Friday, June 9, 2023

Primitivos... vinhos e instintos

Introito

   Discutia com amigo de longa data a questão de educação. Não a formal, a escolar, tão em falta nos dias de hoje, mas aquela dita de berço. Filho de vidraceiro e professora nos anos '60 em um estado machista e patriarcal, adivinhe qual vertente prevaleceu na minha... busco desde então corrigir esse problema pessoal em que a dúvida em esfarelar argumentos idiotas em vez de flertar com as boas maneiras e fraqueza de caráter me dura menos de um segundo no cérebro. Junto de toda uma geração, sou fruto de meu tempo e preciso (com todos os nascidos como eu) ir de encontro ao Criador para a próxima descendência assumir. Certo, existem outras formas de resolver a questão e a história mostra-nos estados totalitários deliberando e fechando a querela com rapidez. Mas sobre a tal da educação, meu interlocutor sacou o celular e recordou-me a memória (sic!), perguntando se não é similar a linguajar de bandido (produção do UOL, com vídeo copiado para não se perder o vínculo e deixar a discussão sem sentido):


   Oral leitor, e meu debatedor-amigo... um estadista do quilate de Nosso Amado Presidente (NAP) jamais diria algo tão selvagem, desrespeitoso e egoísta a troco de nada. Sua intenção foi claramente capturar a atenção popular - dos mais deseducados, como eu - usando palavras duras para ministrar as gotas de sabedoria e lucidez cuja distribuição para a sociedade faz de maneira tanto generosa quanto frequente, enquanto guia os destinos da Nação para acima, e avante! Creia-me, não é seu desejo proceder dessa maneira contra um senador da República. Foi tudo força de expressão... e quanta força, NAP! Isso mesmo! Experiência de 80, entusiasmo de 40, tesão de 20! Pátria Amanda, Brasil! 💪

O marvado Primitivo

   Certa vez ouvi estória sobre a introdução da casta Primitivo no Brasil. E aqui temos introdução em dois sentidos: sua apresentação como cepa e a acepção fálica. Do ponto de vista freudiano - o relato é de segunda mão, então omitirei nomes - foi por eminente sommelier, seguramente após análise com toques de profundo conhecimento da psique e libido humanas dignas de autoridade nas lides da fisiologia também. Ora, o sabor doce está ligado à tenra infância; exerce fascínio e satisfação nos cérebros mais facilmente impressionáveis e propensos aos instintos mais deliciosamente primitivos... Então - voilà - nessa terra de bocas tortas uma cepa com sabor doce agrada, liberta e satisfaz. Vitimados por produtos sul-americanos de baixa qualidade, repudiamos a acidez como o capiroto odeia a cruz; o bolsonésio, ao PTelho; o Coríntias, (sic) ao Parmeras (rs!), o CAASO, ao DCE... Nas palavras do Renê, esse vinho é... marvado! Pena não sê-lo no sentido mais corriqueiramente empregado por ele...

Concura Primitivo di Manduria Riserva a6mani (não registrei a safra! Creio que 2013) foi servido com pizza em degustação promovida pela Vinho e Ponto de S. Carlos. Aconteceu há algum tempo, não guardei bem as notas; tem sim sua fruta, mas o dulçor é pronunciado, no nariz e em boca. Esse excesso impede melhor harmonização com pizza, mesmo de carne, embora não se contraponha. Prefiro vinhos marcando a boca por alguma outra característica, pode ser acidez combinada ou não com tanino; o dulçor deve ser marginal, e o álcool apenas estar presente. Álcool sobressaindo - não foi o caso - é típico de vinho ruim, e açúcar sobrando não é característica das mais desejadas. Quando cito o dulçor de muitos (bons) portugueses, refiro-me ao equilíbrio, jamais a uma sensação enjoativa; nos bons exemplares desse país, ele está... na medida. O sul da Itália tem vinhos muito melhores para nos agraciar; a Campania, só para citar essa, não vai decepcionar o bebedor mais exigente. Sempre cito o Terra di Lavoro produzido pela Fattoria Galardi, do qual bebi duas vezes e numa delas transformou Brunelões de primeira em menininhas mimadas (walew, Don Flavitxo). PS: o André da postagem é amigo homônimo. PS2: os vinhos foram ofertados por ele e pelo Akira, participei como convidado. PS3: Terra di Lavoro volta ao mercado brasileiro depois de algum tempo fora de catálogo, nas mãos de importadora tubarona. Traga de fora. Por sobremesa, acompanhado de... de.. de... um docinho (rs), tivemos um Moscatel Rosé produzido na Encruzilhada do Sul. Baixa acidez, rápido, sem muito diferencial, mas seu açúcar muito menos presente combinou melhor com o quitute.

   Experiências quaisquer são sempre necessárias. Para o iniciante, servem como mostra do panorama geral. Para o mais experiente, vale a recordação. O bom leitor não consome apenas obras-primas; ele também precisa do medíocre para balancear seu senso do bom, do ótimo e do perfeito. Sem o padrão de comparação, até o mais arguto leitor cairá na mesmice, ainda sendo ela de muito alto nível. Vale ressaltar o ponto de alguns participantes do evento: gostaram, mas sem a certeza de que beberiam uma garrafa inteira de Primitivo, mesmo em duas pessoas. Se o vinho for apenas bom, seguramente chegaremos ao final da garrafa bebendo sozinhos - garanto!

   Por conclusão: o bom bebedor precisa conhecer a acidez e depois resolver se reforma ou não sua opinião acerca dos outros vinhos onde ela falta. O problema é desconhecê-la e achar um Primitivo tudo de bom... a maior parte dos apreciadores da primeira (acidez) abomina o segundo (doce). Não pretendo fazer disso uma regra, mas é um fato cujo sentido chega de forma indelével para os mais experientes. De outra maneira: é normal rir com Os Três Patetas, mas só nos deliciamos verdadeiramente com Monty Python. Se ficou alguma dúvida acerta da qualidade dos Primitivos, convido o leitor a citar qualquer lista dos 10 maiores vinhos italianos contendo um Primitivo. Se 10 vinhos forem poucos, então dos 20. Ainda é pouco? Dos melhores 30 vinhos? Dos... não! Façamos assim: apresente-me uma lista de todos os grandes vinhos e vejamos onde aparece um Primitivo. Taí a tragédia...

2 comments:

  1. Fala, Big Charles! Beleza de post.
    Ia comentar antes, mas tive que ir ao banheiro vomitar após assistir o vídeo do Nine… rs.
    Quanto ao Primitivo, divido o gosto com você. Ou melhor, o não-gosto! Uma vez bebi um que não xinguei. Não passava por madeira e, segundo quem me apresentou, era feito com uvas colhidas mais precocemente. Consequentemente, tinha mais acidez!
    Que boa lembrança a da noite com o Terra di Lavoro e os Brunellões!!! 🙏 Recentemente bebi um Terra di Lavoro 2009. Estava um monstro!
    Abraços!
    Don Flavitcho

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    1. Don Flavitxo, obrigado pela leitura.
      É preciso estômago para Primitivos e outras coisas... taí uma abordagem interessante na produção desse vinho, colher um pouco precocemente. Mas acho que o problema é a proposta mesmo: querem um vinho doce para agradar bebedores iniciantes. Não sei qual será o custo a médio prazo mas... sempre tem gente nova começando...

      Depois, Terra di Lavoro é mesmo um vinho que não se esquece... Vejamos se D. Neusa encontra um no Canadá...

      Walew!
      Oenochato

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