Monday, March 1, 2021

Um Saint Joseph

Introito

   O assunto vinho é complexo, permite várias interpretações (desde que honestas; contando as desonestas, as possibilidades chegam à miríade). Não existem certezas, mas tendências. Não existem regras (além daquelas específicas das regiões demarcadas), mas consensos. Não existem convicções, mas crenças. Exemplificando a última proposição: tenho uma garrafa de Biondi Santi. Um excelente vinho, dirá quem conhece a história do produtor. Creio que o vinho esteja bom. Estará bom de fato, só porque é um excelente vinho? A garrafa pode estar miada... justo aquela, em todo o lote... Acredito que esteja em boas condições... saberei quando abrir. Exemplificando a penúltima proposição: não é regra o serviço de brancos antes e tintos depois. Um branco barricado pode ser deixado para depois de um tinto leve. O assunto é amplo... 

Saint Joseph

   Saint Joseph é uma região demarcada pertencente ao norte do Rhône, produtora principalmente de tintos baseados em Syrah, com alguma produção de brancos de Marsanne e Roussanne. Outras regiões demarcadas são Hermitage e Crozes-Hermitage Hermitage, mais famosas, Côte-Rôtie, talvez conhecida dos iniciados porque seus vinhos são invariavelmente mais caros, e Cornas, além da própria Saint Joseph, conhecidas dos iniciados porque são de fato menos famosas. Existe, no sul do Rhône, terra do Xatenêfi (também conhecido marginalmente como Châteauneuf-du-Pape) - a denominação Côtes du Rhône. Acontece que... - nada é absoluto! -, além de ser uma AOC, o termo Côtes du Rhône também pode ser usado em outras localidades. Se o leitor acha que que isso explica algo, saiba que explica nada! Só põe mais lenha na fogueira que vem a seguir. Quem souber que me conte... 😝

La Sarriette Saint Joseph 2012

   Havia comprado uma garrafa La Sarriette a R$ 133,00, por conta da 'promo' da Vinho e Ponto. Quando da último encontro Vinho & Tur, resolvemos continuar a degustação no amplo escritório de Edu. A Dayane, adoradora de Syrahzes (sic), procurava algo para levar e apontei o vinho para ela, que não vacilou. Entre alguma-coisa-com-pizza, e pizza-com-alguma-coisa, (alguma coisa = muita conversa), vai vinho, entra vinho, o dela chegou às nossas taças. Alguma surpresa, resmungos e buchicos. Precisei intervir: - É bréti... - e expliquei um pouco sobre. O verbete em inglêsda Wiki é bem mais completo do que aquele em português, pelo que aconselho sua leitura. Use o 'translator', que nunca dá resultados muito fora do compreensível. Trago parte do comentário sobre a bréti (sic):
When Brettanomyces grows in wine it produces several compounds that can alter the palate and bouquet. At low levels some winemakers agree that the presence of these compounds has a positive effect on wine, contributing to complexity, and giving an aged character to some young red wines. Many wines even rely on Brettanomyces to give their distinctive character, such as Château Musar. However, when the levels of the sensory compounds greatly exceed the sensory threshold, their perception is almost always negative.

   Na maldade 😂: quando a bréti transborda, é percepção é a mesma de quando alguém.. joga no ventilador. Foi assim que o pessoal ficou, a despeito do meu comentário - Mas com um tempo, isso sai... (😜 - sai de onde para onde, cara-pálida?!).
   Agora, as confusões: a garrafa que abri hoje não apresentou bréti. E até onde procurei 'por aí', o que existe de La Sarriette do produtor é o  Côtes du Rhône, e não o Saint Joseph... É estranho um vinho com o mesmo nome e duas procedências diferentes. Às vezes o 'La Sarriette' poderia indicar o vinhedo, ou mesmo a comuna, mas para indicar vinhedo precisaria ser de melhor procedência ($$$), enquanto para indicar comuna, o mais comum seria indicar sê-lo da região de Saint Joseph ou Côtes du Rhône AOC, não? Alguém sabe explicar?  Bem, pelo já comentado, La Sarriete, mesmo produzido em Saint Joseph, poderia ser rotulado como um Côtes du Rhône. Mas S. Joseph supostamente produz vinhos menos genéricos, o que poderia denotar mais importância... não entendi por que não apresentá-lo 'por aí' como Saint Joseph. Não bastasse, o sítio do produtor nada fala da produção do Rhône. Uma confusão só...


La Sarriette Saint Joseph 2012 - minha garrafa - não apresentou bréti. Poderia ser da rolha? E não contaminou as outras? Fruta vermelha em primeiro plano, seguido por algo à couro e álcool integrado, não aparece. Boca com alguma especiaria, acidez e corpo médios, final ligeiro mas com alguma persistência. Digo, não é um sul-americano, cujos traços no final da boca logo vão-se embora. Para quem transcendeu a baixa acidez sul-americana e sabe do que falo, é um vinho acima da média (dos sul-americanos). Estes estão tão caros por aqui, que até em seu preço cheio (R$ 266,00),  La Sarriette pode bater concorrentes locais com alguma folga - duas cabeças, o que no turfe pode ser considerado uma vantagem beeeeeemmmm folgada. O problema é que, comparado a outras ofertas daqui mesmo, independente da nacionalidade (desde que européia!), La Sarriette pode ficar em desvantagem de dois corpos. No mesmo turfe, dá um espaço vago quase como a distância entre a Terra e a Lua... Surpreso? Vamos trocar em números - sempre eles... pode reclamar, mas veja como fica fácil de entender...
  La Sarriette Côtes du Rhône (se for mesmo teste), custa lá fora 10 dóla. Esgotado, é uma estimativa do Wine-Searcher. Tomemos USD 10 + impostos (o WS não fala se com ou sem, consideremos sem impostos e vamos acrescentá-lo à conta): USD 12,00. Dóla de 2013, 2,35, em 30/12 (afinal o vinho de 2012 foi lançado em 2013)... dá... R$ 28,20. Sim, esse era o preço que o consumidor lá fora poderia pagar em 2013 por um Côtes du Rhône La Sarriette. Certo, não sei quanto Vinho e Ponto poderia pedir por ele à época. Mas muitos de seus vinhos - e já comentei isso! - ficaram com seus preços estacionados ao longo dos anos. Não sejamos tão sádicos, tão peçonhentos... (veja a partir de 1min14s). Façamos a conta nos dias de hoje USD 12,00 x 6,00 = 72,00 x 2 = R$ 144,00. Nesse preço, está até bom, porque a margem é menor que 2x. Mas sem o desconto dá mais de 3x a preço 'regular'. Mais de 3x é o que chamamos de margem pornográfica. E digo isso sem medo de ser preso pelo Supremo - nem eles cometeriam tal iniquidade... Ademais, a preço regular, toma uma sova de arreio com salmoura de várias opções do mercado. Conclusão: a preço de hoje, se você precisa comprar, pode ser uma boa aquisição, a preço de 'promo'. Sem promo, é absolutamente fora dos padrões. Perde feio de Arínzano ‘Hacienda’  (R$ 250,00), que por sua vez toma outra sova do R$ 245,00 (preço regular de Eno-Clube) Korem da Enoeventos. E olha, com o Korem é sova mesmo... 

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