Sunday, December 21, 2014

De como Flavitxo Gambero desafiou Carlitos Bicchiere - Prelúdio ao duelo de final de ano

Cenário

   Uma praça em Vinci, comuna da Toscana, província de Florença, um dos marcos do Renascimento. A população de aproximadamente 14 mil habitantes vive pacificamente ao redor da Praça Central, ornada com belas árvores, uma fonte onde a tocadora de alaúde poderia estar posando para Caravaggio e um relógio de sol bem ao centro.

Emboscada

   Chegando à praça, vindo da caminhada matinal, Carlitos Bicchiere distribui mesuras aos passantes. De repente, não mais que de repente, Flavitxo Gambero, mascarado do mal, nem tão do mal, mas certamente mascarado, salta de uma moitinha - o que ele estaria fazendo ali? - e aproxima-se com seu andar, gestos e olhar de pinguim.

Declaração de guerra

   - Carlitos, en garde! - e quase encosta o florete perigosamente ponteagudo do pacífico transeunte. - Em breve nos encontraremos em uma mesa com taças e copos para nossa degustação anual, e devo dizer que meu vinho será muito melhor que o seu. Mas não estou aqui por isso. Você andou dizendo por aí que no encontro do ano passado meu vinho fez um papelão. Estou aqui para tirar satisfações. Quero ver você repetir isso, ou se desculpar imediatamente!
  - Don Flavitxo, ora vamos. Cuidado para não ferir as outras pessoas... eu apenas interpretei seus escritos quando de seu comentário a respeito dos vinhos degustados naquela ocasião.
   - Interpretou mal, e errado. Eu não disse isso.
   - Bem, para meu vinho você disse "notas de amoras e cerejas pretas, em meio a notas florais, chocolate, aniz, alcaçuz e grafite. Com o tempo, foram surgindo muitas notas de especiarias, um apimentado gostoso e sálvia", enquanto para o seu, apenas "frutas vermelhas maduras, sous-bois e o tabaco leve, com um fundo de alcaçuz muito gostoso". São 10 notas de um, contra 4 do outro, fora o show. Para qualquer observador a diferença de riqueza descreve a expressão acabada de um papelão, sim senhor.
   - Ora, Carlitos, você me paga! - Flavitxo avançou mais um pouco enquanto Carlitos recuava estrategicamente para sacar a espada. Flavitxo estocou, e Carlitos ripostou. Depois contra-atacou, salvando para a posteridade uma lasca de bigode.
   - Ai! Carlitos, agora não vou perdoar. Meu vinho vai massacrar o seu no nosso encontro. Não deixarei barato! - e foi para a frente, esgrimando com maestria, infelizmente para si menor que a do adversário. Uma multidão cercou os contendedores, tirando-lhes espaço de manobra e forçando-os a caminhar para o centro da praça, enquanto trocaram golpes.
   - Se o vinho for como sua habilidade no florete, Don Flavitxo, acho que vamos conhecer mais um papelão na noite de segunda-feira.
   - Ora, seu insolente de uma figa - e novamente o florete de Flavitxo encontrou o caminho bloqueado pelo de Carlitos. Mas desta vez Carlitos realizou um movimento helicoidal com sua espada, e acabou por desarmar o adversário. A posição final era Flavitxo Gambero com o florete de Carlitos Bicchiere na garganta.
   - Pois bem, Don Flavitxo, ouça com atenção. Volte lá para sua adega e escolha direitinho algo que possa derrotar meu eleito. Você pode até conseguir, mas não será com um samba de uma nota só, nem com um vinho de quatro notinhas. Não repita o carão como daquela vez em que em um duelo de Pinots você apareceu com um vinho argentino e ficou a noite toda dizendo ser a melhor safra daquele vinho que desapareceu contra um Borgonha e um Russian River
   Flavitxo virou-se e correu, abandonando seu florete enquanto recebia uma devida assinatura do lado de trás das calças. Levou a mão ao local, voltou-se enquanto corria a disparou:
   - Eu me vingarei...
   Carlitos Bicchiere ficou parado por um momento e olhou para o relógio de sol. Era metade da tarde de domingo. Ele sabia que teria trabalho para escolher algo em sua modesta adega que fizesse frente a Flavitxo Gambero. Flavitxo tinha mais experiência, uma adega melhor, e seria o anfitrião naquele encontro. Que escolha poderia fazer Carlitos Bicchiere para equilibrar a disputa? Ele olhou para as colinas ao longe. Sabia que com um pouco de engenho e arte, poderia gerar a roda da fortuna a seu favor. Pegou um capim, começou a mastigá-lo, e caminhou para sua casa.

4 comments:

  1. Carlão,
    fico na espera do "duelo final".
    cuidado com o teu florete, porque acho que o Flavio vem com arma de fogo. kkk
    Abraço!

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    1. Grande Alexandre!
      Antes mesmo de ler esta postagem do Carlão, já havia lhe dado uma lição... E mesmo sem saber destas "inverdades" que ele disse (rsrsrs) saquei uma espada espanhola e dei-lhe uma espetada doída...kkk. Depois você saberá como foi.
      Grande abraço,
      Flavio

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  2. Ah ah ah, a certeza é que, se não estava, agora está!
    []s,
    Carlão

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