Sunday, October 17, 2021

Era-se uma vez meu vinho piada pronta... 😨

Introito

Comentei há algum tempo sobre rótulos de vinho engraçados, quando mostrei alguns exemplos. Existem muitos outros, claro; do inusitado ao divertido, passando pelo mal gosto, tem de tudo. Um muito simpático é esse aí ao lado, Slow Lane Cab... Táxi da Pista Lenta? No sítio do produtor encontramos um comentário justificando rótulo e nome, conectando-o à proposta da produção do vinho. Só o caminhãozinho do rótulo não está carregado com uvas... de resto, tudo casa. Conheci-o em 2008; foi interessante. Estava na loja (uma Liquor Store) e pedi por uma garrafa de 25 ou 30 dóla. O Duílio ia cozinhar uma gororoba qualquer, e a ideia era um vinho para acompanhar. Era uma época de 1 dóla = 1,76 real... O atendente mostrou-me um bem no preço que pedi, mas sugeriu: "Se você está pagando 30 por um vinho, leve este por 36". Ara, que dúvida... levei os dois! Gostei tanto que voltei no dia seguinte e comprei mais uma garrafa de cada; queria porque queria (sic) compartilhar com os amigos do Brasil... Ah, o outro era nada mais nada menos que um Orin Swifit (produtor) Prisoner, que entraria no top 100 da Wine Spectator do mesmo ano. O Slow Lane foi posteriormente avaliado com 96 pontos pelo Parker. Menos... 94 estaria muito bom... 😝

Austrália

  A Austrália é um grande produtor de vinhos. Em termos de volume, anda sempre embolado com Chile, Argentina e África do Sul. A China está vindo aí com produção semelhante, mas não tenho qualquer notícia sobre a qualidade. Ela está geograficamente bem localizada; o problema é que são uns novatos na arte. Os vinhos podem ser ruins agora, mas chineses não fazem as coisas pensando em 50 anos... é um período de tempo muito curto. Ciência e cientistas para aprimorar suas leveduras eles têm, e se pensarmos em concorrência, devemos esperar o pior, ou o melhor, sei lá... sei mesmo que naquelas bandas os orçamentos de ciência e tecnologia não sofrem cortes de 90%... Voltando dessa digressão, a Austrália tem sua produção fortemente calcada na cepa Shiraz, embora Pinot Noir, Cabernet Sauvignon e Chardonnay também tenham forte presença. Australianos tentam de tudo sem medo nem vergonha, plantando Nebiolo e Barbera (nativas do Piemonte), Sangiovese (Toscana), Viognier (Rhône) e outras mais. Seus GSM, corte de  Grenache, Shiraz e Mourvèdre, inspirados no Rhône, são respeitados. Alguns Chardonnays - Cullen e Giaconda - atingem valores de 100 dóla, o que os coloca lado a lado com borgonhas Premier Cru de bom nível. Nunca provei esses brancos, mas os comentários são instigantes. As regiões mais famosas são os vales de Barossa, Clare e McLaren, sem prejuízo de outros também importantes. Seus principais ícones atingem valores superiores a 500 dóla (Granges, Hill of Grace), pelo menos o dobro dos exemplares sul-americanos. O melhor de tudo é que aqueles são bons...

Um início despretensioso

A reunião desta sexta-feira teve na abertura o Castello di Ama Al Poggio branco 2012, Chardonnay IGT produzido por conceituada casa da Toscana, a Castello di Ama, famosa por seus Chianti e pelo IGT L'Apparita, 100% Merlot. Al Poggio estava oxidado, o que não o tornou menos atraente. Nariz cítrico evidente para todos e sugestão de amêndoa apontada por este Enochato encontrou concordância nos convivas. Boca um tanto ligeira e acidez um pouco em declínio não tiraram algum encanto pelo conjunto. É um vinho do 20 dóla lá, à venda aqui (atualmente na safra '16, segundo estimativas no limite do frescor) pela bagatela de 500tão. Vejamos: 20 x R$6,00 = R$ 120, o que dá mais de 4x. A safra '12 foi comprada em 'promo' e infelizmente ficou guardada um pouco a mais de tempo. Custou em 2018 R$ 138,00. Pode? Pode... brasileiro adora conceder graças muito além das merecidas a vinhos e a importadores. É isso o que pedimos, é isso o que recebemos.

Servi a primeira rodada do Xisto Roquette e Cazes 2005 um pouco cedo, e a falta de refrigeração gerou olhares recriminadores por parte os convivas. Foi um fora... 🙄. Mas a segunda rodada algum tempo depois restaurou a bonança à mesa e os olhares tornaram-se mais alegres. Opiniões indicaram que poderia ser 2015, ou algo assim. Muita fruta, álcool menos evidente pela temperatura adequada, acho que a Dona Neusa falou de algo terroso. Tinha boa acidez, bons taninos, tudo bem balanceado. Havia experimentado outra garrafa dessa safra em Abril de 2020, e não estava tão boa. Desta vez foi muito diferente; estava bem mais próximo do que de espera para um vinho em seu preço. O chão afunda quando nos tocamos que, apesar de ter aberto bem, o vinho não evoluiu com o tempo. É aquilo, abre e fica; característica de muitos sul-amerianos tidos como bons. Analisar vinhos é difícil, né? Tenho dito... Anda na faixa de USD 80,00 (lá), e aqui está entre R$ 1.150,00-1.500,00. No... no se puede... Novamente preço entre 3x-4x, claramente superestimado já para seu preço 'lá'. Veja os comentários sobre esse vinho no vínculo e compare a percepção daquela garrafa. O último ponto é que a 80,00 moedas, dá para lembrar de uns 30 concorrentes de relação custo-benefício bem melhores. É possível enfileirar Chiantis, Barolos, Brunelos, Xatenêfis, Barbarescos e Rhônes, sem falar em muitos espanhóis e até diversos portugueses - por que não? Pior de tudo: pelo preço muito alto aqui, podemos comprar borgonhas de ótimos produtores por preço similar. Isso apenas desnuda mais ainda o quanto o preço está desbalanceado. Cadê os energúmenos para tentar dar um contra?!

Meu vinho piada pronta

- Olhalá (sic!), comprei esse vinho pensando em você!
Quantos e quantos não recebi em minha adega com essa piada pronta na manga. Bastava a pessoa se interessar um pouco e pedir para mostrar alguns vinhos que, lá na terceira tirada chegava a esse australiano. Muitas vezes o conviva ria; se ensaiava algum desgosto, logo ouvia:
- Pow... falei do vinho... O Parker pontuou com 96, disse que é elegante, potente e com personalidade... e você olhou o nome o rótulo...  Era a deixa para acabar tudo em risos. Old Bastard 2002 é produzido pela Kaesler, no Barrosa. Tem 15% de álcool que não se percebem; pela cor os convivas chutaram algo como 2015 (novamente!), porque não tinha nenhum halo que pudesse indicar ser envelhecido. Frutas vermelhas e negras e especiaria também indicavam sua jovialidade e complexidade. Boca pegada, com taninos muito maduros trasmitiram que era um grande vinho. Boa acidez, persistência e final longo... com o tempo ainda mudou no nariz, conforme muito bem notado pelo Akira, que se não bebe continua cafungando com maestria. Já experimentei alguns bons australianos: Torbrecks (mais de um, não postados; um registro de Don Flavitxo aqui), vários Kilikanoon (um na mesma postagem!), alguns Vasse Felix, outros (sic) Penfolds, etc. Nunca fiquei triste com um australiano na taça. O maior problema é o custo deles nas mãos de alguns importadores. 

O trio foi degustado com algum queijo e embutidos de entrada e um maravilhoso filé mignon de lombo suíno com alho poró e ervas de Provença, magistralmente preparados pela Márcia e trazido pelo Ghidelli. A tristeza ficou por conta da ausência da cozinheira. Ela tinha outro compromisso. Espero que esteja presente em alguma das próximas... faltaram mesmo fotos dos petiscos e prato principal. Ainda tivemos um bolo - ei, o que era, mesmo? 😕- gentilmente trazido pela Dona Neusa e que acompanhou bem um Sauternes do Château Doisy-Védrines 2016, que o leitor pode encontrar em outras postagens. Como diria Baco... teve bão... 🤤

2 comments:

  1. Carlão, vinhos bons e envelhecidos como o italiano, australiano e esse português sempre mostram caminhos nunca dantes navegados e degustados. Experiência muito boa. A cozinheira se comprometeu a levar o próximo prato e trilhar nossos cafungos e palatos. Abraço.

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    1. Luidgi, um belo achado literário, 'caminhos nunca dantes degustados' (e navegados, claro).
      Esperemos que ela participe mesmo de uma próxima.
      Teve bão...

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