Saturday, June 20, 2020

Cellier des Princes Vacqueyras 2018: Xatenêfi de pobre?

O Rhône

O Rhône é, para mim, o terceiro mais importante polo vitivinícola da França. Lar dos Hermitage, Condrieus, Châteauneuf-du-Pape (CdP, ou Xatenêfis (risos), como costumo dizer) e muitas outras denominações, é dividido entre 'norte' e 'sul'. Responsável por menos de 10% da produção do Rhône, o norte é dividido entre 'meia dúzia' de localidades demarcadas (as AoC's) que, somadas, ocupam menor área do que a declarada pela gigante Concha y Toro no Chile. Pelo menos em alguma coisa eles ganham😂...  São elas: Côte-Rôtie, Condrieu, Château-Grillet, Saint-Joseph, Crozes-Hermitage, Hermitage, Corna e Saint-Péray. As uvas permitidas por ali são Viognier, Marsanne e Roussanne pelas brancas e a solitária Syrah pelas tintas. Não se engane. Lá tem corte de Syrah com Syrah, e a briga fica feia para qualquer outro produtor dessa variedade mundo afora. Responsável por mais de 90% da produção local, o sul é dividido nas AoCs Côtes du Vivarais, Côtes du Rhône, Côtes-du-Rhône Villages, Côtes du Rhône Villages, Châteauneuf-du-Pape, Grignan-Les Adhemar, Vacqueyras, Rasteau, Cairanne, Gigondas, Vinsobres, Lirac, Beaumes de Venise, Muscat de Beaumes de Venise  e Tavel.
   Área plantada no norte do Rhône: cerca de 2.900 hectares.
   Área plantada pela Concha y Toro: 11.600 hectares.
   Estou fazendo essa conta porque encontrei o dado de área plantada do norte no Rhône com menos trabalho. Para efeito comparativo, é possível ter dimensão das áreas envolvidas.

O sul do Rhône

   Então com uma área superior a 30.000 hectares, o sul do Rhône tem muitos estilos. Prova disso é que só em Châteauneuf-du-Pape são permitidas 13 cepas tintas... Vacqueyras  é um distrito não tão importante, mas faz a lição de casa. Seus vinhos são baseados em Grenache, Syrah e Mourvèdre, não apenas mas principalmente (Cinsault, Muscardin e Counoise também são permitidas, pelas tintas).
   Acontece que o corte Grenache, Syrah e Mourvèdre - GSM - é uma combinação muito feliz quando se almeja com vinho que combine graça e potência. Assim, embora os vinhos de Vacqueyras  sejam pejorativamente chamados de Xatenêfi de pobre (sic! rs!), por falta de um grande produtor na região, os exemplares dessas terras são bastante razoáveis principalmente pelos preços. Aliás a falta de um grande produtor até deixa seus vinhos subvalorizados... o que se reflete em boas oportunidades para vinhos do dia a dia. E isso não acontece somente em Vacqueyras.

Cellier des Princes

   Cellier des Princes, a exemplo da Lavradores da Feitoria, é uma cooperativa composta por... 189(!) viticultores. Produzem várias linhas, com cortes e monovarietais. Cellier des Princes é apenas uma delas. Vacqueyras é um corte constituído por 65% Grenache, 25% Syrah e 10% Mourvèdre (nessa safra). Abriu fechado (sic! rs!), e uma hora de aeração na garrafa fez-lhe bem. Deve ser servido um pouco mais frio do que de fato costumo fazer para tintos (a recomendação de 16 °C a 18 °C é realmente válida). Não passa por madeira, e isso se evidencia pela presença de muita fruta. É um vinho redondo. É um grande vinho? Não. Mas tem corpo médio, bons taninos, acidez presente - acidez... o grande diferencial para quem aprende a reconhecer este pequeno-grande elemento da estrutura de um vinho. Na boca o açúcar sobra um pouquinho - bem pouco - apenas para fazer lembrar o papel da acidez a contrabalançá-lo. O leitor se orgulha em ser bebedor de chilenos (ou sul americanos de maneira em geral)? Ótimo! Você está certo! Viu o tamanho só da CyT em comparação com o Rhône todo? Mew (rs), continue pagando R$ 160,00-200,00 por produtos sul-americanos produzidos a rodo - e com rodo - e deixe os Rhône para quem gosta de vinho (risos). Dou o móóóórrrr apoio... Agora... se o leitor aprendeu a diferença entre 'vinho' e garrafas com 'vinho' escrito no rótulo (sem sê-lo), experimente este Cellier des Princes de Vacqueyras. Você já ouviu que é melhor ser pobre no primeiro mundo do que classe média no quarto? Mera citação empobrecida de Milton*... este Xatenêfi de pobre da França é melhor do que muito vinho premium de rico latino-americano...
   Cellier des Princes é representado no Brasil pela Enoeventos. Compare os preços lá e cá via wine-searcher. Se a relação custo-benefício não for boa, senta a pua no Oscar.

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'Melhor reinar no Inferno do que obedecer no Céu' - Paraíso Perdido, John Milton, 1667.

4 comments:

  1. Vamos começar a briga? Eu sei que vou perder, mas vamos lá...rs.
    Gosto dos Vacqueyras, apesar de achar que grande parte fica com preço próximo de CdP. Aí, prefiro esse último.
    Agora que eu já concordei, deixa eu discordar de sua frase "...por falta de um grande produtor na região" (reafirmada à frente no texto). Como? Jaboulet, M.Chapoutier, Perrin, Chateau des Tours, Delas, Domaine le Colombier, todos produzem vinhos lá. Tem que argumentar bem dessa vez, hein? rsrs.
    Abraços,
    Flavitz

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    1. O pobre Don Flávio chega derrotado para a contenda... assim nem dá gosto de começar...
      Bem, tecnicamente foi o meu primeiro Vacqueyras. Talvez tenha bebido um, anteriormente, mas não 'liguei' a região. Uma declaração: preço a preço, entre os últimos vinhos que comentei aqui e nessa faixa, preferi, em ordem, o Aguaneiras e o Teyssier. Cellier des Princes ficaria em terceiro.
      Também nunca prestei muita atenção no preço dos Vacqueyras em particular. No presente caso (vinhos do produtor), a diferença entre Vacqueyras e CdP é de R$ 90,00. Grosso modo, um terço do preço do CdP, que não experimentei. Sua ponderação - de que Vacqueyras possa ser caro em comparação ao CdP - é de fazer pensar...
      À discordância! 😆 (rs).
      Poderia dizer que parte dos produtores (todos?) não é originário da região - mas produtores de outros lugares que foram produzir lá. Qual dos citados tem 'sede' em Vacqueyras? 🙄
      Poderia dizer ainda que, mesmo com a presença desses produtores, Vacqueyras carece um vinho verdadeiramente aclamado. Nunca vi - mas de longe significa que não exista. Sugiro apenas que talvez precisemos procurar com lupa para encontrá-lo. 🙄
      Ainda ouso dizer que Vacqueyras parece não ter <>vinhedos aclamados<>. Do Rhône, encontramos comentários sobre La Landonne, Le Méal e outros: seu estado atual, os vinhos produzidos safra a safra... não vemos nada sobre Vacqueyras com a mesma abundância. 🙄
      De qualquer maneira não recuso o erro no comentário, de que Vacqueyras não tenha produtores de peso. Mas parece que eles não estão conseguindo fazer a diferença, no sentido de dar à região uma relevância maior face aos outros competidores locais.
      🙂 Saí-me mais ou menos bem?

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    2. Tréplica:
      1. Digo que entro derrotado por que, mesmo é difícil convencer VSa. rsrs.
      2. Seu primeiro Vacqueyras??? Putz, tem que beber mais. Ia até te perguntar como distinguiria, às cegas, um Vacqueyras de um CdP, mas deixarei para a próxima.
      3. Quanto à sua pergunta sobre à sede, eu sabia que você viria com essa argumentação. Ia até citar antes, em meu comentário. Quer dizer que esses produtores vão todos lá, pegam as uvas plantadas na região e produzem os vinhos fora de lá? Se eles atuam lá, e a sede é em outro lugar, tanto faz. Continuam sendo grande produtores. Você pode até dizer que não são produzidos vinhos de grande destaque na região, mas não que não tenha grandes produtores atuando lá. Só não sei dizer se todos estão vinificando lá, o que seria o mais adequado, pois não conheço a região. O fato é que há sim, grandes produtores em Vacqueyras. O que faz a diferença então em relação a um CdP, que coloca um Vacqueyras geralmente na rabeira? Resposta simples também, mas deixa para você pensar (ou pesquisar). Ah, tem a ver com a sua questão sobre a ausência de vinhos "aclamados" em Vacqueyras. Se você analisar as suas últimas linhas, certamente chegará à resposta para a questão de que, mesmo tendo produtores de peso lá, não são lançados vinhos de grande expressão na região.
      4. Compare então com a Borgonha. Quantos produtores têm sede nas comunas? Eles têm vinhedos lá. Todos vinificam no mesmo lugar onde o vinhedo está? Mas lembremos que os produtores são todos franceses, e que alí, é tudo muito perto.

      Eu concordo com você que os Vacqueyras são subvalorizados e pouco conhecidos e reconhecidos, principalmente no Brasil. E que continuem assim, pois sobra mais para quem sabe que eles podem bater fácil vinhos sulamericanos mais caros. Mas também, é uma questão de gosto do freguês. Muito bebedor pode torcer o nariz quando bebe um Vacqueyras... Quem está certo? Ele ou a gente? Não existe certo ou errado na história.

      Abração,

      Eu mesm...

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    3. 1. Eu só argumento...
      2. Identificar um Vacqueyras às cegas? Nem às claras...
      3. Note que não falamos só de produtores, mas também de vinhedos. Como disse, conheço muito pouco no geral (teoria e prática - prática, muito menos - rs). Mas temos CdP que podem ser ditos 'um dos melhores vinhos da França'. Temos um Vacqueyras nessa situação? Ilustre-nos, por favor... E não estamos falando que o vinho seja ruim... apenas que talvez tenha dificuldade em competir com certo nível de outros vizinhos.
      4. Tem região na Borgonha onde, se os produtores fossem criar uma base, seria necessário um prédio... de uns 200 andares, para caberem todos... o prédio espalharia sombra indesejável por metade da região, e prédios das demais regiões tenderiam a cobrir de sombra toda a borgonha... 🙃 Seria o caos... Melhor não pensar nisso...

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