com o fettuccine, e embalou a conversa entre os bebuns. Como o vinho está esgotado na importadora e não encontrei referências a ele lá fora, fica impossível falar de preço. A Wine não está entre as importadoras mais careiras, mas também não figura entre as de melhor custo-benefício. Apreciei feliz a oportunidade, mas não compraria. O inexistente leitor pode dar-se ao luxo da experiência se encontrá-lo. Experimentar é necessário, viver é que não é preciso (risos!).

Este Enochato compareceu com um vinho de importador que há muito namorava sem ter comprado algo, a Chez France. Aconteceu que recebi uma 'promo' com 50% de desconto sobre vinhos que normalmente já possuem ótima relação custo benefício, e desta vez mandei ver sem pensar ou mesmo consultar os preços lá fora. Até porque estavam numa faixa bem razoável para vinhos franceses. Villa Blanche Pinot Noir 2019, produzido pela Calmel & Joseph do Languedoc-Roussillon - justamente tema da viagem da V&T da noite! - e traz na mala a promessa de harmonizar com carnes brancas. Nariz com ótima fruta, algo terroso, mostrou boca com bom equilíbrio, acidez média, álcool contido, final e permanência um pouco ligeiros. Na 'promo' saiu por R$ 69,00, o que tornou-o imbatível na noite. Casou muito bem com o coelho que não tive trabalho em caçar no meio do fettuccine, e harmonizou também com o prato como um todo, massa e carne, misturados ao vinho na boca. Para algo descompromissado, os vinhos e a comida foram realmente uma ótima experiência.

Sunday, August 15, 2021

Quinta da Archeira: um vinho meio seco

Introito

Vossa excelência desperta em mim os instintos mais primitivos.
bob jeff para zé dirceu 

   Venho comentando aqui, para incômodo do leitor regular, que vivemos tempos difíceis. Quem se expressa em qualquer campo do conhecimento não pode - não tem o direito! - deixar de se manifestar sobre os problemas que nos assolam, sob pena de passar por energúmeno. Já bastam os importadores e a detratoria (sic!). Parece que foi há tempo tempo... mas passaram-se apenas dois meses quando discursei causticamente sobre as tralhas que nos governaram nos últimos 20 anos. O Japão foi completamente destruído em 1945. Em 1964 organizava uma Olimpíada! Aqui, os que pretendiam governar para os pobres assumiram seus mandatos e entregaram-nos com um número escandalosamente alto de brasileiros passando fome. Qualquer explicação já seria motivo mais do que suficiente para chamar à nossa presença a mãe de cada um desses calhordas. O que dizer, depois de mais de um ano de pandemia, economia parada, todos os meios de comunicação falando sobre as dificuldades dos brasileiros, e nem uma palavra pelos desfavorecidos por parte dessa súcia?! Você pensa em votar em algum deles? Então você é mais um estúpido dentre os muitos que andam por aí! 
   bob jeff, preso, saiu com um discurso ameaçador: A vida vai nos colocar frente a frente para que pessoalmente nós possamos resolver esse problema. Eu espero que sim, que se vejam frente a frente. No tribunal que o condenará ao limbo da história.

Quinta da Archeira tinto 2018

Outro dia experimentei uma harmonização com tinto meio seco. Conforme confessado então, fiquei surpreso com o bom resultado da prova. Vai que - a arrogância é uma m... 😮 uma... uma... uma meleca! - resolvi tentar por conta própria. Com minha nova especialidade: burgue. Considerei que a mostarda poderia competir de maneira indesejada com o doce do vinho, então tentei um burgue com apenas maionese e outro com requeijão no lugar da maio. Antes da harmonização, Quinta da Archeira mostrou fruta vermelha e mais tarde apareceu café (chocolate?). O doce não aparece na tanto boca, além daquele travo adocicado típico. Abro parênteses: sigo não tão de perto as normas de produção de tintos (mais) e brancos (menos) nos diferentes países. A de meio secos, definitivamente não. Pondero que as leis europeias para esse tipo de vinho (que seguramente definem os limites de açúcar) devam ser mais rígidas do que as brasileiras. Será? 😂 Ademais, muitas vezes o vinho suave por aqui é fruto de chaptalização (adição manual de açúcar, dado que as uvas não atingem boa maturação), enquanto muitos vinhos europeus nesse estilo são produzidos a partir de uvas mais maduras. Quinta da Archeira tem 13,5% de álcool... Não deu a menor dor de cabeça durante seu consumo, e olha que estiquei até quase 1 da manhã. Fecha parênteses. Sua acidez média parece que ajuda na camuflagem, uma surpresa. Até tem razoável permanência, com final ligeiro. Fico me perguntando se o nosso vinho suave é apenas tão mais ruim que o seco, que já é uma m... m... meleca!, e nos passa a sensação de que todo vinho suave tem a obrigação (rs) de ser muito além de ruim... Detalhe curioso: não encontrei o vinho nem no sítio do produtor! 😲 O Wine-Searcher também nada mostrou, e as referências a ele são escassas. Bem, a harmonização não se mostrou muito acertada. Ficou bem melhor com o burgue acompanhado de requeijão, mas passou algo longe de outros experimentos verdadeiramente harmonizados como os proporcionados por Enoeventos. O vinho está à venda na rede Savegnago por R$ 79,00. Não foi uma brincadeira ruim, mas dou por encerrados meus testes com ele. E não repetirei. Não há motivo. Além disso, os supermercados estão recheados de tintinhos nojentos entre R$ 70,00 e R$ 120,00 que me despertam mais a curiosidade.

Monday, August 9, 2021

Reunião da Noivas de Baco

Introito

   Com o relaxamento das regras sanitárias para encontros, a confraria Noivas de Baco começa a se reunir um pouco mais. Semana passada aconteceu, com a perspectiva de degustações a cada quinze dias, alternando a quinzena com os eventos Vinho e Turismo, que também são mensais. Desta vez tivemos seis comparecimentos: duas noivas, três vestais e este prelado que vos narra. O pessoal veio animado. O encontro foi divertido, como veremos.

Vinhos

A recepção correu por conta do já famoso (rs) Bacio Della Luna 2019, espumante italiano que o pessoal tem apreciado. Esgotado na Enoeventos, onde encontram-se outras opções mais sofisticadas (Proseccos), é um espumante básico que funciona; no vínculo acima o leitor vai encontrar sua descrição. Tímido, escolheu não sair na foto... o Gustavo - lembro bem - compareceu com o Beauty in Chaos 2017, comprado junto à Grand Cru de S. Carlos. É um corte Cabernet Sauvignon-Merlot de Washington, região que produz vinhos de muita elegância. Este é um pouco mais comum, pega na baunilha com força, mas também tem boa fruta. Boca com certo dulçor - ambos, dulçor e baunilha baixaram bem quando voltamos a ele, na segunda rodada. Acidez média, taninos um pouco pronunciados mas conjunto bom. Tem uma relação de preço cá/lá de USD 26/12, o que dá pouco mais de 2x. Com esse dóla alto, quem não reajustou muito os vinhos está apresentando preços melhores. Não fosse a desvalorização de 40% de nossa moeda, daria uns 3.5x... é só fazer as contas... 

Acho que foi a Riana quem apareceu com um Faustino Crianza 2017, de Rioja. Já bebi várias garrafas do Faustino I Gran Reserva, que é muito bom. Postei umas poucas. O Crianza, não conhecia. Não lembro-me muito bem dos detalhes, mas recordo-me de que estava redondo, bem harmonizado. Acidez e corpo médios, creio que agradou a todos. A Luciana trouxe o Rioja Bordón 2008, das Bodegas Franco-Espanholas. Estava um pouco oxidado, mas para mim, ótimo. Perdeu um pouco da fruta e os taninos estavam bem suaves, e a acidez era boa. Na boca ainda ficou algo terroso, o que chamou atenção. O final estava discreto. Pelas características, não é um vinho 'fácil', mas a experiência foi atraente. O Gustavo também gostou. A Dirlene chegou com o IGT Primitivo Primo Puglia 2019, da Torrevento. Embalado pelas conversas, não prestei tanta atenção. Lembro que estava com fruta bem evidente, mas um pouco fechado e algo doce. Não tanto quanto outros vários Primitivos, mas o doce estava presente. Finalmente, e com o burgue (sic) divinamente preparado pelo Gustavo, apresentei outra garrafa do Cedro do Noval 2015. Havia bebido um bem recentemente, e achei que seria legal apresentá-lo para a turma. Eles pareceram ter gostado, e na minha opinião casou muito bem com o hambúrguer - há experimentara anteriormente, que não sou bobo nem nada. Este repetiu a garrafa anterior. Leia a postagem sobre ele; acho que valerá a pena. Com o preço atual de R$ 120,00, é uma boa compra. A foto foi tirada pela Riana. Divertidos com os vinhos, ninguém lembrou-se de registrar o encontro. O representante do Ricardo ficou na geladeira, assim como o Jerez da Luciana; os demais secaram. Sinal evidente de que tudo esteve muito bom... 😋

Vinho de supermercado

Introito

   Comentei tempos atrás que as redes supermercadistas estão 'indo atrás' e importando por conta própria. Nosso mercado pode estar algo loteado, com os grandes produtores representados pelos tubarões de sempre, mas ainda existem mais rótulos do que os mal-intencionados podem abarcar. O leitor seguramente não encontrará um primeiro vinhedo de Bordeaux nessas redes - mas convenhamos, supermercados também não são lugar para tal. Nem Gran Crus da Borgonha, ou muitos outros similares. Mas pode sim encontrar Premier Crus borgonheses, ou Cru Bourgeois e até Cru Bourgeois Exceptionnels. Duvidou? Vide aí...

   É desse mesmo grupo, o Verdemar, que andam jogados aqui em S. Carlos, nos corredores do Savegnago, Chiantis, portugas, Crozes-Hermitages, Brunellinhos, Plugias e outros. Acabei com vários 😑. Não por levado tudo, mas sim por pegar as últimas garrafas... Alguma tranqueira também tem, porque os supermercados de S. Carlos não limitam-se a comprar de apenas um grupo importador. Tem que ficar atento. No mais, viva a diversidade, e eventualmente vamos experimentando um aqui, outro ali.

Chianti Classico Coli

Já tinha notado a garrafa no Savegnago desde o final do ano passado. Do meu lado, estoques reguladores baixando, garrafas remanescentes correndo para baixo da mesa sempre que abro a porta da adega, na maior aflição... o leitor imagina como é... Bem, resolvi arriscar acreditando na competência do importador: comprei o Chianti Classico Coli 2016 planejando degustá-lo no jantar, com meu já famosíssimo filé ao molho gorgo. Abri enquanto começava a preparar as batatas, e desanimei com o primeiro contato. Nariz um pouco fraco, boca até pior. 'Melhor deixar', pensei comigo, enquanto voltava a atenção para alguma notícia da internet e as batatas entravam no air fryer. Primeiro round das batatas, carne na frigideira, daí para o forno, preparo do molho gorgo... normalmente são vinte minutos. PF - eu não falei polícia federal! 😖 - sentei e fui ao segundo ataque. Tinha melhorado um pouco, mas não muito; na refeição, não foi tão agradável. Nagib chamou do Chile, reforçando o convite para passar as festas por lá, e conversamos por boa meia hora. Por volta das 22:30 voltei novamente atenção ao vinho. O milagre ocorrera: o bouquê encontrou o paladar e a harmonia estalou os dedos. Não me ocorre com muita frequência, mas tinha nota de cereja bem marcada. Algo terroso ou couro, não peguei bem. Boca equilibrada, fruta, acidez média, taninos pegando um pouco. Os 13% de álcool bem comportados, final um pouco ligeiro mas com um retrogosto mais presente; uma característica diferente. A safra '16 foi muito boa na Toscan, e o exemplar pode estar um pouco novo. Para um Chianti básico (é um Classico! - sic! rs!), está bom. Mas precisa de ar, e por uma hora e meia, pelo menos. Seu preço 'lá' está em USD 12,00. Paguei R$ 88,00 aqui. Subiu um pouco no sítio da Verdemar (R$ 96,00). Com um dóla a R$ 5,00, daria R$ 60,00. Esse vinho entrega. Veja, é um vinho básico, com bom custo-benefício para nosso mercado. Mas ainda são 88 moedas. Isso dá quase 10% de um salário mínimo, o que obviamente torna-o impensável para a grande parte dos brasileiros. Como os vinhos do mercado interno nada entregam por digamos 20 moedas, o consumo não vai deslanchar. Não na atual gestão do Senhor. Calma. Faltam somente uns 10 quatrilhões de anos até a próxima. Alguns dizem que será muito mais tarde. Tanto faz...






Sunday, August 8, 2021

Torre Oria 80 anos Vinhas Velhas

Introito

   Contam que Isaquias Queiroz, medalhista olímpico que conquistou o ouro na canoagem, começou a remar porque precisa de um meio de locomoção da sua pequena Ubaitaba até Ilhéus. Henrique Flory, escritor que não teve o devido reconhecimento até hoje, contou-me certa vez a estória de quando ficou hospedado na casa de um pescador em alguma praia do Nordeste, trabalhando como ajudante de pescaria em troca da moradia. Saiam de madrugada para pescar. Às vezes os filhos do titular dormiam um pouco, e depois precisavam alcançar a jangada, que ia longe em alto mar. E vaziam-no sem muita dificuldade, para a completa surpresa do Henrique. Ele se pensava quantos e quantos nadadores de ponta não estariam perdidos nas praias brasileiras, sem a devida oportunidade. Festejo a medalha do Isaquias sem me esquecer dessa estória, e a do próprio Flory. Tanto talento, sempre desperdiçado. Darlan Romani também; parece apenas outro exemplo de atleta que quase no limite da subsistência ainda consegue amealhar um quarto lugar no arremesso de peso, contra todas as probabilidades. Estes e outros tantos nos representam.

Torre Oria

Já bebi alguns vinhos desse produtor Valenciano da DOP Utiel-Requena. O que mais gostei foi o Torre Oria Gran Reserva, safra 2011. Desta vez experimentei o Torre Oria 80 anos Vinhas Velhas 2015, um corte de Bobal e Monastrell. A Bobal aliás é nativa da região, sendo portanto sua principal cepa. Antes considerada pouco adequada para vinhos de qualidade, vem ganhando espaço e reconhecimento nas mãos de bons produtores. A Monstrell é nossa boa e velha Mourvèdre com outro nome em solo espanhol. Já havia experimentado de Vinhas Velhas em alguma degustação anterior da Vinho e Ponto, que propagandeia tê-lo como rótulo exclusivo. Nem tanto, como veremos. A experiência havia sido boa, pelo que me recordava. Recém-aberto, exibiu de imediato fruta com um fundo de açúcar. Boca com açúcar se repetindo, corpo médio, taninos discretos, permanência e final curtos com acidez baixa. Não é a melhor tradição espanhola, parece-me. É um vinho que pode entusiasmar ao primeiro gole - ou de outra maneira, fazer alguma presença servido comedidamente em degustação -, com o bebedor imerso em uma boa confraternização, mas não sobrevive a um olhar mais técnico. O problema é que... falta-lhe. Falta-lhe alguma personalidade e mais corpo para acompanhar um bifão, por exemplo. 

É um vinho de 10 dóla. Está no limite do que um vinho preci$a para começar a ficar bom, mas não alcança o padrão. Aposta na apresentação de uma garrafa grande, mas a rolha de aglomerado adianta que o vinho pode não ser o que se espera. Veja ao lado a rolha dele e do Cedro do Noval, um vinho dos seus 18 dóla. Poderão dizer que Noval custa 80% a mais, o que é verdade. Mas esses 80% representam 8 moedas, e Cedro entrega. Já perguntei se Vinho e Ponto tem um sommelier? Pois é. Às vezes parece que compram a partir de catálogos coletados em feiras internacionais, quando ficam bebendo vinhos nos melhores estandes dos produtores já fechados com a concorrência e deixam de rodar a feira. 
   Seu preço:

   Acho mais complicado a franquia fazer propaganda de que seus vinhos são exclusivos. Bem, nesse padrão, nem precisariam. E não são mesmo. E não é que somente esse vinho não é exclusivo. Já comentei do Peyrabon? Pois então, também não é...




   O vinho custa R$ 166,00 na V&P, o que dá 3x se comparado com o valor fora, de USD 10. No concorrente, dá um pouco mais de 2x. Existem muitas opções melhores entre R$ 140,00 e R$ 170,00. Precisaria espremer bem esse preço para situá-lo na faixa de 'boa compra'.

Saturday, August 7, 2021

A pesquisa nacional e a poda de inverno nos vinhedos III

Introito

   Começamos comentando uma matéria jornalística que ovacionava a produção de vinho mineira após a conquista de medalhas em degustação internacional e explicava o motivo para seu sucesso: a poda de inverno. A consulta ao preço de alguns dos vinhos mencionados motivou estas postagens, onde algumas reflexões intermediárias foram necessárias para podermos contextualizar não apenas o preço/valor do vinho como recobrar um pouco da estória dos produtores nacionais. Vamos à conclusão.

Diversas falácias

   Precisamos desmascarar diversas falácias que nos confundem. Se o leitor não tem os dados ele pode deixar-se enganar, porque sua postura é a de 'boa fé'. Veremos o quanto se mente ou, no mínimo, se distorcem dados. 

Rico/pobre. Mas é rico ou é pobre?

   Notamos que nossa indústria vitivinícola se regozija de seus feitos quando lhe é conveniente, para chorar com o chapéu nas mãos em outros momentos. Vide a postagem passada, a respeito das 'salvaguardas' que a indústria pediu ao governo quando crescia a taxa três vezes maior do que o PIB geral. Como o leitor sente-se quando informado dessas variações de humor (sic) dos nossos valorosos produtores?

A escala

   Querem nos fazer acreditar que o vinho nacional não em escala. Uma rápida pesquisa nos leva aos seguintes dados:
  • A Vinícola Aurora concluiu a colheita de 2021 colhendo 90 milhões de quilos de uvas.
  • A Vinícola Guaspari pulou da produção de... 30 (trinta) garrafas(!) em 2008 para 50 hectares, segundo o sítio do produtor, consultado nesta semana.
  • A Vinícola Miolo declara possuir uma área de 100 hectares próprios apenas na região do Vale dos Vinhedos.
  • A Casa Valduga orgulha-se se possuir a maior cave de espumantes da América Latina, com capacidade para abrigar mais de seis milhões de garrafas.
  • A Vinícola Marchese Di Ivrea declara em seu vídeo institucional produzir 50.000 garrafas por ano.
     
   

   


Os detratores dirão que trato dos grandes produtores e esqueço-me que os pequenos, que são boutiques de vinho com produção minúscula. Respondo:
  • A Guaspari citada acima é uma das vinícolas premiadas. Tem escala.
  • Produtores como Espaço Essenza, Vinhos Maria Maria ou Vinícola Campestre, apenas para ficar nestas, não declaram suas produções ou áreas plantadas, tornando-so impossível qualquer comparação. Mas vamos apostar que essa produção é 'alguma'. Umas 1.000 garrafas? Guarde esse dado.
   Certo. A Europa toda (principais produtores, França, Itália, Espanha e Portugal) está repleta de produtores pequenos com terrenos de até meio hectare. Vejamos o caso de um produtor espanhol. A Bodegas Pujanza produz seu ícone, o Cisma, em um vinhedo de... 0,8 hectare. Toda a produção é realizada em um único barril de 1.700 litros. Entre magnuns e garrafas comuns, dá umas 1.000...Veja aí abaixo a condição das vinhas que ocupam os 0,8 hectare... cada vinha dá um ou dois cachos... será que as vinhas dos nossos produtores são centenárias, de baixa produtividade? Qual nada! Leia lá (rs), muitas começaram nos últimos 10 ou 12 anos!

   Os detratores poderão continuar dizendo que Pujanza produz outros vinhos, e alguns chegam à casa de dezenas de milhares de garrafas por safra. Sim. Mas como dito, a Europa possue milhares de produtores que sobrevivem cultivando até meio hectare. Escolhi o exemplo de Pujanza porque de fato ela produz ampla gama de vinho e então falaremos de preços.

Finalmente, os preços

   Pujanza produz uma gama relativamente variada de vinhos:
   Hado é avaliado em 12 moedas
   Finca Valdepoleo vale 20 moedas
   Pujanza Norte fica entre 46 e 53 moedas
   Pujanza Cisma (ícone da vinícola) vale lá suas 125 moedas



   Vejamos o preço de alguns vinhos nacionais premiados pela Decanter:
   Vinícola Góes Philosophia Cabernet Franc 155 moedas
   Barbara Eliodora Syrah: 167 moedas
   Guaspari Viognier Vista do Bosque: 178 moedas
   Casa Valduga Identidade Gran Corte: 192 moedas ('promo' por 153,60 moedas)
   Vinícola Ferreira Piquant Soleil Syrah: 200 moedas
   Vinícola Ferreira Arcanum da Serra Merlot: 300 moedas

   Sejamos honestos: alguns produtores oferecem seus vinhos a preços mais palatáveis:
   Amitié Pinot Noir: 66,50 moedas
   Vinícola Campestre Zanotto Sangiovese: 70 moedas
   Mas veremos que, na verdade, não são tão palatáveis assim.

   E quando o leitor pensa que o céu é o limite, fiquemos com essas pérolas da nossa 'produção':
   Guaspari Cabernet Franc: 548 moedas
   Miolo Sesmarias: 1038,52 moedas. Se pechinchar acho que sai por 1038,00... 😆

   Comparemos com os preços de alguns vinhos verdadeiramente icônicos de nível mundial:
   Barbaresco da Cantina Produttori del Barbaresco: 46 moedas
   Chateauneuf-du-Pape Chateau de Beaucastel: 97 moedas
   Brunello di Montalcino Biondi Santi (2015, 2017), é o pai da denominação Brunello: 180 moedas
   Barolo Giuseppe Mascarello e Figlio Monprivato: 227 moedas
   Vega Sicilia Unico Gran Reserva: 460 moedas
   Chateau Lafite Rothschild: 1.272 moedas. E não, não deixam por 1.270 moedas... 😠 (😂)

   Famoso (mais por força do marketing do que pela qualidade per se) desde há muito, o Miolo Lote 43 é um vinho cujo preço varia de 280 moedas (há alguns anos; hoje deveria custar bem mais) a até 200 moedas em 'promo', e atualmente está cotado a 230 moedas. É um vinho que já bebi, assim como vários da Miolo. Veja aqui. É incrível como o preço de Lote 43 oscila de tempos em tempos, provavelmente em função dos estoques - sua tiragem é enorme. Mostrando que acompanho ainda que de longe a produção nacional, outra crítica deste articulista remonta ao Decima Gemina Gran Reserva 2005 da Piagentini, a 100 moedas (em 2012! Dóla = R$ 2,20). O que escrevi do Decima, e já comentei sobre o Lote, e que são vinhos para competir com um Gran Tarapacá. Note que refiro-me ao Gran Tarapacá e não ao Tarapacá Gran Reserva, que está um degrau acima e ainda vem muita gente (sic) depois dele na escala de vinhos desse produtor. Ora, Gran Tarapacá custa no Chile 5.000 pesos, o que dá em valores internacionais 6,34 moedas. Assim, nossos pesos-pesados nacionais, na faixa de 200-300 moedas só competem com os chilenos de 6-7 moedas. E, recobrando a primeira postagem, enquanto o Brasil tem 322 menções ou medalhas no evento da Decanter, o Chile tem... 6.733! Quem será que produz vinhos melhores? Mais um argumento: todo mundo que viaja sabe muito bem; compramos em países produtores vinhos 'razoáveis' na faixa de 6-8 moedas... o que corrobora a comparação com o valor do vinho chileno no Chile.
 

Nada fica tão ruim que não possa piorar

   Voltemos à questão da poda de inverno. Seu mérito é inverter a colheita das uvas, jogando o término da maturação para uma época de menos chuvas. OK. Acontece que a colheita é apenas um - e talvez não o mais importante - fator na produção de bons frutos. Citando o Vinhos de Todo o Mundo - Guia Ilustrado Zahar (Jorge Zahar Editor, edição brasileira de 2006),
p. 51 (sobre a França), "Mais ao sul, no Vale do Rhône e no sul da França, muitas cepas brancas tendem a ser menos ácidas devido ao clima mais quente."
p. 195, verbete sobre o Piemonte: "Os Alpes moderam o sol quente do verão, e as temperaturas mais baixas resultantes preservam a acidez e aumentam a complexidade das uvas."
   A região compreendendo Mato Grosso do Sul, São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo está aproximadamente no paralelo 20. Aquele mais ou menos famoso vinho argentino que provavelmente todos bebemosalguma vez (o Latitud 34) está, isso mesmo, no paralelo 34. O extremo sul de Portugal está no paralelo 37 (norte, claro), e às vezes neva por lá. O continente europeu começa dali para cima (sic), ou seja: as temperaturas só decrescem mais para o norte. Aí vão querer me convencer de que vinhas plantadas em regiões onde as temperaturas de verão superam facilmente os 30 °C terão alguma acidez quando comparadas àquelas cultivadas em regiões com máximas de até 25 °C? É isso mesmo? Gentem (rs! sic!), o extremo sul do Rio Grande do Sul ainda está no paralelo 33... precisa desenhar? Querem desmentir que a Vitis vinifera não se adequa ao Brasil. Ora, que bobagem! É o Brasil quem não se adequa a ela...

   Portanto, não adianta nossa indústria insistir em tocar um trabalho extremamente sério nas condições continentais do país. O resultado desse trabalho extremamente sério será absolutamente ruiníssimo. Não, eu não experimentei nenhum dos vinhos do evento da Decanter. Mas com os preços desproporcionais que nos apresentam, vou canalizar meus poucos reais para vinhos nos quais realmente acredito. Continuo indo a degustações (não durante a pandemia) e experimentando principalmente nacionais e sul-americanos. Minha opinião ainda não mudou: os chilenos estão demasiadamente caros para sua qualidade. O que dizer do preço dos brasileiros? Não terei o menor problema em reformar minha opinião quando experimentar qualquer vinho nacional e avalar que é de boa qualidade. Ainda aguardo o dia em que poderei ir para o Chile, levar um vinho nacional debaixo do braço, chamar os amigos chilenos, abrir um Tarapacá Gran Reserva (agora sim, um Gran Reserva) e dizer:
   - Este vinho brasileiro custa na minha terra o mesmo preço que um Gran Reserva aqui. - E então servi-lo com orgulho. Claro, aguardo sentado.

PS: tenho as imagens de tela de tudo o que escrevi. Pela extensão da postagem, poupei o leitor de apresentá-las todas. Se algum arrivista aparecer, posso fazer uma postagem amontoando-as sem muitos comentários. Obrigado pela paciência!

Friday, August 6, 2021

A pesquisa nacional e a poda de inverno nos vinhedos II

Introito

   Pensei muito sobre a continuação da postagem anterior e tentei abordar alguns assuntos resumidamente, mas não consegui uma apresentação adequada. Achei que será melhor cometê-la (sic) em três atos. Nestes comentários intermediários aproveitarei para marcar um rótulo (label) no blog para posterior referência, e pretendo situar o leitor em algumas controvérsias que desnudam picaretas e contam a estória de como andava o mercado nacional há uma década. Prepara-se para fortes emoções.

A estória das moedas

   Para começar a conversa, precisamos de uma reflexão para o que se seguirá no tocante a preços e valores. Falemos de dinheiro. Um dos parâmetros para refletirmos é o salário médio da população que consume vinho. Defendo que aqui a variação cambial não pode ser levada em conta. Um profissional recebeu seu salário de "x" unidades monetárias em seu país e precisa viver com aquele montante, pagando aluguel, alimentação, plano de celular, roupas, transporte, água, luz, plano de saúde e, se sobrar algum, comprando seu vinho. Tomando três países para efeito de comparação rápida, vejamos o salário de professores do ensino básico (ou educação infantil):

País

Salário

Estados Unidos

2.475,00

Portugal

1.518,63

Brasil

2.500,00


   Portanto, para mero efeito de comparação, podemos dizer que um professor nos EUA e no Brasil recebem 2.500 moedas, e em Portugal cerca de 1.500 moedas. Não importa se em um lugar são Dólares, em outro, Reais, e em outro ainda, Euros. Cada um tem suas moedas para gastar, e pronto. E não adianta querer dizer que no Brasil em alguns lugares os professores recebem 1500 moedas e que isso seria pouco em relação a quem ganha 2500 moedas. Primeiro: está igual a Portugal. Segundo: estamos falando na ordem de grandeza dos valores. A ordem de grandeza não se altera em uma escala de 10. Ou seja: é impossível um professor ganhar 15.000 moedas enquanto os outros ganhem apenas 1.500 moedas. Para qualquer efeito, um professor em Portugal ou EUA efetivamente não ganha 5.000 moedas, o que colocaria seu salário como o dobro de moedas do professor brasileiro. Terceiro, e não menos importante, se professores aqui ganham apenas R$ 1.500 moedas, os argumentos ficarão mais dramáticos! Abaixo, os valores pesquisados.



O mercado de vinhos, há 10 anos

It started - for me, it started - last Thursday, in response to an urgent message...
Invasores de corpos, 1956

   Toda estória que se preza tem vilões e mocinhos. Bem, algumas possuem apenas vilões... acredito que o leitor saberá que tipo de estória é essa, e quem são os vilões. 
   Creio que começou na última quarta-feira (sic! rs!) de setembro de 2009, quando a Abravin conseguiu, por meio de lobby, que o Congresso apreciasse uma lei que obrigaria as garrafas de vinho a portarem o Selo de Controle Fiscal. Sua aprovação aconteceu em 2010, e em 2011 todas as garrafas estavam obrigadas a ostentá-lo. No que isso impactava? Para o produtor nacional quase nada, uma vez que estes compraram uma máquina que 'emendava' o selo em cada garrafa após o envase. Para o importador... bem, cada caixa precisaria ser aberta e o selo aplicado. Manualmente. Felizmente essa lei foi cassada logo nos primeiros meses de 2011, mas ainda assim os importadores inicialmente viram-se obrigados a cumprir a regra. Algumas notícias no mínimo muito estranhas circularam, vejam só:

Vinícolas ajudarão Receita a checar selo fiscal em vinhos

  Não fosse suficiente o malfadado Selo, a Abravin chegou com outra logo em seguida, em 2012: pediu ao governo a adoção de  'salvaguardas' à indústria nacional de vinhos. Sugestão: aumento de alíquotas de importação para o vinho estrangeiro, dos então 27% para... 55%! Isso motivou ao pronunciamento que ficou conhecido como

Carta aberta de Ciro Lilla a seus clientes (trecho)
Proteção sem limites ao vinho nacional
Caro amigo,

O mundo do vinho no Brasil vive momentos decisivos. Agora é mais do que necessário fazer um alerta a nossos clientes sobre algumas notícias muito preocupantes para os amantes de vinho.

Por incrível que pareça, surgem outra vez notícias a respeito da pressão dos grandes produtores gaúchos sobre o governo para que haja um novo aumento de impostos sobre o vinho importado, como se a gigantesca carga tributária atual não representasse proteção suficiente para o vinho nacional. Fala-se agora em “salvaguardas”, como se a indústria nacional estivesse em perigo, em risco de falência, quando na verdade as notícias enviadas à imprensa reportam um grande crescimento de vendas. Afinal, é preciso definir qual discurso é o verdadeiro: o vinho nacional vai muito bem ou vai muito mal? Os comunicados e números oficiais dizem que vai muito bem, o que invalida o argumento a favor das “salvaguardas”. Além do que, os impostos atuais já são altíssimos, e representam o verdadeiro grande inimigo do consumo de vinhos no Brasil.

Além do aumento de impostos - pediu-se um aumento de 27% para 55% no imposto de importação, o primeiro da longa cadeia de impostos pagos pelo vinho importado - desejam também limitar a importação pelo estabelecimento de cotas para a importação de cada país. Ficariam livre das cotas apenas os vinhos argentinos e uruguaios. Incrível: cotas de importação para proteger ainda mais um setor, o de vinhos finos nacionais, que cresceu cerca de 7% em 2011 - ou seja, nada menos do que quase o triplo do crescimento do PIB brasileiro! Se forem adotadas salvaguardas para um setor que cresceu o triplo do PIB em 2011,  que medidas de proteção se poderia esperar então para o restante da economia? Repito porque parece incrível, mas é verdade: pedem salvaguardas para um setor que cresceu cerca de 7% em 2011! É preciso dizer mais alguma coisa?!
   O texto completo está aqui.

   Também na mesma época, alguns pequenos mas corajosos produtores ousavam pronunciar-se. Luiz Zanini, da vinícola Valontano, perguntava, dentre outras,
Por que o IBRAVIN não pede o SIMPLES para o pequeno produtor? Por que o IBRAVIN não pede o fim das normativas que limitam a produção artesanal? Por que o IBRAVIN não pede a dispensa do SELO FISCAL para quem produz até 50.000 litros de vinho? Por que o IBRAVIN não luta para baixar os tributos de nossos vinhos, ou cria um regime especial para os pequenos produtores? Isto seria a salvaguarda para a sobrevivência da diversidade do vinho brasileiro. Ao contrário disto, o IBRAVIN que, diga-se de passagem, não possui representantes de pequenas vinícolas, está se especializando em burocratizar o Setor.

   Então o que temos presenciado é uma sequência de movimentações no mínimo estranhas da parte dos nossos grandes produtores de vinho que, tudo indica, jamais teve como intuito proteger ou beneficiar o consumidor. Não bastasse - e agora vai para todos os produtores, e não apenas os grandes - os empresários do setor nos sobrecarregam com propaganda enganosa, marketing mentiroso e excesivamente ufanista e uma sobre-valorização de seus produtos, visando a confundir a percepção do brasileiro. Recobremos da postagem passada a posição de uma inocente compradora que parece não perceber o lodaçal em que ela própria está metida:
E vejo também que há muita resistência do consumidor para com os vinhos nacionais. Paga-se R$ 100,00 num vinho importado mas não quer pagar o mesmo preço num vinho nacional.
   Ao que o 'mediador' comenta,
Verdade. Com o dólar alto, hoje em dia o vinho nacional nessa faixa de preço provavelmente é de qualidade similar ou melhor que um importado. Temos ótimos vinhos e temos muito a expandir ainda.

   Percebe a desfaçatez? O 'mediador' não apenas continua induzindo a visão equivocada da consumidora como dá argumentos mentirosos acerca da qualidade do vinho nacional. E veja, também na postagem passada, a (suposta) mudança de posição do mediador: O empresário precisa de auxílio, sim, mas não privilégios. Ah, tá... vide as estórias acima. Cansaram de tentar impetrar tungas no brasileiro desavisado e mudaram o discurso. Como sempre digo... a informação precisa circular. Nunca pedi (rs), mas como está em moda pedir um like, peço que o inexistente leitor envie essa matéria a alguém próximo, que consuma vinho. The spice must flow...

   E ficamos assim: uma indústria que vai bem desde sempre, desde sempre conspira contra o consumidor. E agora vai a minha interpretação: as manobras não têm foco em impedir a entrada do vinho estrangeiro em nosso solo, mas forçar o preço do vinho importado para cima porque, dessa maneira, podem cobrar muito pelo seu próprio produto e então auferir lucros verdadeiramente absurdos com um produto de qualidade notadamente inferior. Olha, a indústria de tecnologia é quem provê lucratividade de 1.000% sobre o investimento, mas a riscos altíssimos. Não fosse o bastante, notemos que o restante da indústria agrícola não chega nem perto dessa lucratividade. Será que isso fecha a reflexão? O vinho no Brasil é um buraco-negro cheio de escorpiões onde poucos ousam botar a mão. Tonto que não sou, meto logo o pé... Hulk smash...

Tuesday, August 3, 2021

A pesquisa nacional e a poda de inverno nos vinhedos

Introito

   Vamos de saída a uma ameaça. Sim, o leitor leu corretamente. A ela: que nenhum mal informado, salafrário de má fé ou leitor com deficiência de interpretação venha dizer que a coluna não valoriza a pesquisa nacional. Não vai gostar do que ouvirá! O pesquisador nacional via de regra é muito sério. Falta-lhe senso crítico, é verdade, mas não podemos, de maneira geral, duvidar de sua competência e boa fé naquilo que ele pesquisa. Portanto, sim: os pesquisadores estão de parabéns antecipadamente. O resultado da pesquisas é que não pode ser levada a sério em seu contexto mais geral. 

Matéria do Diário do Comércio

   O Diário do Comércio é um jornal de Belo Horizonte, e publicou matéria onde exalta pesquisas levadas a cabo pela Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig) sobre a técnica de dupla poda, que permite a colheita no inverno, período seco e portanto mais favorável para a colheita de uvas com maior concentração de açúcar. A matéria reporta ainda que a técnica vem sendo aplicada na Bahia e em São Paulo, Goiás e Brasília e estudos são conduzidos no Mato Grosso. Mais importante, cita nove vinhos regionais premiados em concurso internacional, amealhando medalhas de prata (1) e bronze (8). Observo que nosso país ganhou uma medalha de ouro com o Zanotto Sangiovese, da Vinícola Campestre; é a terceira conquista dourada da história segundo os dados anuais que remontam a 2007. O concurso é o Decanter World Wine Awards 2021, que avaliou  18.094 rótulos de 56 países. Citado na reportagem, o enólogo da Epamig Lucas Bueno do Amaral diz que
A técnica da dupla poda vem se mostrado (sic) muito favorável e permitindo a produção de um vinho de alta qualidade. Para se fazer um bom vinho, metade do caminho é ter uma boa uva. Com a técnica, conseguimos produzir uma uva sadia, com boa maturação, sem doenças fúngicas. Isso acontece porque conseguimos tirar a colheita do verão, que é chuvoso, e fazer no inverno. Por isso, estamos obtendo vinhos de muita qualidade.
   A vinícola Maria Maria teve seu Fernanda Sauvignon Blanc safra 2020 premiado. Para o engenheiro agrônomo e administrador dos vinhedos da Maria Maria, Eduardo Junqueira Nogueira Neto, o negócio está indo de vento em popa:
Este ano fomos novamente premiados. Ganhamos a primeira medalha em 2017 e foi surpreendente pelas uvas serem ainda jovens e não esperávamos este retorno tão cedo. Depois de 2017, quando tínhamos 10 hectares de uvas, ampliamos e hoje estamos com 21 hectares plantados. Nossa produção tem dado certo e nas cinco últimas edições do Decanter ganhamos prêmios em quatro. (grifo nosso)
   A reportagem comenta ainda que para a safra 2021, a meta é produzir 40 mil garrafas, com expectativa, para os próximos anos, de 60 mil garrafas por safra.

   A leitora Bárbara Aparecida Campanati deixou sua opinião na página do jornal:
E vejo também que há muita resistência do consumidor para com os vinhos nacionais. Paga-se R$ 100,00 num vinho importado mas não quer pagar o mesmo preço num vinho nacional.
ao que foi comentada pelo 'mediador'(?) Franc Virtu:
Verdade. Com o dólar alto, hoje em dia o vinho nacional nessa faixa de preço provavelmente é de qualidade similar ou melhor que um importado. Temos ótimos vinhos e temos muito a expandir ainda.

   Os leitores Orlando Santos e José Carlos Rosolia comentam ainda que é preciso baratear o preço dos vinhos sem perder a qualidade. Que o governo esfola o consumidor, e por isso não se consome mais vinho no país. O indefectível Franc Virtu volta à carga com explicações:
Essa é só a superfície... É preciso aumentar a produtividade tbm... No passado era comum dizer que a vitis vinifera não se adequava ao Brasil, mantendo-nos totalmente dependentes dos importados. Essa afirmação já foi refutada. Temos um mercado em franca expansão. O empresário precisa de auxílio, sim, mas não privilégios. (grifo meu)

Certo. Então vamos ao que o leitor não sabe...

  1. O certame de 2021 distribuiu, para produtores brasileiros, um total de 42 comendas. Para conferir, faça assim: vá neste endereço, selecione "year" (ano) 2021 e "country" (país) Brasil. Contudo, foram conferidas ao todo 179 medalhas de Platina, 635 de Ouro, 5.607 de Prata e 8.332 de Bronze, totalizando a bagatela de 14.753 medalhas outorgadas para os 18.094 participantes. Vemos que... 81.53% dos vinhos inscritos ganharam medalha ou comentário! Na escola do primário, era mais ou menos assim: bastava participar para receber um certificado. Lembra daquele menino espoleta (sic) da sua classe? Aquele tirava 80 de bom comportamento... do restante, todo mundo tirava 100...
  2. O Brasil está presente nesse concurso desde 2008, quando abocanhou um comentário favorável, e conquistou a primeira medalha em 2012, tendo acumulado desde então 322 medalhas ou menções.
  3. O Chile - país no qual este articulista gosta de bater, em função dos preços exorbitantes de seus vinhos e que, como digo, é o mais desimportante dentre os produtores importantes - está lá desde 2007 com medalhas de prata e acumula um total de 6.733 medalhas ou menções(!).
😅 Chu-pa, Bra-sil! 😂

   Então vejamos: o mais desimportante dos produtores possui, grosso modo, 23.7 vezes mais medalhas  ou menções do que nós. Veja só: 23.7x. E eu castigo os importadores porque suas margens mal excedem 4x ou 5x o valor do vinho lá fora. Eu sou um canalha, não é mesmo?

   O resultado preliminar desta postagem é a constatação de que a matéria tenta superestimar feitos mínimos alcançados pela nossa indústria, elevando a suposta qualidade do vinho nacional a um patamar pouco condizente com sua qualidade. A indústria está de parabéns pelos seus esforços, apesar de pouco profícuos. Pesquisar é o caminho, assim como debater sem paixões ajudará no aprimoramento do processo como um todo. Mas se ainda não ficou claro, caro leitor, esteja alerta, porque estão tentando enganar você. E como vimos alguns leitores - aparentemente de boa fé - caem na ladainha. É assim que anda nosso mercado interno de vinhos: importadores querem enganar você. Produtores querem enganar você. Muitos e muitos formadores de opinião (sic) querem enganar você. Cuide-se. E, como sempre, wine-searcher neles!

   A postagem está longa. Farei a parte 2, comentando um pouco mais. Não postarei comentários não identificados. O debatedor está obrigado a enviar nome e telefone (que será removido para publicação na seção de comentários), e entrarei em contato com ele para certificar-me de quem seja.

Monday, August 2, 2021

Vestais na cozinha unidas pela emoção

Introito

   Unidos pela emoção é o lema das olimpíadas de Tóquio. Bonito. Ao que consta Rebeca Andrade não tinha patrocinador até a última quinta-feira, dia em que faturava sua primeira medalha. Enquanto isso bancões patrocinam um idiota metido a surfista que posta imagens de namoradas (ou meras parceiras, tanto faz!) na internet, para compartilhar suas conquistas com os 'amigos'. Parece que diversos atletas do nosso atletismo além de também não terem patrocínio precisam usar equipamentos de segunda linha, mais baratos, para poderem competir. Como é possível, depois do milagre de classificações para fases finais de suas competições - ou sem conseguir se classificar por pouco - tentarem competir com atletas bem treinados, bem alimentados, com suporte técnico, médico e dispondo do que há de melhor em equipamentos? Mas um único Neymar da vida - e uma sequência quase infinita de iguais idiotas antes dele - assinam contratos centi milionários e brindam-nos com a simulação de um choro ao perder alguma disputa para no mesmo dia promoverem o maior pagodão, churrascão ou algo que o valha. Tenho acompanhado um pouco da festa olímpica. Ela não me representa. Não enquanto nossas empresas mantiverem suas políticas toscas de só patrocinar atletas 'mais do que prontos', em sua sanha de fazer bonito frente ao consumidor - alguma semelhança com nossos importadores de vinhos? - e enquanto nossos 'ídolos' defenderem que o país precisa de estádios mais do que de hospitais - para não citar outros exemplos. O Zaneti, que literalmente caiu das argolas, representa-me. Todos os que foram lá com a cara e a coragem, tenham conquistado ou não medalhas, representam-me.
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   Este Prelado andava algo preocupado. O que fazer neste final de semana? O que beber? O que cozinhar? (tamanho dilema para  este cozinheiro de um prato só, lembre-se...). A confraria possui um templo, e este, as vestais... pronto! Por que não chamá-las e resolver os problemas? Da mensagem para as vestais Dayane e Renata surgiu nova ideia e outra mensagem chegou para a vestal Luciana. No sábado estávamos todos reunidos para vinhos e beliscos.

Um vinho nacional

A Luciana apareceu com um um vinho espanhol, que acabou ficando para outra oportunidade, e um vinho nacional, cometido (sic) e engarrafado por Francisco Carlos dos Reis, Chácara Santo Ivo, Rua Duque de Caxias, Caldas, MG. É rotulado como um 'Produto Nacional Delícias de Minas'. Tem 11% de álcool, e clama ser um 'vinho tinto seco'. Tem um 1922 no rótulo. Duvido que seja a safra 🤣. Também tem um RESERVA escrito em letras garrafais. Se lembro-me bem, acho que o 'Caldas' é de Caldas Novas. Particularmente, acho ótimo prestigiar o vinho nacional. Até tomarmos pé do que ele é. Parênteses: o sr. Élvio (se não me engano era esse seu nome) mantinha uma loja de vinhos brasileiros em S. Carlos, lá pela primeira década do século. Comprei vários vinhos dele, para conhecer nossos produtores. Um dia, levei-o em casa e abri-lhe um Leon de Tarapacá, vinho que consumia com frequência - estava no início da minha caminhada. Naquele dia ele entendeu o que eu dizia-lhe há semanas, que os vinhos chilenos eram superiores aos brasileiros 😝. Fecha parênteses. Depois abri um Selección del Diretório (Santa Helena), e ele convenceu-se de que não, não tínhamos a mínima condição competir com os chilenos 😕😖... Aqui, repete-se o mesmo de alguns (mas não todos) dos vinhos nacionais que experimentei naquela época: falta de estrutura, buquê a... uva... gosto a... uva... que impregna a taça a ponto de comprometer a degustação do vinho seguinte. Precisei lavar nossas taças para sair o buquê, e... não lavei as taças das vestais Renata e Dayane. Baco não perdoa... espero que elas sim... 😟. A Luciana ainda pagou R$ 89,00 pela garrafa. Um Leon de Tarapacá custa USD 3,00 (três 'moedas') no Chile. Isso dá R$ 18,00... e surra de chicote o... o... o... o que quer que seja acima, que não é vinho.


Três vinhos às cegas, e um quase no final

Recebi as vestais oferecendo-lhes, a título de curiosidade, o Cedro do Noval 2015, que abrira no dia anterior. Estava bastante bom, e elas gostaram muito. Depois vieram três vinhos às cegas, que a dado momento foram revelados. Um foi o Château Peyrabon 2013, degustado há pouco, em junho. Essa garrafa nada mudou, e não há o que acrescentar à postagem recente. Mostrou-se um pouco chocho, sem muito corpo, sem impressionar. Alguma acidez, e pouco mais. Veja a postagem. O  Chateau Teyssier Grand Cru 2011 também foi degustado recentemente, em maio. Naquela ocasião foi admirado pelas outras confrades, e voltou a ser louvado em nosso encontro. Corpo bem mais presente, acidez mais equilibrada, final mais marcado do que Peyrabon. O Chateau Magence 2010 foi inédito para mim, embora tenha provado da safra 2001 em novembro de 2020. Passou um pouco despercebido pelas vestais - acho que alguém (Renata?) gostou dele. Mas a preferência geral recaiu sobre o  Noval. Bem, Magence apresentou nariz com boa fruta, especiaria, café/chocolate, boca média (taninos, acidez) e toques minerais com álcool e madeira contidos. Corte Cabernet Sauvignon/Merlot (60%/40%), mostrou ainda final agradável e alguma persistência. Teyssier foi comprado a R$ 200,00 ou pouco mais, tempos atrás. Andou a R$ 300,00, agora está R$ 250,00. Peyrabon, comprei a R$ 150,00 em 'promo', e anda a mais do dobro por aí. Por R$ 230,00, Magence é de longe a melhor compra.

Novamente, o ato falho

   Do (re)começo. A primeira ideia foi apresentar para as meninas vinhos mais ou menos da mesma região (Bordeaux) em safras distintas e muito díspares. A safra 2010 (Magence) foi excelente; a 2011 (Teyssier), boa, a 2013 (Peyrabon), medíocre: a pior dos últimos 25 anos. A segunda foi experimentar como anda o Magence. Acontece que, se na postagem da safra '01 mencionei que ele havia se esgotado, bem... o importador conseguiu mais um lote. Comprei outras duas garrafas - o preço não subiu muito: foi de R$ 210,00 há alguns anos para R$ 230,00(!) com esse dóla de hoje. Está bastante bom e vale a compra de mais algumas garrafas. Aquela estória de guardar mais um pouco e em algum tempo começar a beber uma a cada seis meses, lembra? Isso mesmo...

Preciso comentar ainda que - dada a quantidade de comida trazida pelas vestais - deixei de oferecer meio hambúrguer para cada pessoa, para acompanhar tanto uma degustação rápida de Noval e dos franceses. Foi minha falha. Os quitutes eram muitos e estavam muito bons, mas não parearam com a boca dos franceses. Desacompanhados, eles ficaram um pouco aquém do que poderiam oferecer. Ainda, Noval está mais novo, tem mais corpo e é de uma safra bastante boa. Nos últimos anos não tem-me faltado um bifão - ou mesmo um hamburginho - com vinhos desse padrão, e não me atentei em assegurar a presença de um pedaço de carne mais concentrada. O grande ato falho das meninas foi apontado por mim, mais ao final. O Peyrabon não chamou mesmo muita atenção. Vejam quanto sobrou (à direita). Teyssier, bastante elogiado, foi bem consumido (garrafa do meio). Mas o esquecido Magence (esquerda) foi o mais consumido... Recobro então minhas máximas, reescritas abaixo, com os devidos links para as postagens onde ganharam a luz pela primeira vez. Creio que a leitura dessas postagens também possa ser ilustrativa.




Rata! 🐭

   O município em Minas Gerais é de fato Caldas, e fica no sul do estado.