Sunday, July 18, 2021

Noivas de Baco em movimento

Introito: uma sociedade tentando voltar ao normal

- Que queres tu, meu pobre Diabo? As capas de algodão têm agora franjas de seda,
como as de veludo tiveram franjas de algodão. Que queres tu? É a eterna contradição
humana.
Machado de Assis
A Igreja do Diabo

   Mais de um ano isolados - não em confinamento absoluto, porque, como relata Machado em A Igreja de Diabo, sempre tendemos a algum deslize não importa qual seja nossa crença. Aos poucos vamos emergindo do solo como marmotas acordando de um inverno mais longo do que o usual. Mãos espalmadas esfregando os olhos, começamos a nos (re)acostumar à luz do sol (às antigas e novas amizades) e seguimos (re)desfrutando velhos hábitos. O leitor desavisado não tome nossa atitude como desobediência à prática do distanciamento social ou como incentivo à aglomeração. Promovemos um encontro em ambiente quase completamente aberto (não foi em uma sala fechada), com distanciamento (na maior parte do tempo) e os devidos cuidados nos cumprimentos e aproximação pessoal. Todo mundo prendeu a respiração pelos três minutos em que ficamos mais próximos para um congraçamento e pose para fotos. Os presentes atestam essa verdade. Ah, como se fosse necessário! Ora, este Enochato sempre provou, comprovou e re-provou (sic! rs!) todas as suas afirmações no blog; portanto tem moral absoluta - absolutíssima! - para assegurar a veracidade completa de seu relato sem o devido registro fotográfico ou fílmico. Essa tem sido uma máxima bolonésia de uns tempos para cá, 'provar' algo. O pior é que estão surgindo gravações aqui e ali, provando justamente o que se tenta esconder, e essa turma tem ficado cada vez mais acuada... 😓. Falemos de vinho...

Degustação de burgue (sic! rs!)

Tinha ficado para trás a proposta de uma harmonização de burgue (sic) e vinho, e resolvemos retomá-la. A ideia partira do Gustavo, chef do Bistrô Graxaim, em algum momento do ano passado. Com o recrudescimento da pandemia ela adormeceu, para ganhar asas na semana passada. Fiquei entusiasmado - como tenho relatado - com a proposta de harmonização. Algumas das quais participei, promovidas por Enoeventos, mostraram como belas combinações podem ser realizadas com vinhos de preços relativamente acessíveis (cerca de R$ 100,00), com pratos relativamente sofisticados (camarão) e alcançar resultados tão surpreendentes quanto sofisticados. Claro que uma degustação não tem o mesmo propósito de uma orgia baconiana como aquelas que promovemos em nossos encontros... daí que sugeri - ideia prontamente aceita pelo Gustavo - que ele conclamasse os devotos a comparecerem com outras garrafas na mão, para o segundo tempo. Ideia imediatamente aceita por todos, desnecessário dizer...

O evento

Terno, sapatos pretos, gravata (eu), ou fraques e cartolas para os homens, e longos, plumas e paetês para as madames, lá fomos em trajes de gala para o evento (agora tenho provas! Vejam a foto ao lado! Em sentido horário, começando pela esquerda, Renata - de aniversariante -, Dayane, Rita, Luciana, Eduardo, Enochato, Dirlene e Isabela). Brindamos o reencontro com um espumante Blanc de Blancs Bacio Della Luna 2019, já comentado aqui, e portanto pouparei o leitor de mais lenga-lenga. Enquanto colocávamos a conversa em dia, resolvemos abrir nossos vinhos e deixamos o Gustavo aguardando a ordem de hamburgar (sic) todo mundo. Talvez tenha sido um grande equívoco... 

Vinhos 'auxiliares'

Havia bebido um exemplar dele na semana anterior... Do qual gostei, apontados e respeitados os defeitos. Achei que outras pessoas também curtiriam conhecê-lo, e eis que a oportunidade apareceu em seguida: o burgue! Harmonização ainda é um mistério para mim. De um lado, temos tanino, acidez, álcool e açúcar (espinha dorsal do vinho) combatendo contra (ou a favor...) gordura, sal, acidez e açúcar (ei, eles aí de novo!) pelo lado da comida. Tecnicamente não sei quais outras características básicas a comida pode ter, que (sic) não sou cozinheiro, mas quatro a quatro parece bom. Bem, burgue não tem fama de ser uma carne com muita gordura (como uma picanha... tá, tem burgue de picanha, mas o Gustavo adiantara que o blend exclusivo dele não segue por aí); é uma carne de gordura média. Então levei um vinho de copo e acidez médias, o já comentado Juan Gil Etiqueta Plata 2018

A Dirlene levou um Primitivo de Manduria '1932' (ou algo assim - rs!), da cooperativa Produttori di Manduria. É uma turma que parece ter começa nessa data, veja melhor o sítio deles, vinho que recebeu minha imediata torcida de nariz e reprimenda enfática, em tom professoral (🧐). Não gosto(ava) de Primitivos. São vinhos doces (meio secos, na verdade) demais para meu gosto. Endosso a renormalização feita por alguém sobre o nome de outro produtor da região para Luccaralho Primitivo di Manduria, porque esse é enjoativo de fato. Bem, já ouvira dizer sobre a existência de Primitivos secos. Tanto quanto ouvi as estórias do ET de Varginha, do Saci-Pererê, da Mula Sem Cabeça e outras; uma lenda a mais não me ocuparia espaço por entre os neurônios - não é fato importante o suficiente para estar neles, fica entre mesmo. Mas eis que... encontro um Primitivo seco! Ora, foi experimentar e voltar-me para a Dirlene, que ainda compadecia-se de minhas críticas, refazendo minha posição. Não tenho problema em assumir meus erros e reduzir meus preconceitos a pós-conceitos. Um Primitivo seco, de corpo médio, boa fruta, acidez média, algo ligeiro no final mas ainda assim certa elegância. PENITENZIAGITE! Esta é e sempre será a posição do blog, sem medo de reconhecer os erros nem relutância em refazer posições. Tenha-se o registro. E aprendendo sempre. Não estou lembrado (🥴) de haver outro vinho na estória. Se houve, por favor, corrijam-me. O Eduardo ficou nas fotos, mas engoliu (rs! sic!) pelo menos uma delas, pois recebi apenas uma dentre os vinhos da degustação e não estou lembrado se mais alguém levou vinho. Quer dizer, quase certo de que a Isabela levou... mas não lembro-me qual...
 (batendo palmas): - Alô alô, Edu, tem que beber menos! 😂🤣

Vinhos principais

Que realizar a força que tem uma paixão
Eu vejo um novo começo de era
De gente fina, elegante e sincera
Com habilidade pra dizer mais sim que não
Lulu Santos

Os vinhos principais foram fornecidos pela Vinho & Ponto de São Carlos. Foram (supostamente) sugeridos como harmonização para os burgue (sic) idealizados pelo chef Gustavo. A proposta foi divulgada com antecedência. Primeiro burguer: Blend exclusivo Graxaim, no pão de brioche, com maçãs caramelizadas, bacon e creme de queijo brie. Guarnição: onion rings (cebolas empanadas) Vinho para harmonizar: Korta Selección Especial Grosse Mérille 2019. Segundo burguer: Blend exclusivo Graxaim, no pão de brioche, queijo reino, bacon artesanal feito na casa, cebola caramelizada, alface e tomate. Guarnição: batatas rústicas artesanais Vinho para harmonizar: Irurtia Tannat Reserva 2015. Bem, pretendia fazer uma postagem baseada na média entre as opiniões dos presentes. Mas considerei que este espaço sempre teve personalidade e senso crítico mais do que suficientes para prescindir disso. Não é que evitarei comentar as manifestações de outros. É que não hesitarei um instante em exercer o senso crítico deixando de lado a menor possibilidade de dizerem que escondi-me na opinião dos outros. Então é assim: Vinho & Ponto entrou em uma parceria de degustação e não enviou um representante ao evento. Uma falha (falha, para deixar barato). Sobre Korta Selección Especial Grosse Mérille 2019, vejamos o que diz o sítio da V&P: Em boca é leve, delicado e seus taninos são muito suave (sic!) no paladar, tem excelente acidez e doçura equilibrada, seu final de boca é ligeiro e fresco. fantástico vinho para o verão, e servir a uma temperatura mais baixa (mais um sic pelo conjunto do parágrafo). Tá. 'excelente acidez' com 'final de boca ligeiro'. É uma contradição. A boa acidez é quem garante quase que sozinha um bom final. Portanto apenas uma das declarações é verdadeira. E olha não é aquela sobre a acidez... é excessivamente ligeiro, desbalanceado no açúcar e a declaração mais verdadeira (sobre a acidez) está bem errada! Na verdade não apresenta acidez digna do nome,  e bota ligeiro para falar do final.
 (batendo palmas): - Alô alô, V&P (franquia 'central'), tem sommelier por aí? Sommerdiers (sic) tem um monte no mercado! Estão aceitando currículo? Um pelo outro, posso mandar o meu! Para trabalhar 20 minutos por dia. Nessa média ainda sou melhor do que o que vocês têm ai (se é que têm)! E olha que nem sou lá grande coisa...
   Ainda segundo o sítio do importador, a harmonização se faz com "Massas, Carne de Porco e Queijos". Não parece indicado para carne bovina mais magra, embora não consiga traçar uma correlação entre 'carne bovina mais magra' (do burgue) e 'carne de porco'. O fato é que não casou. E não é que passou perto; sequer tirou fina.
   O Irurtia Tannat Reserva 2015 não está mais disponível no sítio do importador, então não peguei suas notas de degustação. Gostaria de vê-las... seria outra piada engarrafa? (sic) Também não casou com o burgue. De forma alguma é um vinho ruim (o Korta é!) - para o padrão sul-americano. Mas a tal da acidez também é baixa, principalmente após já termos provado dos europeus. 
   Dando o braço a torcer: a degustação de vinhos auxiliares com acidez mais presente (embora apenas 'média') poderia comprometer os vinhos principais? Talvez. Mas o que classifico de acidez média (europeus) bate de frente com a declaração do sítio do importador, excelente acidez(!) para um dos vinhos principais (o Korta). Algo está evidentemente muito errado. E parece que não é a opinião deste Enochato! Se o sítio do importador estivesse correto (e vinho fosse aquilo mesmo que se descreve), algo de 'excelente acidez' deveria bater o que eu sabia (no caso do meu Juan Gil) ser de média acidez.

Conclusão

   Harmonização não é um assunto fácil. É fascinante, mas exige atenção e seriedade. Pode não dar muito certo, o que é um risco inerente às possíveis interpretações do prato e do vinho. Mas é uma mácula quando dá tão errado. A crítica não fica apenas à V&P São Carlos. O chef Gustavo deveria ter maior... maior... maior feeling. E, tendo-o, deveria rechaçar a(s) indicação(ções) oferecidas. Não o fazendo, entra na fogueira também. Onde está o fósforo? A gasolina, eu já trouxe. 😈
   Melhor sorte a todos da próxima vez.

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