Sunday, January 31, 2021

Comentário sobre um comentário

Introito

O blog tem leitores que não se manifestam nos comentários da plataforma, mas comunicam-se diretamente comigo. Recebi a ponderação abaixo do Jairo Cantarelli, proprietário da Vinho e Ponto de S. Carlos via uatizápi no grupo Vinho e Viagens, que é coordenado pelo Eduardo da empresa Caminhos do Turismo. Diz respeito à Postagem dois em um, cometida (sic) há poucos dias.

O comentário

   Lidos rapidamente, logo pela manhã !!!
   Sempre faço uma comparação entre a nossa capacidade de avaliação gustativa e a precisão dimensional que algumas profissões usam ou alcançam. Quando conversamos com um carpinteiro, a conversa gira em torno do cm (centímetro) e ele ainda usa aquela régua de medição amarela de cerca de 1 m e que dobrada nas articulações, fica em uns 20 cm de comprimento. Nem precisa dizer que a escala desse instrumento de medição é bastante imprecisa. 
   Quando conversamos com um marceneiro, a conversa já evolui para o mm (milímetro) e o instrumento usado para medir já é uma trena com maior precisão ou até app de celular.
   Se vamos falar com um mecânico sobre uma determinada peça, muito provavelmente, a conversa vai girar em torno do décimo de milímetro e se vamos a um mecânico de precisão, então a conversa passa para o centésimo de milímetro.
   Nada impede que um carpinteiro fale em mm. Mas nunca confiem em um mecânico que estiver com a régua amarela do carpinteiro na mão 😳
   Creio que o nosso paladar se comporta mais ou menos assim. Se somos iniciantes na apreciação, estamos mais para carpinteiros e não enxergamos detalhes de décimos de milímetros. Mas podemos fazer um trabalho de carpinteiro muito bem feito.
   Nossa, isso está muito comprido 😬
   Conforme vamos evoluindo no conhecimento e na degustação, vamos trocando o nosso instrumento de precisão e assim por diante, para encurtar um pouco a conversa.
   Isso não quer dizer que quem tem o melhor instrumento de medição, seja melhor profissional. Já cruzamos com mecânicos muito ruins e carpinteiros excelentes em nossas vidas, certo ?
   Por que me veio tudo isso ? Pela votação no Cabra Cega. 
   Isso reflete um pouco o nível em que estamos em termos de capacidade de medição.
   Muito provavelmente, eu teria votado nele também.
   Vou ficar por aqui !
   Deu pra entender o ponto ?
   Se o nosso paladar é Cabra Cega, vamos ficar extremamente felizes bebendo um, mas talvez não fiquemos tão felizes bebendo algo mais sofisticado.
   Ah, e tem pessoas que, por questões genéticas talvez, nunca passam do cm para o mm e assim por diante.
😬😬😬🍷🍷🍷

Comentário sobre o comentário

   Particularmente, acho que nada mais correto; concordo 100% com a reflexão. 
   É muito difícil formar grupos heterogêneos em qualquer atividade humana. 
   Sentava-me para beber com Akira e Flávio (Akira não bebe mais, apenas isso mudou; ele continua 'cafungando'). Os dois conhecem muito mais do que eu, porque trabalham profissionalmente com fermentação. Enquanto estou tentando identificar se a fruta é vermelha ou negra (quando não está evidente), eles já estão na lichia, blue x black berry (sic) e passos mais adiantados. 
   Os confrades d' As Noivas de Baco estão, assim como a trindade (sic) Akira-Flávio-Carlos em níveis diferentes de conhecimento. O Akira reconhece que eu tenho conhecimento teórico muito maior do que o dele, pelo simples fato de que eu leio alguma coisa, e ele lê praticamente 'zero'. Ler sobre vinho não é do interesse dele. Beber, era. 
   Da mesma maneira, os confrades d' As Noivas de Baco possuem conhecimentos diferentes e até mesmo interesses em diversos níveis quando o assunto é vinho. Ninguém pode impor que outras pessoas conheçam ou dediquem-se a um assunto que lhe é particularmente interessante. É um comentário óbvio mas que precisamos tomar por 'régua' na hora de medir não apenas o conhecimento mas também o interesse de cada um sobre o tema. Meu interesse por vinho vem de uns 20 anos. Nada mais normal que sejam um pouco maiores do que das pessoas que, como eu, não são profissionais, mas tenham interesse similar há, por exemplo, apenas 10 anos. Para um 'interesse igual', se pudéssemos metrificar isso, aquele que estuda o tema, qualquer tema, há 20 anos, deve conhecer mais do que aquele que o estuda pela metade do tempo. Ou o primeiro é um paspalho...😂. Assim, entre 'interessados' por vinho, se tenho 20 anos de estrada, é praticamente um 'obrigação' que eu conheça um pouco mais. Observadas todas as aspas deixadas pelo caminho!
   Por isso sei que sim, em alguns pontos conheço um pouco mais de vinho do que vários dos nossos confrades. O conhecimento sobre vinho não resume-se apenas a experimentar e identificar notas e características, ponto no qual sou bastante fraco. Estende-se também a conhecer processo, regiões, mapas, rótulos, estória, evolução, produtores, o próprio 'mercado'... Aliás, qual o sub-título desto blog, mesmo?  Resmungos de um deficiente nasal que sabe pouco para iniciantes que sabem menos...
Junto d' As Noivas de Baco, sei que estou lá para ensinar muita gente. Mas tenho a completa certeza de que há muito a aprender com essas mesmas pessoas, também.

14 comments:

  1. Eu concordo, mas em partes. A subjetividade da informação e do paladar ultrapassam as barreiras do bom senso e, às vezes, da liberdade de sentimento. O prazer dado por uma taça de vinho é como se fosse um usurpador dos desejos e vontades, pois nos faz até esquecer do ato de julgamento. A propósito, o julgamento de um vinho parece-me algo cruel, principalmente com o produtor. Para ele, o vinho é como um filho, e como tal, não tem defeitos. A medida do paladar por uma régua, de marceneiro ou carpinteiro, é algo que não entra em minha cabeça. Isso pode ou não ser correto. Se for correto, estaremos lançando mão de uma estratégia inócua para atestar a qualidade de algo que nem conhecemos a composição completamente. Se não for correto, não é, e pronto. Não sei se fui claro. Na verdade, eu dou preferência as vinhos argentinos, mais por uma questão política, visto que o novo governo de lá está no caminho certo para melhorar o país. Assim, se eu comprar os vinhos de lá, estarei dando a minha humildade contribuição aos companheiros argentinos.
    saudações,
    Pedro Ernesto

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    1. Pedro Ernesto, obrigado pela reflexão.
      A subjetividade norteia quase todas as ações humanas, à exceção da matemática (e demais ciências exatas, claro).
      Assim, a subjetividade permeia nossos próprios textos - o do sr. Jairo, meu comentário, e depois o seu. Então a palavra 'julgamento' não pode ser tomada a ferro e fogo. Não se trata de encontrar um culpado. A comparação de vinhos gera uma competição saudável. Ou não exatamente. Vá na França perguntar 'quem faz o melhor vinho?'. Receba por resposta apenas um sorriso de piedade, como a dizer-lhe que a pergunta é descabida. Bem, talvez nesse caso alguém queira promover um 'julgamento', principalmente se tiver um vinho melhor na manga para colocar na mesa de quem lançou a ofensa. Subjetivo, não?

      De outra maneira: sim, para o produtor seu vinho é como um filho. Mas muitos filhos são bandidos, não? E eu nunca vi uma mãe deserdar um filho (mudei de pai para mãe um pouco por cuidado), mas quero significar o mesmo. E ainda tem o caso do pai bandido cujo filho da mesma facção jamais será abandonado... 🙄 Quero dizer: tem muito produtor que é picareta mesmo, sabe que 'produziu' (educou, ou não educou) um péssimo filho, mas defende-o.

      Portanto, a comparação é sempre saudável. E, para comparar, precisamos de réguas. Precisamos conhecer, e para tal não basta 'estudar' (teoricamente) o assunto, embora isso seja imprescindível. É preciso treinar o paladar, conhecer o assunto, etc. Digo que (definição básica): 'vinho é um fermentado de uva onde se harmonizam açúcar, álcool, acidez e tanino'. Ótimo. Vamos avaliar um 'vinho'. Ele não tem acidez. É vinho? Como digo, está escrito 'vinho' no rótulo, e as pessoas o compram como tal. Por desconhecimento. Assim, para 'julgar' e mesmo comparar, é preciso conhecer.

      Entendo sua posição política influenciando em vossa escolha, e particularmente apoio tais decisões. Eu mesmo deixei de consumir produtos franceses - todos - quando a França realizou testes nucleares na Polinésia, ali pelo meio dos anos 1990, lembra-se? Decretei da minha parte uma moratória de 10 anos a qualquer produto Francês. Parece que fui o único... 🤨 Outro ponto é 'julgar' (sic) o que o governo deste ou daquele país esteja esteja fazendo em prol dos cidadãos. Atualmente não consigo perceber direito o que estão fazendo por aqui... o que dizer sobre terras além-mar (sic! rs!).

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  2. Obrigado pela resposta Carlos. Entendi a questão da métrica e a relação subjetiva, e por vezes cruel, com a avaliação Parkeriana. No caso da avaliação na escala de 20, talvez as coisas sejam melhores, ou até mesmo nos bicchieri. Penso que a relatividade exposta nos números ou símbolos abstratos sejam apenas fetiches mentais que trazemos de relações atávicas. Não acredito que norteiem os pensamentos laterais de mentes que realmente pensem em aproveitar uma boa taça de vinho argentino.
    Sds,
    Pedro Ernesto

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    1. Olá, Pedro.
      Não pode haver dúvida, também, que a avaliação pelos profissionais cria tendências de mercado. Portanto, não deixam de ser cruéis à medida em que, tomadas como verdades, somente os vinhos avaliados (e bem avaliados) acabam tendo 'respeitabilidade'. A parte boa é que podemos discordar dessas avaliações, fazendo as nossas próprias! Eu mesmo refutei notas de avaliadores, comentando algumas em 2012... https://oenochato.blogspot.com/2012/07/o-xabec-2008-no-contexto-dos-espanhois.html

      O outro lado da estória é que nunca bebi vinho ruim que fosse bem avaliado por avaliadores 'honestos'. Mas essa estória é complicada...

      []s,
      Cralos

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    2. Mas há um número grande de avaliadores. Com a sua experiência, quais juga honestos e quais julga desonestos? Será que tem alguns que recebem o famoso jabá? Mas eles não correriam muito risco agindo assim? Eu gosto muito do Robert Parker e do James Sukling. Há alguns anos até assinei o portal do Robert Parker, mas depois ficou caro para mim e parei.
      Sds,
      Pedro Ernesto

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    3. Sim, há...
      Acho que alguns recebem, sim. Claro, não há provas. Mas procure por Jay Miller scandal. James Sucks? Li em algum lugar que o Parker, perto dele, parecia uma freira, de tão honesto... Esse senhor (sic) foi o primeiro a dar 100 pontos para um vinho Chileno. Depois, foi um atrás do outro...

      O maior problema - parece-me - é que a pontuação acabou servindo mais para alavancar preços e vendas do que forma de avaliar os vinhos. Note que esse problema é 'o que o homem fez da avaliação', e não com o sistema de avaliação em si. Mais ou menos como a energia nuclear/bomba atômica...

      Sim, no tempo de real forte era fácil assinar esses sites... hoje...

      []s,
      Carlos

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    4. Mas voltando ao tema, quais você acha que são sacanas e em quais confia? Deve ter algum bom, não?
      Qual vinho chileno que ganhou 100 pontos? Ele é bom?
      Sds,
      Pedro Ernesto

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    5. A questão não é só 'confiar', mas perceber a 'pegada' do avaliador ou de seu staff. Alguns avaliam com mais nota vinhos mais extraídos, com mais 'pegada'. Outros, avaliam melhor vinhos mais sutis. Novamente a questão da subjetividade...
      Se não me engano o Don Melchor (DM) levou mais de uma nota 100 (ou 100 e outras próximas, 99, etc), e o Clos Apalta também. Bebi vários DM um tanto mais antigos, até a safra 2006. Uma comparação entre DM de então e dois europeus resultou em vergonha para DM (na minha opinião). Ele é 'razoável', mas não se compara com europeus do mesmo preço. Daí que ele 'aparecer' com uma nota 100 depõe contra o avaliador... Aliás, a comparação entre um DM e europeus está aqui, conforme reportado por um dos confrades,
      http://vinhobao.blogspot.com/search/label/Castillo%20Ygay%20Gran%20Reserva%202004

      Então, sendo provocado a responder em quem confio... prefiro sugerir o https://www.cellartracker.com/, onde as avaliações são feitas por bebedores amadores, e não tem essa estória de Vivino, onde você tecla uma nota e pronto. Lá, eventualmente, as pessoas comentam características, falam da aeração etc... são opiniões relativamente bem abalizadas, acredito.

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    6. Oi Carlos,
      Mas não é melhor acreditar em profissionais treinados e que estudam, que em amadores, como estes do tal Vivino? Estive olhando e é parecido com o Cellartracker. Só que no Cellartracker eles dão notas ou comentam se quiserem. No tal Vivino tem as estrelinhas, mas a pessoa pode comentar também. Achei interessante o banco de dados que eles fazem com base nas palavras chaves citadas pelos comentaristas. Por exemplo, eles citam que a palavra cítrico apareceu em 90% dos comentários sobre determinado vinho etc. Isso é interessante. Mas não deixa de ser pareceres de amadores, como é o cellartracker. Mas você não disse quais são os seus críticos preferidos e os odiados. Deu para notar que não gosta do James Sukling.
      Sds,
      Pedro Ernesto

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    7. Bem, não conheço o Vivino. Sei que todo mundo fala da 'nota Vivino', o que me parece muito mais controverso. Veja: o sujeito bebe um vinho 'simples'. Nunca bebeu nada melhor, não conhece nada melhor, não tem ideia do que é. Mas "vai lá" (rs) e dá 5... Ele não está errado... ele é apenas inocente...
      No Cellartracker as pessoas que gostam, escrevem. Particularmente, dou mais valor a dois ou três comentários que percebe-se a pessoa tentou escrever, se esforçou, do que palavras-chave. Essa estória da palavra-chave aparecer em X% dos comentários até é interessante. Mas - como você nota - eu sou o sujeito do texto. Valorizo esse esforço.

      E sim, me desagrada a mediocridade. Assim, James 'Sucks' (sic), tô fora. Tento até sequer comprar o vinho avaliado por ele. Às vezes descubro que tinha avalição depois de comprar... E posso ter algum avaliado que não goste, mas do outro lado não tenho um de estimação... sério, não mesmo...

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    8. Acho que não fui claro. Pelo que vi, o Vivino é ainda mais completo que o cellartracker. A pessoa comenta sim, e dá uma nota, que são as estrelinhas. A pessoa pode dar 3 estrelas e meia, por exemplo. A nota final é uma média de todos os avaliadores, que são muitos. As palavras chaves são buscadas por meio de um algoritmo, pelo próprio aplicativo, nos textos escritos pelas pessoas que beberam. As pessoas não colocam palavras chaves. Quanto ao texto, não vejo diferença alguma em relação ao cellartracker, pois são pessoas, amadoras, que escrevem, do mesmo jeito. Não vejo como dizer que aquelas que escrevem no Vivino são melhores ou piores que aquelas que escrevem no Cellartracker. O que notei, olhando ambos, é que o número de "avaliadores", mesmo que amadores, no Vivino, é infinitamente maior que no cellartracker, que olhando por cima, não tem muitas avaliações por vinho individual. Desta forma, o resultado no vivino parece ser mais representativo que no cellartracker.
      Mas Carlos, você está fugindo de minha pergunta. Apenas me disse que não gosta do James Sucks (hahaha). Se não gosta apenas dele, então os críticos não te desagradam tanto. Por outro lado, esqueceu-se de dizer de quais gosta e confia mais.
      Sds,
      Pedro Ernesto

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    9. 🤣 acho que você foi claro, Pedro... eu é que não... Não conheço bem o Vivino, apenas sei que dá para marcar nota. É um convite ao mínimo esforço; qualquer pessoa pode marcar uma 'nota' sem pensar muito sobre. E acho que não me expressei bem, ao dizer 'palavas-chave'. O algoritmo procura no texto por palavras-chave, e, achando-as, apresenta como resultados... é isso, não? É interessante sim.

      Mas não usando Vivino, não sei bem como funciona. Fico com o Cellartracker. É apenas uma questão de gosto. A face que conheço do Vivino é que 100% das pessoas que o invocam falam das nota, apenas. Não falam de comentários que leram. Daí que nunca despertou-me interesse. Pode ser preconceito, não há problema, assumo.

      Ao final, repito: "não tenho avaliador de estimação". Não é fuga. Os que aparecem mais e muitas vezes 'confiro' são RP, Jancis Robinson, Wine Spectator, Wine Enthusiast (embora os considere um pouco entusiasmados demais em alguns momentos - sic! rs!), Stephen Tanzer, e um veículo tido como muito sério, ao qual preciso prestar mais atenção, é La Revue du Vin de France. Não conheço, apenas vejo suas notas a vinhos franceses, algumas vezes. Mas ouvi falar bem.
      []s,
      Carlos

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    10. Obrigado. Eu acho que vou me cadastrar no Vivino. Parece que dá para tirar foto e deixar registrado. Assim eu vou guardando os vinhos que bebi.
      Sds,
      Pedro Ernesto

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    11. Olá, Pedro.
      Desde quando me falaram do Vivino, achei que como bando de dados para manter a memória de experiências do usuário a ferramenta poderia ser maravilhosa. Na época, eu não tinha celular 🙄. Depois virou aquela estória, "nota Vivino", "pontos Vivino", e fui pegando alguma aversão. Mas ninguém precisa ser chato como eu 😂.

      Até outra rodada...

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